Política Tributária

Cobrança do adicional de ICMS em MG é contraditória

Autor

  • Frederico Menezes Breyner

    é sócio do Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados. Mestre e doutorando em Direito Tributário (UFMG). Professor da Faculdade de Direito Milton Campos.

9 de maio de 2012, 14h07

A Secretaria de Estado da Fazenda de Minas Gerais (Sefaz/MG) acaba de anunciar a regulamentação do adicional de 2% de ICMS devido sobre operações internas com cerveja sem álcool e bebidas alcoólicas (exceto aguardente de cana ou de melaço); cigarros (exceto os embalados em maço) e produtos de tabacaria e armas, operada pelo Decreto nº 45.934/2012 e pela Resolução n° 4.417, de 04 de abril de 2012.

O adicional foi criado pela Lei nº 19.978, de 28 de dezembro de 2011, com fundamento no artigo 82, parágrafo 1º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), inserindo o artigo 12-A na Lei 6.763/75.

O primeiro ponto que chama a atenção é o tratamento dado pela Fazenda Pública aos estoques das mercadorias sujeitas à substituição tributária. O artigo 12-A da Lei 6.763/75 silencia a respeito de estoques, enquanto o Decreto se limita a delegar à Secretaria de Estado da Fazenda a disciplina, por resolução, da apuração do imposto relativo ao adicional de alíquota sobre o estoque de mercadorias em que o ICMS devido a título de substituição tributária já tenha sido retido ou apurado antes da vigência desse decreto e do respectivo prazo de pagamento.

Por sua vez, a resolução impôs ao contribuinte que possuía em seu estabelecimento estoque das mercadorias em questão submetidas ao regime de substituição tributária, ao final do dia 27 de março de 2012, o dever de inventariar o estoque e pagar, até 31 de maio de 2012, o adicional de 2% sobre o valor das respectivas bases de cálculo utilizadas para o cálculo do ICMS devido por substituição tributária.

Essa cobrança viola a legalidade tributária. A Lei 19.978/2011 em momento algum interferiu na definição do fato gerador da obrigação tributária de pagar antecipadamente o ICMS na sistemática da substituição tributária, que ocorre no momento da remessa da mercadoria pelo alienante ou, na falta ou insuficiência de destaque do ICMS-ST na nota fiscal, no momento da entrada da mercadoria no estabelecimento destinatário (nesse último caso, temos verdadeira antecipação de imposto por fato gerador próprio a ocorrer futuramente), sendo estes, remetente e destinatário, os obrigados ao pagamento em cada uma das respectivas hipóteses (artigo 22 da Lei 6.763/75).

Logo, não há previsão legal para se exigir a obrigação de pagar antecipadamente o ICMS devido na sistemática da substituição tributária do remetente pelo fato de “ter a mercadoria em estoque”. Certo é que “ter mercadoria em estoque destinada à revenda” é fato apto a ensejar a presunção de que futuramente haverá a operação de circulação sobre a qual incidirá o adicional de alíquota, pois permite o juízo de correlação e probabilidade necessário às presunções. No entanto, essa presunção de ocorrência futura do fato gerador para exigência antecipada do imposto devido deve ser feita por lei (artigo 150, parágrafo 7º da Constituição), e não por decreto, muito menos por resolução.

Disso decorre a violação à irretroatividade, uma vez que o fato gerador do ICMS-ST definido em lei já ocorreu, ou quando da remessa, ou quando da entrada da mercadoria. Cobrar o adicional do imposto devido por substituição tributária após esses momentos, sobre o estoque existente, é impor uma exigência sobre fatos passados, anteriores à instituição e regulamentação do adicional, infundindo eficácia retroativa à legislação tributária.

Portanto, na ausência de lei expressa, é inviável exigir o recolhimento antecipado do adicional sobre o estoque, utilizando a base de cálculo presumida, em relação a saídas que ainda acontecerão. Deve o Estado aguardar tais operações de circulação, e na saída dessas mercadorias é que ocorrerá o fato gerador do imposto sobre o qual é devido o adicional, que não foi antes recolhido por substituição tributária, a ser calculado sobre o valor da operação de venda, e não sobre a base de cálculo presumida. Nesse momento, poderia se cogitar de validade da cobrança, o que não se vislumbra no caso, pois a cobrança é feita imediatamente sobre todo o estoque, sem respaldo em lei.

Temos ainda que considerar a tão propalada definitividade do imposto pago por substituição tributária, fundamento no qual os estados se apegam para negar ao contribuinte substituído o direito de ressarcimento do imposto quando o fato gerador ocorrer em expressão menor do que aquela utilizada para definição da base de cálculo presumida — entendimento que por enquanto prevalece no Supremo Tribunal Federal (ADI 1.851/AL), ao menos até que haja revisão da tese. Se a tributação antecipada pelo ICMS-ST é definitiva, posteriores alterações na tributação do fato gerador presumido, como é o caso da criação do adicional do imposto, não deveriam surtir nenhum efeito contra o substituído após o pagamento do ICMS-ST. Há nítida contradição no entendimento do Estado: a tributação do ICMS-ST é definitiva para negar a restituição ao contribuinte substituído, mas provisória para exigir dele o adicional posteriormente instituído sobre o fato gerador presumido.

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