Privacidade conjugal

Sigilo telefônico não pode ser quebrado em ação civil

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16 de março de 2011, 13h03

Em Portugal, uma mulher foi punida por se negar a revelar quais ligações fez pelo seu celular. Em um processo de divórcio, na primeira instãncia, o marido apontou traição da mulher e afirmou que as chamadas telefônicas feitas por ela comprovariam a infidelidade. Neste mês, no entanto, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu que a cônjuge pode se recusar a fornecer a prova pedida.

O marido tentava provar que a culpa pelo fim do casamento foi da mulher. Ele afirmou que ela tinha um amante. O romance extraconjugal também foi apontado pelo marido como a causa do seu comportamento na vida familiar. De acordo com os autos, o homem punia a sua companheira com xingamentos e cortes de luz e água quente na casa.

Ao solicitar a separação na Justiça, pediu que a mulher fosse obrigada a apresentar a relação das ligações que fez e mensagens telefônicas que trocou nos últimos meses. Diante da recusa da mulher de fornecer a lista de telefonemas feitos, o juiz inverteu o ônus da prova e considerou provado o caso extraconjugal. Ela foi declarada a única culpada pelo fim do casamento e seu pedido de indenização pelas punições impostas a ela pelo marido foi negado.

O caso foi parar na segunda instância de Portugal, no Tribunal de Relação do Porto. Lá, o entendimento foi modificado. Os juízes entenderam que, por os dados telefônicos estarem protegidos pelo sigilo constitucional, a recusa em fornecê-los não viola o dever de cooperação na descoberta da verdade, previsto no Código de Processo Civil português. Sem a inversão do ônus da prova, o tribunal entendeu que não havia nada que comprovasse o relacionamento extraconjugal e considerou o marido o culpado pelo fim do casamento – constatação fundamental para saber quem tem de indenizar quem. O marido, então, apelou ao Supremo Tribunal de Justiça, última instância judicial de Portugal e, mais uma vez, fracassou.

Os juízes do STJ afirmaram que tanto o conteúdo das conversas telefônicas como os dados de tráfego (para quem ligou, quando ligou, quanto tempo durou a conversa, etc.) estão protegidos pela Constituição portuguesa. Esse sigilo só pode ser afastado em situações específicas, mas nunca em processo civil, afirmaram. Por conta disso, a recusa da mulher é legítima e ela não pode ser usada para inverter o ônus da prova e nem ser considerada como admissão de culpa na decisão judicial.

Clique aqui para ler a decisão.

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