Advocacia de resultados

"A advocacia deve estar voltada para a gestão"

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15 de maio de 2011, 9h32

 

Spacca
Lucia_Tucci - Spacca

"Sempre tenho em mente quem sou, para onde vou, o que vou fazer, como fazer, qual o objetivo e se tenho ou não chance de atingir o resultado esperado, em termos estatísticos, inclusive." Sob essa premissa, a advogada Lúcia Tucci comanda seu escritório de advocacia, em São Paulo. Apaixonada por administração, trouxe os seus conhecimentos de gestão para o cotidiano da advocacia. Para ela, "não sobreviverão aqueles que não tenham a advocacia voltada para a gestão dos procedimentos e processos".    

Com o crescimento do escritório, sentiu a necessidade de contratar um administrador profissional para ajudá-la na organização das contas, custos, infraestrutura, recursos humanos. Não pensou duas vezes, convidou o irmão para ficar no cargo: Claudio Tucci foi o grande responsável pela informatização dos processos e procedimentos da banca.

Os 12 advogados do escritório, especializado em Direito Empresarial e em licitações, especialmente na área de alta tecnologia por conta da experiência de Lúcia com empresas de automação bancária, eleitoral e judicial, ficam livres para trabalhar sem preocupações com questões paralelas à advocacia.

Lúcia conta que seu grande sonho sempre foi ser administradora, mas a família a encaminhou para o Direito, que sempre foi o sonho de sua mãe. Aprovada nos dois vestibulares, aos 17 anos, não teve escolha: encontrou a mãe já fazendo a sua matrícula no Direito e a mensalidade do curso de administração da FGV não cabia no orçamento da família. Por algum tempo, deixou de frequentar as aulas na Faculdade de Osasco, em São Paulo, para estudar e tentar aprovação no vestibular da USP para Administração.  Os seus planos mudaram quando estagiou no departamento jurídico da Manah, fabricante brasileira de adubo.

Lá, participava de reuniões estratégicas com o dono da empresa e percebeu que poderia aliar tudo o que estudou de administração com o que aprendia sobre Direito. Na empresa, chegou a ser a responsável pela área tributária desde importação, exportação, passando por todas as questões aduaneiras.

Há 19 anos tem o seu próprio escritório de advocacia, o Lúcia Tucci Advogados, que tem foco em gestão jurídica estratégica. Desenvolve uma estratégia e um método de atuação em cada caso de cada um dos clientes, com base na jurisprudência ou aproveitando os espaços abertos para novas teses e teorias, mas tudo isso com dados estatísticos e com foco no resultado. Se a porcentagem de sucesso é pequena, não vai em frente. Para isso, conta com médicos, peritos, terapeutas para ajudá-los a entender as peculiaridades dos processos e também dos clientes.

Em entrevista à ConJur, Lúcia fala sobre a experiência de trabalhar com uma advocacia de resultados e de ter um administrador no escritório. Também participaram da entrevista os jornalistas Maurício Cardoso e Lilian Matsuura.

Leia a entrevista:

ConJur — Como funciona um escritório de advocacia com foco na gestão?
Lúcia Tucci — Uma das funções da gestão é acompanhar de perto o andamento dos processos, os prazos, as decisões. Mas antes dessa fase do processo, estar de olho na jurisprudência e nas teorias que são aplicadas ou rejeitadas pelo Judiciário ajuda a definir a estratégia da ação. Ou, então, a dizer para o cliente que aquele caso não tem chances de ser aceito na Justiça e desistir já no começo. Não posso fazer a pessoa me contratar como advogada se ela não vai ter resultado. O que importa menos é o que eu penso. O fundamental é saber: há jurisprudência, não há? Essa tese é nova ou é preciso avançar? É preciso definir uma estratégia, um método de atuação em cada caso de cada um dos clientes. Até na área penal é possível ter indicações de como se deve atuar para obter sucesso. A única área em que o conceito de gestão é difícil de ser aplicado é a de família.

