Advocacia de Estado

Falta de comprometimento da AGU afeta advocacia

Autor

  • Allan Titonelli Nunes

    é procurador da Fazenda Nacional e desembargador Eleitoral Substituto do TRE-RJ mestre em Administração Pública pela FGV especialista em Direito Tributário ex-presidente do Forum Nacional da Advocacia Pública Federal e do Sinprofaz. Membro da Academia Brasileira de Direito Político e Eleitoral (Abradep).

7 de agosto de 2012, 15h27

O Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz) tem 22 anos de existência e durante esse período sempre se notabilizou pelo caráter combativo, pluralista, apartidário, que defende os interesses da carreira que representa, mas sem descurar de intervir nas causas de natureza tributária, defesa do patrimônio público e do Estado Democrático de Direito, objetivando resguardar o interesse público. Exemplo disso é a exitosa Campanha Nacional da Justiça Fiscal, que tem como finalidade promover um debate sobre o combate à sonegação fiscal, a educação fiscal, a Reforma Tributária e a inclusão do procurador da Fazenda Nacional nos respectivos temas, podendo ser visualizada através do site e das redes sociais do movimento QuantoCustaoBrasilpraVocê?[1]

Nessa senda, o Sinprofaz vem expondo diversos problemas que afligem a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e a Advocacia-Geral da União e cobrando soluções e manifestações públicas, notórias e combativas dos dirigentes da Advocacia-Geral da União, precipuamente do ministro Adams, em defesa da instituição e em relação à necessidade de: criar uma carreira de apoio, objetivando dar maior celeridade e eficiência nos trâmites operacionais, realizando-se os concursos públicos necessários a esse provimento; modernizar e integrar as instalações e funcionalidades técnicas dos sistemas de informática; prover todo o quadro efetivo de procuradores da Fazenda Nacional; instituir prerrogativas isonômicas àquelas existentes para os magistrados e promotores, visando dar condições de igualdade no enfrentamento judicial e implantar remuneração isonômica às demais funções essenciais à Justiça e às procuradorias dos estados, evitando o elevado índice de evasão dos procuradores da Fazenda Nacional e o decorrente comprometimento da atividade de defesa do Estado, conforme determina a Constituição.

Não obstante essas cobranças, e a falta de atitudes concretas, os procuradores da Fazenda Nacional continuam entendendo que há um impactante contraste entre a importância das atividades desenvolvidas pela advocacia pública federal e a absoluta falta de investimentos em sua manutenção, cujo resultado é uma sobrecarga de trabalho, infraestrutura precária, carência de recursos humanos e materiais, remuneração inferior à especialização de seus membros e em contrariedade à isonomia constitucional prevista entre as Funções Essenciais à Justiça, entre outros problemas. Todas essas mazelas contribuem para a existência de verdadeira crise institucional de graves proporções e inevitáveis consequências ao desenvolvimento regular dessas atividades.

Soma-se ao exposto o projeto de alteração da Lei Complementar da AGU, o qual foi concebido de maneira sigilosa e tramitou no Poder Executivo Federal sem qualquer debate democrático entre as carreiras representativas da AGU. A nova Lei Orgânica da AGU poderia eliminar os problemas vividos pelos profissionais, mas pelo que se pode evidenciar, nada apresentou para mudar a realidade.

O respectivo projeto é extremamente danoso à proteção do interesse público, permitindo o exercício de funções típicas de Estado por não concursados, advindos da iniciativa privada, e institui uma política de excessiva verticalização da atuação técnica dos membros da instituição, com grave violação ao livre exercício da advocacia. Diversos dispositivos atentam contra a garantia de uma advocacia pública independente, principalmente por não restringir a ocupação dos cargos jurídicos da AGU exclusivamente aos membros das carreiras, assim como por eliminar a discricionariedade técnica dos advogados públicos federais na emissão dos pareceres, entre outros atos.

Em comparação aos demais estados da Federação, o projeto proposto de estatuto da advocacia pública federal é retrógrado em relação ao aspecto da gestão, às garantias ao exercício das funções institucionais e às prerrogativas de seus membros.

