Interpretação e aplicação

EUA debatem prazo prescricional em crimes financeiros

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16 de dezembro de 2012, 8h03

Nos Estados Unidos crimes financeiros costumavam prescrever em cinco anos. Muitos crimes do colarinho branco viraram “história de sucesso” porque os autores não foram processados e punidos a tempo, nos termos da Lei da Prescrição (o Statute of Limitations). Casos terminaram em tribunais, mais os juízes fizeram o que lhes cabe: aplicar a lei. Até que um caso caiu nas mãos do juiz federal Jed Rakoff, de um tribunal de recursos de Nova York, que fez o que os juízes também fazem: interpretar a lei.

Na interpretação de Rakoff, um crime só existe perante a lei quando ele é descoberto. Isto é, o prazo de prescrição só começa a contar a partir do momento em que um órgão público descobre e denuncia um crime financeiro, “não importa quão antigo ele seja”. O caso entrou, agora, na pauta da Suprema Corte dos EUA, que aceitou interpretar a lei para todo o país. Se a Suprema Corte concordar com o juiz, vai mudar muita coisa nos EUA, diz o site Law.com, em um artigo cujo título é O passado nunca morre.

No Brasil, de acordo com o Código Penal, o prazo depende do crime cometido. É o que explica o advogado Pierpaolo Cruz Bottini, do Bottini & Tamasauskas Advogados. “Nos crimes permanentes, como manutenção de depósitos não declarados no exterior, o incio da prescrição começa do dia da cessação da conduta. Nos crimes instantâneos, como divulgar informação falsa sobre instituição financeira, o inicio da prescrição é a data da conduta”, ensina.

A lei americana diz que “exceto se for estabelecido de outra forma por legislação do Congresso”, qualquer ação movida por órgão governamental (no caso específico, por crime financeiro) deve ser “iniciada dentro do prazo de cinco anos, a contar da data em que a alegação surgiu pela primeira vez”. A parte final, a do surgimento da alegação, dá margem a interpretações. A lei não deixa claro, por exemplo, se esse prazo começa a correr a partir do momento em que a fraude é “descoberta” por órgão do governo ou que se torna pública ou ainda a partir do momento em que o autor é indiciado. Caberá à Suprema Corte esclarecer.

A primeira “vítima” da nova interpretação da lei foi o financista Marc Gabelli, da Gabelli Funds LLC, que ajudou uma empresa inglesa a fazer negócios ilícitos no mercado financeiro de 1999 a 2002. Cinco anos mais tarde, em 2007, o assunto estaria teoricamente morto e enterrado. Mas, em 2008, a Securities and Exchange Comission (SEC), o órgão regulador do mercado de capitais americano, processou a Gabelli Funds no momento em que a empresa aceitou fechar um acordo de US$ 16 milhões para encerrar o caso.

No tribunal, a SEC demonstrou que só tomou conhecimento do caso em setembro de 2003, quando o então procurador-geral do estado de Nova York, Eliot Spitzer, desmascarou as operações irregulares da empresa no mercado financeiro. Estaria movendo a ação, portanto, dentro do prazo – e depois de aproveitar todo o tempo à sua disposição para fazer as investigações e promover o processo.

O tempo que a SEC – ou qualquer órgão público de fiscalização – precisa para investigar casos e preparar ações judiciais é uma das questões em jogo na decisão da Suprema Corte. A professora da Faculdade de Direito da Universidade de Tulane, que já foi assessora jurídica da SEC, disse à Associated Press que cinco anos é um prazo relativamente curto em alguns casos de crimes financeiros.

A outra questão em jogo é a extensão da decisão para outros tipos de crime, envolvendo esferas diferentes do governo. “Praticamente, todo tipo de delito tem um prazo de prescrição, a não ser por crimes de morte e alguns tipos únicos de crimes”, disse o advogado Robert Anello, da firma Morvillo Abramowitz, que escreveu um artigo sobre o assunto no New York Law Journal. “A expansão será significativa”, ele afirma.

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