ConJur — Quais outras ferramentas são importantes para a gestão dos escritórios de advocacia?
Lúcia Tucci —
É importante ter parceria com médicos, peritos, psiquiatras e até terapeutas, para nos ajudar a entender casos mais complexos e também para lidar com o cliente. Também é fundamental ter consultorias externas, desde a parte de recursos humanos até a infraestrutura da banca. O escritório de advocacia não pode existir sem uma consultoria de alto nível para o sistema operacional, principalmente para o sistema de segurança de informações. É por isso que trouxe o meu irmão Claudio Tucci para trabalhar no escritório.

ConJur — E qual é a parte do negócio que fica nas mãos dele?
Lúcia Tucci —
O primeiro desafio dele foi entender como funciona a administração voltada para o mundo jurídico. Ele foi para os Estados Unidos acompanhar um congresso de administração legal e fez um curso também de administração legal na FGV. Nos EUA, por exemplo, conheceu diversas empresas que cuidam do armazenamento de documentos. Eu entendo muito de alta tecnologia e fui com ele visitar todos os fornecedores desses sistemas. Cuidei da parte do contato e ele solucionou as outras questões de forma simples e rápida, além de ter contratado ótimos fornecedores com custo acessíveis. Ele mudou o escritório.

ConJur — Como escolher o sistema de controle de processos do escritório?
Lúcia Tucci —
A primeira pergunta que se deve fazer é a porcentagem de erros do sistema. A empresa que garantir, em contrato, a menor porcentagem e o melhor preço é a fornecedora ideal. O processo de informatização do escritório não foi rápido, mas temos um nível de falha muito pequeno. Esse é o calcanhar de Aquiles na administração de escritórios. Por isso, ter um administrador é um grande diferencial. A informatização serve para deixar o advogado mais livre para fazer o que sabe, sem perder tempo arquivando processos, indo atrás de pastas. Ele procura no sistema e vê o que já existe sobre o assunto, economiza tempo. Uma boa forma de dar mais agilidade ao trabalho é usar duas telas de computador. Em uma delas o advogado lê a jurisprudência e faz a pesquisa necessária. Na outra, escreve.

ConJur — Em quanto tempo o escritório consegue recuperar o dinheiro gasto em tecnologia?
Lúcia Tucci — Na verdade, a pergunta deve ser: quanto dinheiro você perde pelo fato de não ter um sistema de controle de processos? O tempo que se leva para recuperar o investimento feito é relativo, depende do tamanho do escritório e de como ele é administrado. No nosso caso, recuperamos em 30 dias, porque fizemos uma boa pesquisa para escolher o fornecedor. O escritório deixa de existir se não tiver um administrador de sistemas.

ConJur — Os escritórios brasileiros estão muito atrasados em termos de administração legal se comparados com as bancas dos Estados Unidos?
Lúcia Tucci —
Não falta muito para chegarmos ao mesmo nível, mas ainda é preciso investimento em administração legal, para cuidar da parte financeira, da infraestrutura e de tudo o mais que não faz parte da advocacia em si. Em São Paulo, já existem muitos escritórios preparados nesse sentido. É preciso ter coragem para fazer essa mudança.

ConJur — Alguns escritórios têm procurado ferramentas de gestão, como o certificado ISO.
Lúcia Tucci —
Para quem nunca teve contato com conceitos de administração o ISO é uma ferramenta estruturada e organizada que vai fazer com que os advogados reflitam sobre formas de administração. Muitos daqueles que acreditam que já trabalham dessa forma vão descobrir que ainda falta muita coisa.

ConJur — Qual o futuro do escritório que não trabalha com foco na gestão?
Lúcia Tucci — Não sobreviverão aqueles que não se preocupam com a gestão. Sempre tenho em mente quem sou, para onde vou, o que vou fazer, como fazer, qual o objetivo e se tenho ou não chances de atingir o meu objetivo, em termos estatísticos, inclusive. É claro que não prometemos resultado aos clientes, porque isso não existe. Mas a gestão é o elemento da mudança nesse século para o Direito. A forma de administrar escritórios de advocacia no Brasil começou a mudar nos últimos 10 anos. Ainda hoje é difícil tocar neste assunto, existe resistência por parte dos advogados.