Essa mudança radical em relação à concepção de uma advocacia de Estado contraria as necessidades para se combater a corrupção, evitar a ingerência política de um órgão estritamente técnico e defesa do Estado Democrático de Direito. Causa estranheza o fato de o governo propagar ser de continuidade e ter dado tratamento tão distinto ao tema, pois o projeto capitaneado pelo então AGU Antônio Dias Toffoli era muito mais moderno e tratava a advocacia pública federal respeitando suas prerrogativas básicas.

De outro giro, apesar da inexistência de qualquer diferença, em prevalência ou hierarquia, entre a defesa da sociedade, do Estado e dos hipossuficientes, persiste indevida disparidade de tratamento entre as funções essenciais à Justiça. É uma chapada contrariedade à lógica constitucional, cuja demanda passa pela necessidade de equiparação de vencimentos e prerrogativas entre todas as funções essenciais à Justiça, fato já reconhecido e respaldado pelos dois ministros da AGU antecessores, Álvaro Augusto Ribeiro Costa e Antônio Dias Toffoli.

A concretização de uma remuneração isonômica às demais funções essenciais à Justiça, como já ocorre com as procuradorias dos estados, respeita o que prevê a Constituição, evita o elevado índice de evasão das carreiras da AGU e o risco de precarização da defesa dos interesses da União, além de sedimentar a paridade de armas no âmbito do processo. Dar continuidade ao anseio do legislador constituinte, conforme prevê o Título IV, Capítulo IV da Constituição, bem como o disposto no artigo 29, parágrafo 2º, do ADCT, é de fundamental importância para correção dessa desigual realidade.

Soma-se a isso o que dispõe o artigo 37, XII, da CF/88, o qual determina isonomia remuneratória entre os poderes, e o Decreto Legislativo 805/2010, que concretizou em parte essa garantia. Cabe lembrar que os advogados do Senado possuem remuneração igual aos magistrados e aos membros do Ministério Público, motivo pelo qual deve-se concretizar esse preceito em relação à advocacia pública federal.

Por essas razões, a carreira de procurador da Fazenda Nacional, através de seu sindicato com mais de 1.800 filiados, manifestou livre e democraticamente, em sua assembleia geral extraordinária (AGE), a decisão de repudiar a falta de comprometimento dos dirigentes da AGU com o comando constitucional e com a defesa de uma advocacia pública federal forte. A insatisfação com os rumos tomados pela direção da AGU foi consubstanciada em uma campanha intitulada “Fora Adams”, que tem a intenção de demonstrar o descontentamento dos PFNs com a atual direção da AGU e com o ministro Adams.

Os principais pontos da gestão atacados pelo movimento é a falta de uma defesa pública de fortalecimento da AGU, com prerrogativas e remuneração isonômica às demais funções essenciais à Justiça; contrariedade às propostas da direção da AGU com os propósitos da carreira; malefícios de uma proposta de advocacia de governo em detrimento de uma verdadeira advocacia de Estado valorizada e estruturada, cuja principal ameaça é a privatização das consultorias, eliminação da discricionariedade técnica dos advogados públicos federais na emissão dos pareceres; entre outras considerações.

As propostas em debate na AGE foram encaminhadas para todos os filiados ao Sinprofaz — inclusive o ministro Adams — que tomaram conhecimento, possibilitando o comparecimento e defesa de seu ponto de vista.

Ante ao exposto, o Sinprofaz vem ratificar sua insatisfação com o momento que a advocacia pública federal atravessa, bem como repudiar qualquer iniciativa oficial que tente tolher sua manifestação, precipuamente exteriorizando que a decisão da carreira é soberana. Não se trata de qualquer propaganda política, mas divergência com os rumos que a advocacia pública federal toma, para que alcancemos o nível de excelência que a sociedade requer da instituição, que exerce função essencial à Justiça, como consignado na Constituição Federal.


[1] Disponível em : <http://www.quantocustaobrasil.com.br > Acesso em: 01.08.2012.

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