Audiência pública

OAB discute associação com bancas estrangeiras

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29 de abril de 2012, 7h10

Tabu na Ordem dos Advogados do Brasil, a abertura da advocacia para parcerias com bancas estrangeiras volta mais uma vez à pauta de debates da entidade. Logo no começo de maio, no dia 7, uma terça-feira, uma audiência pública está marcada para decidir justamente os rumos do assunto, com vozes de todos os lados.

Estarão presentes tanto opositores quanto apoiadores da abertura, inclusive órgãos de advocacia estrangeira, em uma discussão que promete ser dura — embora haja uma tendência no sentido de permitir a associação com os gringos desde que livre de dependência ou controle por parte dos estrangeiros ou, ainda, sem que essas bancas tenham poder de atuar judicialmente.

O ponto principal dos debates é o Provimento 91, de 2000, que estipulou regras para o exercício da atividade de consultores e sociedades de consultores estrangeiros no país. De acordo com o artigo 2º, a autorização da OAB enseja exclusivamente a prática de consultoria no direito estrangeiro correspondente ao país ou estado de origem do profissional interessado, sendo vedados expressamente o exercício do procuratório judicial e de consultoria ou assessoria em Direito brasileiro.

“No entanto, esse provimento não encerra o debate. A reunião é um primeiro passo para decidirmos se ele será mantido ou não”, conta Cezar Britto, presidente da Comissão de Relações Internacionais do Conselho Federal da OAB. “Precisamos saber se são possíveis outros tipos de parceria, como escritórios de fora contratando advogados daqui, por exemplo, ou, ainda, quando o negócio envolve duas legislações e também convenção internacional.”

O advogado lembra que “o Brasil cresceu e se internacionalizou”. “Como podemos fazer com que essa mudança reflita no mundo jurídico? Como a advocacia pode crescer junto com o Brasil, preenchendo esses espaços internacionais?”, indaga. “Não podemos ser pequenos juridicamente”, diz.

Até agora, as indagações não têm respostas. Um parecer sobre o assunto foi escrito pelo advogado e conselheiro da OAB do Rio, Carlos Roberto Siqueira Castro, criando mais restrições. Além dele, também escreveram pareceres o constitucionalista Luís Roberto Barroso e o professor Miguel Reale Júnior.

Ao longo de 149 páginas, Siqueira Castro não deixou de reconhecer a posição do Brasil no mercado internacional, mas ainda assim propõe a vedação “da associação, a qualquer título, entre advogados ou sociedades de advogados brasileiras e advogados ou firmas estrangeiras de advocacia, registradas, ou não, junto à OAB como consultores ou sociedades consultoras em Direito estrangeiro, que importe em perda ou diminuição da identidade institucional ou da autonomia da gestão administrativa, financeira, profissional ou de planejamento estratégico por parte das sociedades de advogados brasileiras”.

No documento, ele elenca uma série de futuras proibições, como a utilização de endereço comum no Brasil, uso e divulgação de expressões como “em cooperação com” e “associado a”, material de publicidade e comunicação comuns ou com referências recíprocas, promoção de eventos jurídicos e ações conjuntas promocionais no mercado de advocacia brasileiro.

“O Siqueira Castro entende que esses advogados estrangeiros não são escritórios, mas sim empresários. Para mim, eles são escritórios, sim”, enfatiza Britto. Há ainda quem enxergue na reforma do provimento uma manobra para estreitar as possibilidades de associação.

Um deles é André Elali, sócio-fundador da André Elali Advogados, em Natal. A banca tem, hoje, 25 advogados. Ele explica que os advogados pequenos conseguiram crescer, em muitos casos, graças à associação com as bancas de fora. De 2005 a 2008, conta, muitas companhias da Suécia, da Noruega, da Espanha e da Inglaterra se instalaram no nordeste brasileiro. “Nas joint ventures, a associação é essencial”, exemplifica.

“Com a restrição, muitos escritórios que estão fora do eixo Rio-São Paulo terão dificuldades para acessar o mercado”. E mais: para ele, o objetivo da reforma do provimento é não permitir que as pequenas e médias bancas se firmem no mercado. “A opção é apenas retórica. Os grandes não querem perder o nicho”, avalia. “É arcaica essa visão de achar que advocacia não é negócio. Na prática, todo mundo que repete isso faz outra coisa. E se os escritórios não fizerem as parcerias formalmente, farão informalmente”, opina.

Jean-Paul Prates, diretor-presidente do Centro de Estratégias em Recursos Naturais e Energia e co-autor do marco regulatório do petróleo e dos royalties, já trabalhou com diversos escritórios de outros países, como o canadense Macleod Dixon e o inglês Clyde & Co. Ele diz nunca ter presenciado “advogado estrangeiro ou escritórios estrangeiros que estão no Brasil atuando em Direito brasileiro, o que seria ilegal no Brasil e no próprio país onde possuem sedes”.

Para ele, a regulamentação deve fugir da “xenofobia”. “O Brasil vive um momento especialmente positivo e de inserção e importância cada vez maior no cenário internacional”, diz. “A cooperação é extremamente benéfica para os escritórios nacionais, pois permite uma presença global, muito importante para o atendimento eficaz e harmonizado a clientes com operações globais, como é o caso, inclusive, das empresas brasileiras de grande, médio e até pequeno porte, cada vez mais presentes em diversos segmentos de negocio no exterior.”

Ele diz, ainda, que a atividade é terceirizada por muitos escritórios. “Se podem terceirizar no mercado, não ha razão de não poderem compartilhar experiências, sistemas de gestão e procedimentos que acabam aprimorando a própria governança do escritório brasileiro, mantida a independência jurídica e sendo o gestor um sócio habilitado e registrado pela OAB”.

Foi a banca Tauil & Chequer Advogados que encomendou o parecer do professor Miguel Reale Júnior. "O parecer do Siqueira Castro aponta que a associação viola alguns princípios da advocacia. No parecer, o Reale discorda radicalmente", diz Ivan Tauil, sócio do escritório.

"Essa posição de São Paulo sobre a associação tem matizes de corporativismo, de reserva de mercado mesmo. Querem proibir a possibilidade de crescimento das bancas menores, o que pra mim é o ponto mais positivo dessa associação. É um cenário diferente do colocado, do nacional contra o estrangeiro. É, na verdade, o velho contra o novo", argumenta.

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