Justiça Tributária

Correção do IR deve acompanhar inflação de 6,5%

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

2 de janeiro de 2012, 11h10

Spacca
A Receita Federal corrigiu em 4,5% a tabela de retenção do Imposto de Renda na fonte. Com esse ajuste o limite de isenção que até dezembro era de R$ 1.566,61 passa a R$ 1.637,11.

Trata-se de mais um ato explícito de confisco, ao arrepio de normas constitucionais e contrariando todo e qualquer princípio daquilo que conhecemos como Justiça Tributária.

No julgamento do Recurso Extraordinário 388.312, o Supremo Tribunal Federal, por maioria, negou o recurso apresentado pelo Sindicato dos Bancários de Belo Horizonte, que pretendia obter a correção automática da tabela de retenção do imposto de renda de acordo com a variação da Unidade Fiscal de Referência (Ufir). Esse julgamento demorou quase uma década e provou que a justiça pode tardar e falhar ao mesmo tempo.

Naquela oportunidade o ministro Marco Aurélio, que ficou vencido, traz todos os ingredientes para que a verdadeira justiça se fizesse. Há dois trechos do voto que merecem especial destaque:

“Os princípios da legalidade, da capacidade contributiva e do não-confisco direcionam, a mais não poder, à atualização automática da tabela decorrente da lei em comento – 9.250/95 – mantendo-a com a mesma força normativa que tinha em 1995, e aí, cumpre notar a conversão dos débitos fiscais, das pessoas naturais, da expressão Ufir para reais…”

“O Estado não pode ludibriar, espoliar ou prevalecer-se da fraqueza ou ignorância alheia. Não se admite que tal ocorra nem mesmo dentro dos limites em que seria lícito ao particular atuar.”

Considerando que a inflação de 2011 foi de 6,5%, esse deveria ser o índice de atualização da tabela. O fato de que o índice de 4,5% foi negociado com as centrais sindicais não tem qualquer relevância jurídica, pois essas entidades não representam os contribuintes mas apenas uma parte deles, os assalariados sindicalizados.

Registre-se ainda outra injustiça óbvia, que é a fixação de valores de deduções ou abatimentos abaixo da realidade. O abatimento destinado a custear as despesas com um dependente, por exemplo, não cobre as despesas mínimas de uma criança. De igual forma, a verba destinada à educação é insuficiente para o custeio da mais modesta escola da periferia e não cobre as demais despesas inerentes a uma educação digna desse nome.

Devemos levar a sério a nossa Constituição. O que nela está determinado não é negociável com nenhuma central sindical, não podendo ser objeto de permutas políticas. Ela é nosso Estatuto Maior, sem o qual nosso país se tornaria apenas um monte de gente entregue à própria sorte.

O preâmbulo da Carta diz que o Brasil é um "Estado Democrático destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança (…), a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna…”

O imposto que pagamos é o sacrifício que todos fazemos em prol do bem comum. Não é pagamento por serviço prestado, pois não se presta apenas a arrecadação. O imposto se destina à promoção da justiça social, o que justifica que muitas pessoas recebem benefícios ainda que (infelizmente) não possam contribuir. Isso se chama redistribuição de riqueza.

Ora, todos sabemos que os que ganham menos sofrem indiretamente uma carga tributária maior, pois uma maior parte do que ganham é utilizado no consumo. Assim, essas pessoas deveriam pagar menos.

Se temos uma inflação de 6,5% não podemos reajustar a tabela em 4,5%, pois estaremos sendo injustos com os trabalhadores, que não possuem meios adequados para se defender desse confisco. Não importa se houve algum acordo com alguma central de trabalhadores. Tais entidades não receberam mandato irrevogável para representar todos os contribuintes do país.

O ministro da Fazenda pode, com uma simples canetada, corrigir essa injustiça. E é apenas isso que todos desejamos: um ministro que pense no povo que paga o seu salário.

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  • é advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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