AP 470

Peluso confirma condenações e se despede do STF

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29 de agosto de 2012, 17h35

Carlos Humberto/SCO/STF
O ministro Cezar Peluso concedeu, nesta quarta-feira (29/8), seu último voto como membro do Supremo Tribunal Federal durante o julgamento da Ação Penal 470, o processo do mensalão. Peluso aposenta-se compulsoriamente na próxima segunda-feira (3/9).

Desta forma, o ministro limitou sua participação no julgamento da Ação Penal 470 à avaliação dos crimes discriminados no chamado item 3 da denúncia, que trata da atuação do publicitário Marcos Valério e seus sócios durante a execução de contratos com a Câmara dos Deputados e o Banco do Brasil na época dos acontecimentos.

Peluso votou praticamente em concordância com o relator, com exceção de ter pedido a absolvição do deputado João Paulo Cunha por uma das imputações de peculato e pelo crime de lavagem de dinheiro. Ou seja, o ministro considerou o deputado federal João Paulo Cunha culpado apenas pelos crimes de corrupção passiva e peculato. Peluso também votou pela condenação dos publicitários Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano Paz pelos mesmos dois crimes. Ele seguiu o relator e revisor da ação ao confirmar ainda a condenação do ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato.

Ao encerrar seu voto, marcado pelo rigor técnico e por críticas a muitos dos argumentos apresentados pela defesa, o ministro disse que sua última participação na corte se deu justamente “condenando”. E que, por isso, encerrava sua participação no Supremo com um “sentimento amargo”. “Um juiz não condena ningúem por ódio. Nada constrange mais o magistrado do que ter que condenar um réu. Condenações são uma imposição de consciência do magistrado”, disse ao ensaiar sua despedida do tribunal. Peluso afirmou também que a condenação não deixava de ser, por mais paradoxal que soasse, “um ato de respeito aos próprios réus, pois cumprida à pena, esta passava a ser um chamado à reconciliação com a sociedade".

O ministro adiantou também seu voto no que toca à dosiometria da pena, uma vez que não teria a oportunidade de fazê-lo no final do julgamento. Peluso estabeleceu  a pena de João Paulo Cunha em seis anos em regime semiaberto, sendo incabível a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direito. Além do pagamento de multa, o ministro votou pela perda do mandato eletivo do parlamentar.

Para Marcos Valério, o ministro estabeleceu a pena de 16 anos de prisão em regime fechado. O ex-sócios de Valério, Ramon Hollerbach e e Cristiano Paz, seriam condenados a reclusão de 10 anos e 8 meses em regime fechado, e Henrique Pizzolato a 8 anos e 4 meses. Foram estipuladas também para os quatro réus o pagamento de multas variando entre um e três salários mínimos.

O ministro Cezar Peluso começou o seu voto afirmando que limitaria sua participação oral a criticar o que qualificou como confusões que ocorreram por força das sustentações orais e na medida que o julgamento é conduzido. Peluso afirmou que não cabe exigir que a acusação prove o que os indícios confirmaram ao longo da denúncia. Para ele, não existe hierarquia entre as chamadas provas diretas ou "histórico-representativas" e o indício como meio de prova. “O sistema processual, não só processual penal, assevera que a eficácia do indício é a mesma da prova direta ou histórico-representativa”, disse Peluso em referência direta ao voto do ministro Dias Toffoli, que, ao votar pela absolvição de João Paulo Cunha, afirmou que cabe, sim, à acusação esgotar as denúncias com provas.

Peluso disse que a exemplo de fatos públicos e notórios, que independem de prova, a ocorrência de crimes pode também ser provada por meio de indícios e evidências. “É a regra da experiência”, disse. “Se há fato extraoridinário que foge à conclusão com base na experiência, cabe então à defesa prová-lo”, ressaltou.  “O comportamento ilícito se infere da experiência”, reiterou.

O ministro afirmou, ainda, que o deputado João Paulo Cunha tinha o domínio jurídico e formal do processo de licitação quando era presidente da Câmara dos Deputados. Peluso afirmou também que alegar que os R$ 50 mil sacados pela mulher de Cunha eram destinados a custear uma pesquisa eleitoral é “absolutamente inverossímel”.  “Ainda que por hipótese se tratasse de dinheiro do PT, o procedimento clandestino não se justificaria”, afirmou.

Quanto às subcontratações, o ministro observou que a maioria delas sequer dizia respeito à terceirização de serviços e algumas foram autorizadas para a realização de "atividades absurdas", como a elaboração de textos para impressos voltados para funcionários da Câmara. “Tratou-se de um grande guarda-chuva que serviu para que esses gastos superatrofiados pudessem ser recebidos em dano da administração pública”, disse.

Cezar Peluso divergiu do relator, contudo, ao afastar a primeira acusação de peculato que pesa contra o parlamentar, referente à contratação do jornalista Luiz Costa Pinto como assessor da Câmara dos Deputados. Para o ministro, as provas testemunhais deixam evidente que o jornalista prestou serviços para a Câmara e não exclusivamente para o deputado como apregoa o Ministério Público Federal.

O ministro também votou pela absolvição de João Paulo Cunha pelo crime de lavagem de dinheiro. Para Peluso, mesmo que os R$ 50 mil recebidos tenham origem ilícita, ainda assim, não há como reconhecer "descrição dos fatos que demonstrem ter havido razões independentes entre os crimes de corrupção passiva e lavagem dinheiro”. O ministro entendeu que o deputado apenas recebeu “as escondidas o que não poderia receber em público”. Por uma razão técnica, Peluso voltou pela absolvição do crime de lavagem de valores, recusando, para tanto, a materialidade do fato, a aticipicidade da conduta.

Quanto aos crimes imputados a Marcos Valério e a seus sócios e ainda a Henrique Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, Cezar Peluso acompanhou o relator. Votou pela condenação em todos os crimes imputados. O ministro também absolveu o ex-secretário de comunicação social do governo Luiz Luiz Gushiken por falta de provas. Peluso também atacou a ideia de que os fundos da Visanet não configuram verba pública. O ministro afirmou que se o Banco do Brasil é proprietário de mais de 30% do fundo, logo, não cabe a conclusão de que se trata de recursos privados. 

A despedida
Ao término da participação do ministro Cezar Peluso, o presidente do STF, ministro Ayres Britto, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e o decano da corte, ministro Celso de Mello prestaram homenagens ao colega.

“Lamento que o legislador constituinte de 1988 não tenha sido tão sábio quanto o legislador republicano, em 1891, que sequer estabeleceu limite etário para efeito de aposentadoria compulsória”, disse o ministro Celso de Mello ao render homenagens ao colega.

“Com isso, o STF dispôs de notáveis magistrados ao longo de décadas. É lamentável que, não só o Poder Judiciário, mas esse país venha ficar privado de figuras eminentes como o ilustre juiz e ministro da Suprema Corte, Cezar Peluso”, afirmou Celso de Mello.

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