Briga por Justiça

Juízes federais brigam para atuar na Justiça Eleitoral

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8 de março de 2011, 7h14

Juízes federais e estaduais estão brigando por trabalho — por mais trabalho. Como não poderia deixar de ser, a disputa acontece na Justiça. No último 22 de fevereiro, cinco associações de juízes federais pediram que o Tribunal Superior Eleitoral alterasse a interpretação da Resolução 21.009/2002 para que eles também pudessem integrar a primeira instância da Justiça Eleitoral, que tem sido exclusiva dos juízes estaduais.

Segundo o juiz federal Roberto Carvalho Veloso, presidente da Associação dos Juízes Federais da 1ª Região e membro da Comissão do Senado do Anteprojeto do Novo Código Eleitoral, os juízes federais não pretendem tirar os juízes estaduais da Justiça Eleitoral, mas também querem participar dela.

Segundo ele, essa participação só acontecerá nos municípios em que existem seções judiciárias. Onde não houver, o juiz estadual será mantido, o que corresponde a aproximadamente 60% dos municípios. O principal fundamento do pedido é que tanto a Justiça Federal quanto a Eleitoral são da União, que paga os subsídios dos juízes eleitorais com base nos subsídios dos juízes federais substitutos. "Tudo gira em torno dos juízes federais", observou.

Veloso explicou que quando o Código Eleitoral (Lei 4.747) foi promulgado em 1965, ainda não existia a Justiça Federal, criada no ano seguinte pela Lei 5.010/1966, e que por isso não trata dela. Questionado sobre o momento do pedido, feito 45 anos depois da existência da Justiça Federal, o juiz afirmou que o assunto já é discutido na categoria há muito tempo.

O outro lado, do qual faz parte o presidente da Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages), Antonio Sbano, não pretende abdicar da competência. Segundo ele, a pretensão dos juízes federais só é viável por meio de Emenda Constitucional. O artigo 109 da Constituição estabelece a competência dos juízes federais e exclui dela a Justiça Eleitoral. Expressões como "juízes de Direito", presentes no capítulo sobre a Justiça Eleitoral e Estadual, também teriam de ser mudadas caso a intenção seja incluir os juízes federais, na opinião de Sbano. Para a associação, apesar de a Justiça Eleitoral ser Federal, o exercício é dos juízes estaduais.

Sbano defende que a mudança de competência é cara e nada prática. Ele estranha "eles levarem mais um serviço, mas não quererem assumir as execuções fiscais da União nas comarcas onde não há Justiça Federal, tarefa que se pode fazer distante do contribuinte, e é competência federal". Hoje, em comarcas onde não há Justiça Federal são as varas estaduais que cuidam das execuções do fisco federal.

Para o presidente da Anamages, essa transferência custaria menos e seria útil, desafogando comarcas em que 50% dos processos em andamentos são executivos fiscais. "Isso os juízes estaduais concordam em mandar para os federais. Nós temos que usar o dinheiro para melhorar a prestação jurisdicional, e não para criar elefantes brancos", diz.

"Nós temos o sistema mais perfeito de votação do mundo. O sistema vai bem e é uma construção dos juízes estaduais, que o têm aperfeiçoado e conquistado confiabilidade. Então, por que mudar?", questiona.

Segundo José Rollemberg Leite Neto, sócio do escritório Eduardo Ferrão Advogados Associados e também membro da Comissão do Senado do anteprojeto do novo Código Eleitoral, dentre diversas propostas da sociedade civil e de setores jurídicos organizados, a comissão tem analisado o caso a pedido dos juízes federais, "que têm essa queixa há muitos anos e reinvidicaram que o projeto a contemplasse".

Rollemberg entende que a Constituição Federal de 1988 poderia ter resolvido essa questão, já que até colocou um juiz federal como membro de cada Tribunal Regional Eleitoral, mas não atribuiu outras competências a juízes federais no âmbito da Justiça Eleitoral.

Quanto à avaliação da comissão, o advogado explicou que foram realizadas oito audiências públicas sobre o tema com manifestação de todas as partes, mas que após o recesso de final de ano ainda não deliberou sobre o assunto, e vai aguardar a proposta de reforma política a ser formulada em 45 dias por outra comissão do Senado. Isso porque, se a matéria for entendida como constitucional, a comissão do Código Eleitoral não poderá tratar dela, e seria o caso de a discussão ser proposta na Comissão de Reforma Política.

Como membro da comissão de reforma do Código Eleitoral, Rollemberg diz ainda não ter uma opinião formada sobre a polêmica, mas entende que o debate é sério, porque "balança a estrutura da Justiça Eleitoral, cuja base funciona bem". Para ele, a discussão é baseada nas questões sobre receita, estrutura administrativa e física Quanto a essa última, explicou que quando foi criada, a Justiça Eleitoral se instalou em prédios da Justiça Estadual, mas com o passar dos anos, montou seus próprios cartórios e zonas em quase todo o país.

O membro da comissão também observou que se for decidido que os juízes eleitorais devem ser federais, os procuradores da República ficarão no lugar dos promotores eleitores, e que por isso a Associação Nacional dos Procuradores da República apoia os juízes federais.

O advogado e membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB- RJ, Jonas Lopes de Carvalho Neto, é contra a mudança de competência, por considerar que a Justiça Federal ainda não tem estrutura suficiente para assumir o ônus que pretende.

Para Carvalho Neto, a Constituição estabeleceu que são Justiças da União a Trabalhista, Militar e Eleitoral, e que, quanto a esta, o objetivo do constituinte foi mesclar. Um exemplo dessa intenção é a composição dos Tribunais Regionais Eleitorais: desembargadores estaduais, desembargadores federais, juízes estaduais e advogados.

O advogado baseia sua opinião na falta de estrutura da Justiça Federal. Segundo ele, "todo juiz queria cumular a competência eleitoral, até pela questão financeira", e por conta disso foi estabelecido o critério de antiguidade entre os juízes estaduais, o que tem funcionado.

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