Direito de expressão

Globo pode exibir crime da rua Cuba, decide TJ-SP

Autor

2 de maio de 2011, 15h01

O Tribunal de Justiça de São Paulo negou liminar ao advogado Marcelo Delmanto Bouchabki, que pretendia proibir a exibição do episódio sobre o “Crime da rua Cuba”. O programa está sendo preparado pela equipe do Profissão Repórter, da Rede Globo de Televisão.

A liminar foi assinada, nesta segunda-feira (2/5), pelo desembargador Beretta da Silveira, da 3ª Câmara de Direito Privado. O mérito do recurso do advogado ainda será apreciado pela turma julgadora. O relator afirmou que o direito de pensar, falar e escrever livremente, sem censura, sem restrições ou sem interferência governamental é o mais precioso privilégio dos cidadãos.

O crime da rua Cuba já tem mais de 22 anos. Ocorreu na véspera do do Natal de 1988, na casa de número 109 da rua Cuba, no bairro Jardim América. O advogado Jorge Toufic Bouchabki e sua mulher, Maria Cecília, foram assassinados enquanto dormiam. O filho do casal Jorge Delmanto Bouchabki foi apontado como suspeito. Sua responsabilidade criminal foi extinta. Na época do crime, “Jorginho” tinha 19 anos.

De acordo com o Código Penal, quem é acusado de um crime com menos de 21 anos de idade tem reduzido de metade o prazo de prescrição. A empregada doméstica Olinda Oliveira da Silva, em depoimento colhido por promotores de Justiça e pelo delegado Luiz Carlos Ferreira Sato, em 1998, contou que, na véspera do assassinato, Jorginho discutiu com a mãe.

Ela não aceitava o namoro do filho com a estudante Flávia Soares.
De acordo com a empregada, o bate-boca terminou quando Maria Cecília quebrou um taco de sinuca nas costas de Jorginho. Aos gritos, ele teria dito que a mãe se arrependeria por ter-lhe batido. Essa versão contradiz o depoimento de Olinda dado na ocasião dos fatos, quando afirmou que o relacionamento familiar era harmonioso.

O delegado perguntou por que Olinda omitiu estes detalhes quando ouvida pelo delegado José Augusto Veloso Sampaio e pelo então promotor de Justiça Luiz Antônio Guimarães Marrey, responsáveis pela investigação. Ela informou que a família “pediu para não dizer nada”. Olinda jamais explicou por que mudou de opinião.

O inquérito sobre o crime da Rua Cuba entrou para a crônica policial paulistana por causa da suspeição que recaiu sobre o filho das vítimas. Foi arquivado em 1991, quando o juiz Linneu de Carvalho Sobrinho alegou falta de provas contra Jorginho. O rapaz chegou a se mudar para Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, em busca do anonimato. Cursou Direito numa universidade da cidade.

Foi expulso duas semanas antes da formatura, acusado de pagar a faculdade com cheques furtados de Enia Luciane da Silva, funcionária da instituição de ensino. Jorginho voltou à capital e conseguiu colar grau em outra universidade.
A Polícia e o Ministério Público não produziram provas materiais consistentes: a arma do crime nunca foi encontrada.

Leia a íntegra da liminar:

Promova o agravante a complementação do valor do preparo, em quarenta e oito horas, ante o comando do art. 511, § 2º, do Código de Processo Civil. 2 – Trata-se de agravo de instrumento tirado contra decisão que, em sede de medida cautelar inominada recebida como ação cominatória, indeferiu pedido de tutela antecipada permitindo a veiculação pela agravada do caso conhecido como "Crime da Rua Cuba", bem como o nome e sobrenome do autor e de seus genitores, relativos à vida íntima e privada dos mesmos, em qualquer de seus programas televisivos.
Alega o agravante, em síntese, que, passados mais de vinte e dois (22) anos, a agravada produzirá e veiculará pseuda matéria jornalística, sem autorização, violando a garantia constitucional prevista no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal. Indefiro pedido de efeito suspensivo, por não vislumbrar possibilidade de lesão grave e de difícil reparação. A decisão de primeiro grau deu perfeito enquadramento à questão debatida e a proibição prévia de exibição de matéria televisiva sem que se saiba seu conteúdo configuraria violação grave ao comando do artigo 220 da Constituição Federal.
O direito de pensar, falar e escrever livremente, sem censura, sem restrições ou sem interferência governamental é, conforme adverte HUGO LAFAYETTE BLACK, que integrou a Suprema Corte dos Estados Unidos da América, "o mais precioso privilégio dos cidadãos…" ("Crença na Constituição", p. 63, 1970, Forense), bem assim tem sido o entendimento de nosso Supremo Tribunal Federal que baniu do mundo jurídico a chamada Lei de Imprensa (ADPF nº 130/DF – Rel. Min. CARLOS BRITTO – j. 27.02.2008 – DJe 06.11.2009) Tenho realçado o poder/dever de informar da imprensa e, se houver abuso de direito, a questão se transmuda para o direito indenizatório, mas não se pode pretender fazer controle do que se publica, se fala, se escreve ou se transmite, já que, de há muito, a Constituição Federal proíbe a censura, ainda mais se feita previamente, antes sequer do conhecimento do conteúdo da matéria. Nesse sentido: Apel. 441.939.4/6-00, de São Paulo, rel. Des. Beretta da Silveira, Apel. 440.000.4/-00, de Marília, rel. Des. Beretta da Silveira, Apel. 448.467.4/2-00, de São Paulo, rel. Des. Beretta da Silveira, Apel. 453.995.4/3-00, de São Paulo, rel. Des. Beretta da Silveira. Requisitem-se informações do n. Magistrado. À agravada. Int. São Paulo, 02 de maio de 2011. BERETTA DA SILVEIRA Relator.

 

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!