Relações Trabalhistas

TST flexibiliza vínculos ao arrepio da Constituição

Autor

  • Luiz Salvador

    é presidente da ALAL diretor do Departamento de Saúde do Trabalhador da JUTRA assessor jurídico de entidades de trabalhadores membro integrante do corpo técnico do Diap do corpo de jurados do Tribunal Internacional de Liberdade Sindical (México) da Comissão Nacional de Relações internacionais do Conselho Federal da OAB e da comissão de juristas responsável pela elaboração de propostas de aprimoramento e modernização da legislação trabalhista instituídas pelas Portarias-MJ 840 1.787 2.522/08 e 3105/09.

23 de maio de 2012, 6h51

Recentemente, a revista Consultor Jurídico noticiou decisão do Tribunal Superior do Trabalho afastando o reconhecimento de vínculo empregatício de trabalhador terceirizado pela Brasil Telecom. A relação havia sido reconhecida pelo Tribunal Regional do Trabalho do Paraná, que entendeu que a Lei Geral das Telecomunicações (9.472/1997) autoriza a terceirização no setor da telefonia de forma lícita.

Dispõe o artigo 94: “No cumprimento de seus deveres, a concessionária poderá, observadas as condições e limites estabelecidos pela Agência: I-empregar, na execução dos serviços, equipamentos e infraestrutura que não lhe pertençam; II – contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço, bem como a implementação de projetos associados. § 1° Em qualquer caso, a concessionária continuará sempre responsável perante a Agência e os usuários. § 2° Serão regidas pelo direito comum as relações da concessionária com os terceiros, que não terão direitos frente à Agência, observado o disposto no art. 117 desta Lei”.

Com o entendimento de que essa lei excepciona a questão, tornando lícita a terceirização precarizadora, o TST reformou a decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região que, reconhecendo a ilegalidade da intermediação, reconheceu o vínculo empregatício do empregado terceirizado, condenando a Brasil Telecom à responsabilidade subsidiária, prevista no Enunciado 331, do próprio TST, inciso IV que assim dispõe:

“I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974). II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988). III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. V – Os entes integrantes da administração pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n. 8.666/93, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação.”

Em outro momento, a 2ª Turma do TST, em acórdão do ministro José Roberto Freire Pimenta, aplicou a Súmula 331, onde se entende que a responsabilidade subsidiária abrange a obrigação do tomador de pagar todas as diferenças salariais que restam devidas ao empregado, entre o que recebeu e o que lhe restam devidas, na hipótese de inadimplemento do prestador de serviços. (http://apet.jusbrasil.com.br/noticias/2761547/tst-nova-redacao-da-sumula-331-preve-responsabilidade-subsidiaria-em-relacao-a-todas-as-verbas).

Em nosso entendimento, o julgador deve adequar à legislação infraconstitucional ao comando maior da Constituição que direciona o comando legal para o atendimento das finalidades e objetivos do Brasil, que dá prevalência ao social e atribui ao capital sua responsabilidade social a assegurar a empregabilidade digna e de qualidade, modulando a fome do capital pela prevalência dos seus interesses meramente patrimonialistas.

Além do mais, há que se separar obrigações entre o tomador e a prestadora de serviços que são reguladas pelo direito comum, enquanto que as relações de trabalho têm estatuto próprio, com princípios protetores norteadoras do primado do trabalho digno e de qualidade, em que os direitos mínimos regulados em lei, não excluem outros direitos visando à melhoria de sua condição social, contra o retrocesso social representado pelo pensamento de que o que prevalece é o interesse patrimonialístico, voltado à maior produtividade, lucratividade e ao menos custo operacional possível, ao arrepio das garantias constitucionais que protegem “os valores sociais do trabalho”.

No Brasil, o legislador constituinte, idealizando a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, estabeleceu princípios para atingir o desenvolvimento nacional, para conseguir a erradicação da pobreza e a marginalização, para reduzir as desigualdades sociais e regionais e para promover o bem comum – função primordial do Estado. Para tanto, vinculou a função social da propriedade ao desenvolvimento da ordem econômica (CF, art. 5º, XXIII e 170, III), valorizando o direito de cidadania, garantindo-se o direito ao salário e ao trabalho (CF, art. 1º, III e IV e art. 7º, IV, V, VI, VII, X). http://jus.com.br/revista/texto/1167/o-direito-do-trabalhador-a-incorporar-as-vantagens-e-condicoes-mais-favoraveis-constantes-dos-acordos-e-convencoes-coletivas#ixzz1uIcLDGot

Em conclusão. O contrato entre tomador e prestador de serviços tem natureza distinta. Este se rege pelo direito comum, patrimonialista, enquanto que as relações de trabalho se regem pelo Direito do Trabalho, com seus princípios protetores ao trabalho humano, visando sempre o avanço e não o retrocesso social, flexibilizador e precarizador das condições de trabalho dos trabalhadores, encontrando-se violados, dentre outros, os seguintes dispositivos prevalentes de nosso ordenamento jurídico: CF, artigos:

"- 1º (II, III e IV) – Cidadania, Dignidade da Pessoa Humana e Valores Sociais do Trabalho;

– 3º, I – construir uma sociedade livre, justa e solidária); II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

– 5º ( XXIII e 170, III) – a propriedade atenderá a sua função social;

– 7º, (Caput e incisos IV, V, VI, VII e X), além dos direitos básicos elencados, incluem-se outros que visem à melhoria de sua condição social;

– 170 – A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social;

– 193 – A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça social."

Autores

  • Brave

    é presidente da ABRAT, presidente da ALAL, representante brasileiro no Departamento de Saúde do Trabalhador da JUTRA, assessor jurídico da AEPETRO e da ATIVA, membro integrante do corpo técnico do Diap e Secretário Geral da CNDS do Conselho Federal da OAB.

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