Intenção original

Robert Bork deixou legado imortal para conservadores

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26 de dezembro de 2012, 16h34

Com a morte de Robert Bork, jurista americano criador do originalismo constitucional, na semana passada, aos 85 anos, se foi uma grande liderança conservadora do país. Bork era o principal porta-voz dos críticos a qualquer posição relacionada ao chamado ativismo judicial e combatia veementemente a intervenção do Judiciário na interpretação do texto constitucional.

O originalismo prega que o juiz deve analisar o texto constitucional de acordo com a intenção de seus autores e deve se ater ao texto original de 1787 e suas emendas. Afirma que o Judiciário não pode criar, emendar ou garantir nenhum direito que não esteja descrito na Constituição. Esse papel é do Congresso, por meio da criação de leis, e não dos magistrados. É uma corrente hoje conhecida como constitucionalismo clássico.

Bork deixou também seguidores de peso. Os ministros da Suprema Corte dos EUA Antonin Scalia e Clarence Thomas adotaram o Originalismo, como forma de avaliar a constitucionalidade dos casos que chegam à corte, e se tornaram seus sucessores naturais na defesa da teoria.

Imortalidade
Em uma entrevista ao canal de televisão CNN em 2005, Robert Bork disse que, teorias à parte, sua imortalidade iria decorrer da criação do verbo “to bork”, a partir de seu sobrenome. Se incorporado ao português, significa fazer campanha difamatória, especialmente por meio da mídia, com o fim de destruir, por motivação política, um candidato a cargo público.

Foi basicamente o que se passou com o próprio Bork quando ele foi nomeado pelo ex-presidente Ronald Reagan para a Suprema Corte dos EUA em 1987, apesar de seu passado com passagens “controversas”, de seu presente ultraconservador e das intenções (vistas como inaceitáveis) do presidente. À época, a Suprema Corte dos EUA tinha quatro ministros conservadores, quatro ministros liberais, e o ministro Lewis Powell, que se aposentaria em 27 de junho de 1987. Reagan preteriu a promoção do ministro auxiliar William Rehnquist em favor da nomeação de Bork para garantir maioria conservadora na Suprema Corte.

No momento em que a nomeação foi anunciada, o então senador Ted Kennedy foi à tribuna do Senado para condená-la: “A América de Robert Bork é uma terra em que as mulheres são forçadas a procurar clínicas de aborto clandestinas, os negros são segregados a cantos de balcões em restaurantes, a polícia pode invadir casas no meio da noite, as escolas não podem ensinar a teoria da evolução às crianças, escritores e artistas podem ser censurados à vontade do governo e as portas da Justiça são fechadas a cidadãos que deveria proteger, em nome da democracia”.

O discurso de Kennedy repercutiu na imprensa e inflamou a campanha contra Bork. Além do noticiário, que deu espaço a grupos de defesa de direitos humanos e a todo tipo de pensamento liberal, foram feitos anúncios para a televisão, um deles narrado por Gregory Peck, retratando Bork como um extremista. Bork sofreu uma derrota incomum no Senado: 58 votos contra, 42 a favor. Pouco tempo depois, o Senado aprovou a nomeação do ministro Anthony Kennedy para a Suprema Corte.

Também pesou na campanha a participação de Bork no caso Watergate. Em 20 de outubro de 1973, ele foi o “instrumento” do episódio que ficou conhecido nos EUA como o “Saturday Night Massacre” (O Massacre de Sábado à Noite): a demissão do promotor especial Archibald Cox, que investigava o caso Watergate. Cox havia requisitado as fitas gravadas das conversações na Casa Branca, que poderiam selar o impeachment do então presidente Nixon.

Em vez de entregar as fitas gravadas, Nixon ordenou ao então procurador-geral dos EUA, Elliott Richardson, que demitisse Cox. Richardson se negou a fazê-lo e pediu demissão. Nixon aceitou a demissão e repassou a ordem para o vice-procurador geral, William Ruckelshaus, que também não aceitou a ordem e pediu demissão. Bork, que era a terceira autoridade na Procuradoria Geral, subiu para o topo e cumpriu a ordem. O ato de demissão foi considerado ilegal pela Justiça em novembro do mesmo ano, em uma ação movida pelo frequente candidato presidencial Ralph Nader.

Semântica e linguística
O verbo “to bork” foi provavelmente usado pela primeira vez em um artigo publicado pelo The Atlanta Journal-Constitution, de acordo com a Wikipédia. Mas o novo verbo se popularizou apenas em julho de 1991, durante uma conferência da Organização Nacional das Mulheres, em Nova York. Ao sugerir, em um discurso, uma campanha para impedir a nomeação para a Suprema Corte de Clarence Thomas — hoje um “originalista” — a feminista propôs: “Vamos matá-lo politicamente”. Thomas foi aprovado pelo Senado, mas foi a confirmação mais dividida da história do país.

Em março de 2002, o Oxford English Dictionary adicionou o verbete “bork” a seu conteúdo, com a definição: “difamar ou vilipendiar (uma pessoa) sistematicamente, especialmente através da mídia de massa, usualmente com o objetivo de impedir sua nomeação para um cargo público; obstruir ou cercear (uma pessoa) dessa forma”.

Apesar de controvertido, Robert Bork era um ícone do movimento conservador americano. Sua morte foi lamentada por ministros da Suprema Corte e representou uma grande perda para o Partido Republicano. O senador republicano por Utah Mike Lee deu uma noção dos sentimentos conservadores do país: “Robert Bork foi um dos maiores juristas dos Estados Unidos e uma mente brilhante”.

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