Discriminação injustificada

Alliance One terá de indenizar por quebra de contrato

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4 de janeiro de 2012, 6h19

A 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve a sentença que condenou a fumageira Alliance One a indenizar uma transportadora do município de Vera Cruz por quebra de contrato. Além da indenização por lucros cessantes relativa a um ano de contrato não cumprido, os desembargadores concordaram com os R$ 33,2 mil arbitrados para reparação por dano moral por macular a imagem da transportadora e de seus sócios no mercado. Cabe recurso.

No dia 9 de março de 1999, a transportadora firmou com a Alliance One Exportadora de Tabacos um contrato para transporte de fumo cru, por prazo indeterminado. A Alliance, entretanto, exigiu que o transportador se transformasse em pessoa jurídica, tendo em vista que não realizava contratos com pessoas físicas. Em 15 de março de 1999, a autora iniciou suas atividades, sendo que na primeira safra obteve um faturamento de R$ 30 mil. Em janeiro de 2000, a multinacional do tabaco chamou a autora para assinar novos contratos, com aumento no volume. Entretanto, desta vez, os contratos tinham prazo de apenas um ano.

Apesar de regiamente contratada, a autora não foi chamada para fazer o transporte da safra de fumo. As demais contratadas nas mesmas condições, por outro lado, continuavam a operar no transporte. Com os caminhões parados e acumulando prejuízo, a empresa não teve outra opção senão recorrer à Justiça. Ajuizou ação de indenização contra a Alliance One na Vara da Comarca de Vera Cruz. Os pedidos: R$ 428.176,20 por danos materiais e um valor não inferior a 300 salários mínimos por danos morais.

Em juízo, a exportadora alegou que os serviços prestados não seriam de forma exclusiva para qualquer das partes. Ou seja, tanto podia contar com outras transportadoras quanto a outra parte fazer fretes para terceiros. Disse que o primeiro contrato por prazo indeterminado foi extinto e firmado um novo, pelo prazo de um ano. Explicou que, algumas vezes, o volume a ser transportado é muito grande, sendo requerido um grande número de veículos aos transportadores. Quem não dispõe de caminhões suficientes, acaba perdendo a carga para outros transportadores. E foi justamente isso o que aconteceu com a autora em janeiro de 2000 que, insatisfeita, manifestou desinteresse pelo transporte. Assim, vencido o prazo do contrato e não contando com a autora para a prestação dos serviços, ante o claro abandono de sua parte, a Alliance deu por encerrado o caso.

O juiz Marcelo da Silva Carvalho, em sentença proferida em 3 de novembro de 2008, disse que o pedido merecia parcial procedência. E registrou que ambas as partes não questionaram nos autos a validade dos contratos, mas somente o descumprimento do que foi tratado e os supostos prejuízos. Neste sentido, o magistrado se concentrou nos dois últimos contratos firmados entre as partes, já que o primeiro não foi objeto de contestação, sendo regularmente quitado. E estes foram descumpridos pela multinacional, frisou.

Para o magistrado da primeira instância, a quebra de contrato se deu pelo simples fato de que a exportadora, durante o período de contratação, transportou fumo por meio das outras duas transportadoras que a serviam – Deufel e Augusta. Segundo ele, não se sabe, até hoje, o motivo por que a autora não recebeu pedido de carga.

Na ótica do juiz, o certo seria, juntamente com as outras duas empresas, manter o rodízio de transporte de cargas de fumo, observando a contratação e o que havia ocorrido em 1999. Tal prática é fato inegável e normal junto à empresas que fazem transporte de cargas de fumo. ‘‘As alegações (…) de que a não-oferta de carga ocorreu por falta de limpeza nos caminhões da autora ou por atitudes indevidas da autora, ao tentar ‘furar a fila’ de carga e recusar fazer cargas a menos, não veio em momento algum demonstrada nos autos, não se incumbindo a requerida do disposto no artigo 333, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC)’’.

Assim, o magistrado entendeu que a exportadora feriu a boa-fé que se espera nas contratações, conforme os artigos 113 e 422 do Código Civil de 2002. Afinal, criou uma expectativa que não se consumou, por sua exclusiva culpa, preterindo-a em favor das outras duas transportadoras. E mais: considerou a atitude da empresa como ato ilícito nos termos do artigo 186 do mesmo Código.

Ao arbitrar as indenizações, considerou que o pedido por lucros cessantes exorbitante, porque o máximo que se poderia buscar de reparação seria o lucro líquido de transporte de carga durante o período de contratação, e jamais o faturamento bruto. ‘‘E digo mais, deverá buscar o que deixou de lucrar durante a vigência do contrato e não o que futuramente deixou de receber pelos anos seguintes, até o limite de quatro, como exposto na inicial. E a solução nesse sentido é simples, tratando-se de contrato por prazo determinado, não se responsabilizam as partes além desse prazo. Ainda, não havia garantia de que o contrato seria renovado por um ou mais anos com a autora e, portanto, nem expectativa de direito possuía’’, advertiu. O valor para indenização seguiu para arbitramento, em liquidação de sentença, que analisará o movimento de fretes no período de 14 de janeiro de 2000 a 13 de dezembro de 2000.

O juiz disse também ser devida uma reparação por dano morais, pois a recusa em oferecer frete à transportadora foi ‘‘naturalmente afrontante’’ ao nome da pessoa jurídica e, consequentemente, à pessoa de seus sócios. ‘‘No entanto, o pedido inicial de 300 salários mínimos é impensável e causaria o enriquecimento ilícito da autora. Frente à liberdade dada ao juiz para a fixação do quantum da indenização, justa a fixação do valor do dano moral no valor equivalente a 80 salários mínimos, hoje R$ 33.200,00 (trinta e três mil e duzentos reais), atualizável pelo IGP-M e acrescido de juros de mora de 12% ao ano a contar da data da sentença, tudo até a efetiva liquidação’’, finalizou.

Mesmo parcialmente vitoriosa, a empresa transportadora apelou ao Tribunal de Justiça, repisando o argumento de que os dois contratos por tempo indeterminado firmados em 14 de janeiro de 2000 criaram uma expectativa de renovação.Também se insurgiu contra os critérios de apuração de lucros cessantes. Por fim, pediu a majoração do quantum arbitrado para danos morais.

A multinacional também apelou, batendo na tecla dos mesmos argumentos oferecidos na inicial. De novo, contestou a obrigação de pagar danos morais, alegando a inexistência de  elementos a indicar que a honra objetiva da pessoa jurídica demandante foi afetada. Subsidiariamente, requereu a redução do valor da condenação por danos morais.

O desembargador Umberto Guaspari Sudbrack, relator do processo, negou provimento aos apelos, acatando na íntegra a sentença proferida pelo juiz Marcelo da Silva Carvalho. O voto do relator foi seguido, à unanimidade, pelos desembargadores Mário Crespo Brum e Orlando Heemann Júnior (presidente do colegiado).

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