Secretaria da Justiça evita ações no Judiciário
3 de setembro de 2011, 8h25
Com base nas leis estaduais 10.948/2001 e 14.187/2010, a Secretaria de Justiça de São Paulo tem processado casos de preconceito. As acusações levadas à esfera administrativa são apreciadas pela chamada Comissão Processante Especial e podem resultar na aplicação de penas que vão desde uma advertência, multa, até cassação do alvará (autorização) de funcionamento, em caso de estabelecimentos comerciais. Além disso, a Secretaria evita que pequenas desavenças como desentendimentos entre vizinhos ou familiares cheguem ao Judiciário com a resolução desses conflitos por meio das Câmaras de Conciliação.
Desde 2002, a Comissão Processante julga casos de homofobia (com base na Lei 10.948/2001) e, desde 2010, preconceito racial e étnico(com base na lei 14.187/2010). A lei paulista da homofobia, por exemplo, determina sanção administrativa contra quem cometer qualquer ato de discriminação dos direitos individuais e coletivos dos cidadãos homossexuais, bissexuais ou transgêneros e, atribui à Comissão a responsabilidade de julgar estes processos. Desde 2002, 211 casos foram processados e 80 estão em andamento. Somente em 2011, 44 processos já foram abertos.
Na Comissão, o trâmite dos processos se dá de forma muito parecida com a do Judiciário, uma vez que, recebida a denúncia, o acusado é intimado. Ele ou o advogado manifestam a defesa, e após o colhimento de provas e depoimento de testemunhas, a comissão profere a decisão que poderá ser de um mil ou três mil Unidades Fiscais do Estado de São Paulo (Ufesps); suspensão da licença comercial por 30 dias, ou a sua cassação. Contra a decisão cabe recurso, que é destinado ao secretário de Justiça.
Em julho deste ano, a Secretaria promoveu seminário para debater os resultados da lei contra a discriminação racial ou étnica. Na ocasião, foi informado que pelo menos 68 casos tinham sido julgados, sendo 37 na capital e 11 na região metropolitana, além de 20 denúncias do interior. “A lei cria um parâmetro de atuação direta do poder Executivo e encoraja as pessoas a apresentarem denúncias”, comentou o coordenador de Políticas para a População Negra e Indígena, da Secretaria da Justiça de São Paulo, Antonio Carlos Arruda.
Em entrevista à ConJur, a secretária da Justiça, Eloisa de Souza Arruda, disse que a Secretaria não julga crimes, já que estes são previsto por leis federais e possuem os tribunais competentes para julgá-los. “O que processamos aqui são infrações administrativas, o que é muito comum de acontecer no âmbito do estado. É o mesmo procedimento aplicado pelo guarda de trânsito quando aplica uma multa. Processamos a falta administrativa resguardando ao acusado os direitos constitucionais, contraditório e ampla defesa”, explicou.
Pequenos litígios
Outra iniciativa da Secretaria que funciona como braço do Judiciário é a Câmara de Conciliação. Presente nas regiões periféricas de São Paulo e na Região Metropolitana, tem por objetivo pacificar pequenos conflitos como desavenças familiares e entre vizinhos. Embora a Câmara objetive o mero entendimento entre as partes, isso não exclui a possibilidade de que haja reparação do dano causado.
“A Câmara possui representantes do poder público como Defensoria Pública e Ministério Público, sendo assim, um acordo fechado lá pode ser levado para chancela de um juiz, que o formalizará”, disse a secretária. “Estes casos que são pacificados, além de representarem uma demanda a menos no Judiciário — por sua natureza em si —, representam um trabalho de prevenção muito importante, uma vez que, uma mera desavença poderia resultar em um crime como uma lesão corporal grave e até mesmo um assassinato”, finalizou.
Trabalho conjunto
A Secretaria da Justiça irá contribuir para que o Poder Judiciário cumpra a resolução do Conselho Nacional de Justiça que determina que todos os estados criem núcleos de conciliação. No caso, a Secretaria irá ceder o terreno que será utilizado para a construção do centro de conciliação. Para Eloisa Arruda, a implantação é importante, uma vez que, uma das formas de desafogar o Judiciário é fazer com que processos não cheguem lá, por meio da pacificação prévia dos conflitos.
O trabalho dos centros, a grosso modo, se assemelharão com o das Câmaras e dos Juizados Especiais Cíveis, mas segundo a secretária, num sentido mais amplo. “Hoje, quando você chega numa audiência de conciliação de um Juizado Especial Cível, a pessoa que se apresenta como conciliador, por vezes, simplesmente pergunta se as partes farão um acordo. O Centro de Conciliação possuirá uma estrutura e visão mais ampla, o conciliador será um intermediário na busca pela solução do conflito, ajudando para que aquela questão seja pacificada.”
Carro-chefe
Não há dúvidas de que a Fundação Procon é o meio pela qual a população mais se relaciona com Secretaria da Justiça — à qual ela está vinculada.
A Fundação é uma entidade jurídica de direito público com autonomia técnica, administrativa e financeira. O Procon-SP recebe, analisa e encaminha reclamações de consumidores de forma individual ou coletiva, além de fornecer orientação aos consumidores sobre seus direitos. O órgão também oferece subsídios e acompanha ações judiciais coletivas propostas pela própria entidade.
Recentemente, a Justiça decidiu que a AES Eletropaulo deve restabelecer o fornecimento de energia elétrica em até quatro horas após a interrupção, devendo pagar R$ 500 mil de multa por cada hora que exceder esse período. Esta decisão atendeu ao pedido de uma Ação Civil Pública apresentada à Justiça pela Fundação Procon.
Em 2010, de um total de 630.715 atendimentos (simples consultas, atendimento preliminar, orientação, etc.) realizados pelo Procon-SP, apenas 31.509 (5%) transformaram-se em reclamações. Com relação a 2009, houve um aumento de 18,1% no total de atendimentos. Em contrapartida, os que se transformaram em reclamações fundamentadas diminuíram 24,5% em relação ao mesmo período.
Secretária de Justiça
Eloisa foi a primeira e única promotora brasileira a atuar no Tribunal Penal instituído durante a administração transitória da ONU no Timor Leste, com o objetivo de investigar, processar e julgar os chamados serious crimes of Timor Leste. Em 2003, foi promovida por antiguidade ao cargo de procuradora de Justiça, atuando nas áreas de Habeas Corpus e Mandado de Segurança.
Entre os anos de 2007 e 2009, integrou o Conselho Superior do Ministério Público. Em 2010, foi eleita por unanimidade para comandar o Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional/Escola Superior do Ministério Público. Graduada em Direito pela PUC-SP, onde também cursou mestrado em Direito Processual Penal e doutorado em Direito Penal, Eloisa Arruda é professora de Direito Processual Penal na mesma universidade e chefe do Departamento de Direito Penal e Processo Penal.
Na Espanha, especializou-se em Investigação e Provas no Processo Penal e em Justiça Constitucional e Direitos Humanos na Universidad de Castilla y La Mancha.
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