Liberdade de informação é da verdade subjetiva
10 de junho de 2011, 19h33
“Em hipótese alguma, a racionalidade dos processos criminais é igual à racionalidade das publicações literárias e, no caso, jornalísticas”. Entendendo assim, a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul decidiu que o jornalista Luiz Cláudio Cunha, e a editora L&PM, não têm que indenizar o inspetor aposentado do Dops gaúcho João Augusto da Rosa, o Irno, apontado como sequestrador no livro Operação Condor: O Sequestro dos Uruguaios, mesmo que ele tenha sido absolvido do crime de sequestro por falta de provas. A decisão foi unânime.
Na decisão foi aplicado o princípio da proporcionalidade para solucionar a colisão dos direitos fundamentais da liberdade de informação e os direitos de personalidade de privacidade, da honra e da imagem. Os julgadores também destacaram o interesse da sociedade e da história ao conhecimento “de fatos ocorridos em recente período político, conhecido pelo lado negro da intolerância, da prepotência e da ausência de liberdade, pelo que há se tolerar suscetibilidades individuais, em favor dos interesses do coletivo”.
O livro trata do sequestro do casal de uruguaios Universindo Díaz e Lilian Celiberti por policiais do Dops gaúcho, em novembro de 1978, em Porto Alegre. Na época a operação foi revelada por Cunha e pelo fotógrafo J. B. Scalco, que trabalhavam na revista Veja e tiveram acesso ao local onde o casal era mantido preso pelos policiais. Levado clandestinamente para o Uruguai, o casal foi entregue às forças de repressão da ditadura local.
Segundo a desembargadora relatora Marilene Bonzanini apesar da obra não mencionar que o servidor público foi absolvido pela segunda instância, isso não muda a decisão já que o livro fez “uma coletânea de reportagens investigativas e narrativas de todo um acontecimento e não centrada unicamente no autor”.
A desembargadora considerou que a intenção do jornalista era “expor ao público profunda pesquisa acerca de fatos ocorridos em época em que tais informações não poderiam ser publicamente difundidas sem retaliações. Assim, nos tempos atuais, tem-se que a liberdade de manifestação, quando exercida regularmente, não denigre o direito à imagem, mormente por que os fatos não foram negados”.
Nesse sentido, deixou claro que não é possível limitar a criatividade e a liberdade de escritores que, “como o autor, dissertam sobre tema delicado e ainda marcado na historiografia brasileira, sob pena de estarmos igualmente constrangendo o espírito investigativo dos repórteres e de encobrirmos informações necessárias para a fundamentação de nossa consciência crítica”.
O desembargador revisor Leonel Pires Ohlweiler resolveu o conflito entre direitos fundamentais a partir da análise dos limites internos e externos ao direito à informação. Quanto ao limite interno, o desembargador destacou que “a verdade do exercício da liberdade de informação refere-se à verdade subjetiva e não à verdade objetiva, ou seja, exige-se um dever de diligência, no sentido de publicar uma versão compatível com as notícias sobre o fato”.
Ele lembrou que as informações do livro não foram criadas pelo jornalista, “mas resultado de pesquisa fundamentada em reportagens jornalísticas da época. É crível dizer que a verdade exigida para o exercício da liberdade de informação é uma espécie de verdade existencial, isto é, a compreensão temporal sobre determinado fato preponderante historicamente”.
Com relação aos limites externos, entendeu que “a notícia publica relacionava-se com assunto público, envolvendo servidor público, o que justifica, mais uma vez, a publicação do livro, nos termos como foi realizada. O texto publicado não estava preocupado com a vida privada do autor, mas sua atuação funcional e que é de caráter público”.
Apelação Cível 70040534505
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