Conduta discriminatória

Empresa não pode consultar Serasa antes de contratar

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23 de junho de 2012, 8h56

‘‘Impedir um trabalhador que, eventualmente, poderá ser um excelente profissional, tão-somente por possuir dívidas implica em não observar a função social do contrato de trabalho, já que se está a negar a única forma de emprego formal dele para saldar com seus compromissos financeiros.’’ Esse foi o entendimento da 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul, ao determinar que a empresa de transporte de cargas Santo Anjo da Guarda Ltda. deixe de consultar cadastro de devedores (Serasa) nos processos seletivos de admissão de empregados. A empresa também não pode exigir certidões, atestado ou quaisquer informações creditícias dos candidatos, sob pena de multa.

A decisão reforma sentença da juíza Marilene Sobrosa Friedl, da 1ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul, na Serra gaúcha. Fredl julgou improcedente a ação ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul.

Entretanto, para os desembargadores do TRT-RS, a consulta a banco de dados de inadimplentes caracteriza conduta discriminatória da empresa, já que utiliza a situação econômico-financeira dos trabalhadores para limitar o acesso ao emprego, além de invadir indevidamente sua intimidade e privacidade. O acórdão foi assinado dia 7 de março.

Exigência da seguradora
Ao recorrer da sentença de improcedência da ação, o MPT-RS sustentou que o conjunto das provas demonstra a conduta ilícita da reclamada nos processos seletivos de admissão de empregados, ao realizar consultas em bancos de dados de terceiros em busca de informações creditícias dos candidatos a vagas de emprego. Como prova dessa conduta, o MPT-RS ressaltou documento presente nos autos, com assinatura e carimbo do responsável pelo recrutamento na empresa, em que consta a reprovação de um trabalhador no processo seletivo sob a justificativa de que este tinha seu nome no cadastro da Serasa.

O parquet trabalhista também destacou depoimento de preposto da empresa no âmbito do Inquérito Civil aberto para investigar o caso. Segundo o relato, são as empresas de seguros de carga que exigem que motoristas e ajudantes não estejam com seus nomes em sistemas restritivos de crédito. No entanto, conforme o MPT, esta condição não ficou demonstrada nos contratos com as empresas seguradoras.

Diante de tais provas, pediu a condenação da reclamada, sob o entendimento de que ‘‘a não-contratação de trabalhadores, por que sobre eles figura alguma inscrição no Serasa, é prática de exclusão infundada do mercado de trabalho e, por consequência, de exclusão social, de forma a privilegiar o capital e o lucro em relação a direitos fundamentais conferidos pela Constituição Federal ao trabalhador’’.

Ofensa à intimidade
No julgamento do recurso, o relator do acórdão, desembargador Marcelo Gonçalves de Oliveira, afirmou que a prática da empresa afronta os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da não-discriminação e dos valores sociais do trabalho. Segundo o magistrado, ‘‘não é lógica a conduta da ré de verificar se o seu futuro empregado possui dívidas, porque este é que, na verdade, será o efetivo credor de valores pecuniários da relação empregatícia e não o contrário’’. Para o julgador, ‘‘a ré não tinha motivos jurídicos para efetuar consulta às pendências financeiras de candidatos, o que acarreta evidente ofensa à intimidade e privacidade desses’’.

Os desembargadores da 7ª Turma, entretanto, negaram a indenização por danos morais coletivos, pleiteada pelo MPT-RS, por considerarem que não houve danos à coletividade, mas somente aos empregados efetivamente reprovados nos processos seletivos. Os prejudicados, conforme explicou o relator, podem buscar individualmente a reparação pelo dano sofrido. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-RS.

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