ConJur — Além da administração de escritórios, em que área do Direito você se especializou?
Lúcia Tucci —
Licitações e nas relações com o governo em geral, principalmente na área de tecnologia. Nós procuramos estruturar, organizar as empresas que nunca participaram de licitações para que criem departamentos específicos para isso. Também trabalhamos muito com planejamento sucessório de empresas familiares e Direito Imobiliário.

ConJur — Um dos grandes casos em que atuou foi o da licitação da urna eletrônica. Como foi essa experiência?
Lúcia Tucci — A história da urna eletrônica é um orgulho pessoal e nacional. A mídia criticou muito, mas eu digo que quem faz a diferença não é a tecnologia que inovou, mas sim o homem que usa a tecnologia. Não se pode dizer que o pioneirismo do que aconteceu não seja um orgulho nacional. Qual o outro país no mundo que tem isso? Nem os Estados Unidos têm. Eu vivenciei, vi, vivi a realidade de que um processo de seleção da administração pública pode ser extremamente transparente, real, sério e com respeito a todos os preceitos da Constituição Federal.

ConJur — E como foi a atuação no caso?
Lúcia Tucci —
Atuei como advogada de uma das empresas que concorria para fornecer a urna eletrônica e estive lá desde a primeira audiência pública. Naquela época, 1993, 1994, as audiências públicas praticamente não existiam. Era o início da abertura do mercado brasileiro e a Lei de Licitações [Lei 8.666] tinha acabado de ser publicada. O Tribunal Superior Eleitoral criou uma equipe técnica com os melhores da tecnologia do ITA para que visitassem todos os fornecedores de tecnologia existentes no Brasil e fora do país. O tribunal não impôs um modelo de urna eletrônica, cada empresa podia desenvolver o seu próprio protótipo. Os cinco primeiros apresentados eram totalmente diferentes entre si. E o processo de seleção foi ao vivo. A corte foi transformada em um laboratório técnico e os especialistas das empresas tinham de montar a urna ali mesmo. Os recursos apresentados pelos advogados eram verbais e depois eram colocados no papel. A licitação funcionava como se fosse uma audiência, com o presidente da mesa, todos os representantes legais e todas as empresas. E eu era a única mulher.

ConJur — Quais empresas participaram?
Lúcia Tucci —
A IBM, Unisys, Procomp, Itautec. A HP participou só da segunda licitação. Foram diversas as licitações. A primeira urna escolhida funcionou só em alguns estados e deu muitos problemas. As pessoas chegaram a esperar uma, duas horas para votar. Mas essas mudanças levam tempo. Hoje, a urna eletrônica é um orgulho para o país.

ConJur — Qual sua opinião sobre a impressão do voto em tempos de urna eletrônica?
Lúcia Tucci —
As pessoas acham que a impressão permite a recontagem dos votos e isso é uma ilusão. É obvio que na transmissão de dados existe a possibilidade de manipulação, mas são muitos os mecanismos de segurança para auferir a verdade da votação.

ConJur — Você também atuou na licitação do Cartão Nacional da Saúde. Como foi esse processo?
Lúcia Tucci —
Meu cliente era o único que fornecia o sistema que funcionou 100% em Aracaju. Mas houve uma polêmica nacional porque a ideia era criar um Cadastro Nacional de Saúde, em que médicos de todo o país teriam acesso ao histórico e diagnóstico de todos os pacientes. Mas o sigilo é uma garantia individual. E os próprios médicos foram contra o sistema.

ConJur — Por que eles poderiam ser responsabilizados por eventuais erros?
Lúcia Tucci —
Não. É que em tudo tem o lado ruim. Em qualquer profissão existem os bons e os maus profissionais. No entanto, acredito que o serviço do Cartão Nacional da Saúde é um projeto que tinha de reviver. Participei do primeiro projeto piloto, que era extremamente inovador. E foi a partir desse sistema, inclusive público, que foi incentivado pelo Ministério da Saúde, que foram criados os sistemas que hoje estão circulando nas operadoras de planos de saúde.

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