Capacidade postulatória

TJ não pode afastar aplicação de lei, decide Marco Aurélio

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1 de junho de 2012, 15h18

O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, concedeu liminar para suspender decisão de desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo que cassou a capacidade postulatória de um defensor público até que ele regularizasse sua inscrição na OAB. A liminar, da quarta-feira (30/5), diz que um desembargador, ou turma, de TJ não pode afastar lei por sua inconstitucionalidade. Aplicou a Súmula 10 do STF, que trata da reserva de plenário do Supremo para questões constitucionais, conforme o artigo 97 da Constituição Federal.

Marco Aurélio não discutiu se os defensores devem ou não estar inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil, questão que tramita no Supremo por meio de Ação Direta de Inconstitucionalidade (leia mais abaixo). Apenas reformou a decisão do TJ paulista, que confronta, segundo o ministro, um princípio constitucional e jurisprudência já pacífica do STF.

Enquanto o Supremo não se pronunciar sobre a matéria, decidiu Marco Aurélio, os efeitos da decisão do TJ paulista estão suspensos. Com isso, o defensor público Bruno Ricardo Miragaia de Souza volta a poder postular na Justiça sem estar inscrito na OAB. A possibilidade está descrita no parágrafo 6º do artigo 4º da Lei Complementar 80/1994 (Lei Orgânica da Defensoria), com a redação dada pela Lei Complementar 132/2009.

A liminar foi dada em Reclamação ajuizada no Supremo contra despacho do desembargador Jacob Valente, do Tribunal de Justiça de São Paulo. Monocraticamente, o desembargador, da 12ª Câmara de Direito Privado do TJ, determinou que, para postular na Justiça, o defensor deveria regularizar sua inscrição na OAB. Antes disso, estaria impedido de praticar o que chamou de “atos privativos de advogados”. Baseou-se na Lei 8.906/1994, o Estatuto do Advogado.

Na liminar, o ministro Marco Aurélio afirma que o desembargador do TJ-SP declarou a “ineficácia” do parágrafo 6º do artigo 4º da Lei Complementar 80/1994, com a redação dada pela Lei Complementar 132/2009. O artigo 4º, parágrafo 6º, da LC 132 diz que “a capacidade postulatória do Defensor Público decorre exclusivamente de sua nomeação e posse no cargo público”. Não menciona inscrição na OAB.

Entretanto, segundo Marco Aurélio, o desembargador do TJ não poderia ter afastado a aplicação da lei “sem a instauração do incidente de constitucionalidade”. “A utilização de vocábulo impróprio — ineficácia — não tem o condão de modificar o resultado prático da decisão: o afastamento, por inconstitucionalidade, do mencionado dispositivo”, afirmou.

O ministro lembra que a decisão viola o disposto na Súmula 10 do STF: “Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte”. Suspendeu a decisão até que o mérito da Reclamação seja apreciado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal.

Briga antiga
A liminar do STF é mais um capítulo da briga entre a Defensoria Pública e a OAB. A autarquia ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o artigo 4º da Lei Complementar 80/1994, a Lei Orgânica da Defensoria Pública. Afirma que a lei, ao permitir que defensores atuem sem inscrição na OAB, é inconstitucional — fere o artigo 133 da Constituição, segundo o qual “o advogado é indispensável à administração da Justiça”.

Na prática, a OAB questiona a Lei Complementar 132/2009, que deu nova redação ao artigo 4º da Lei Orgânica da Defensoria. Diz o artigo 4º, parágrafo 6º, da LC 132 que “a capacidade postulatória do Defensor Público decorre exclusivamente de sua nomeação e posse no cargo público”. Não menciona inscrição na OAB.

Já o inciso V do parágrafo 4º da Lei Complementar 132 diz que a competência da Defensoria é representar “pessoas naturais e jurídicas, em processos administrativos e judiciais”, em todas as instâncias. Neste caso, a OAB questiona o trecho específico “e jurídicas”.

Ainda não há decisão do Supremo na ADI, mas a liminar de Marco Aurélio — dada em outro caso — acompanha as manifestações apregoadas no processo. Procuradoria-Geral de República, Advocacia-Geral da União e os professores Celso Antonio Bandeira de Mello e André Ramos Tavares emitiram pareceres defendendo a independência da capacidade postulatória da Defensoria em relação à OAB.

Reclamação 13.672

Notícia alterada às 15h30 do domingo (3/6) para acréscimo de informação no primeiro parágrafo. Conforme apontado pelos comentaristas, o ministro Marco Aurélio não entrou no mérito da questão. Aplicou o princípio da reserva de plenário para incidentes de constitucionalidade, previsto na Súmula 10 do STF e no artigo 97 da Constituição Federal. A ConJur agadece a atenção e participação dos leitores e comentaristas.

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