Bondade eleitoreira

Juiz diz ser nefasto uso eleitoral de centro social

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23 de julho de 2011, 8h58

"Não se pretende evitar que o ser humano ponha em prática o melhor de seus sentimentos: a solidariedade; o amor ao próximo; o altruísmo. Contudo, mostra-se nefasta a conduta que mascarada sob tais sentimentos roubam do eleitorado a possibilidade de exercerem o voto livremente." A conclusão é do corregedor do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, juiz Antonio Augusto Gaspar, ao votar pela condenação do deputado estadual Domingos Brazão. Por unanimidade, o TRE-RJ tornou o deputado inelegível por oito anos, além de ter cassado seu diploma.

O relator do caso no TRE afirmou ser necessário distinguir ato de benemerência, ato de assistencialismo e ato de investimento social, sendo os dois primeiros frutos de uma necessidade imediata e o segundo uma maneira de promover mudança na sociedade fazendo com que as pessoas não virem reféns da ajuda que recebe.

"O que se tem visto é que, tanto os operadores do Direito mas, principalmente, os leigos, quando da intervenção da Justiça Eleitoral junto às referidas entidades questionam: ‘Vamos punir a benemerência? O Poder Público não faz, o particular faz e é sancionado?’", afirmou o juiz.

No caso dos centros sociais, diz Antonio Augusto Gaspar, algumas questões teimam em não escapar: "Por qual motivo vincular essa benemerência ou assistencialismo a pessoas vinculadas ao poder público, mais precisamente para as que ostentem cargos decorrentes de mandatos eletivos? Será que o candidato eleito, no exercício de seu mister, lutará para que o poder público possa praticar as atividades realizadas pelo centro social, findando, assim, com a necessidade de sua existência e, portanto, abdicando do ‘lucro’ eleitoral dele decorrente?"

Ao analisar a ação de investigação proposta pelo Ministério Público Eleitoral contra o deputado estadual Domingos Brazão, o TRE entendeu estarem presentes três requisitos: a vinculação do centro social ao nome do deputado; ser ele ou terceiros em seu benefício os responsáveis por sustentar o centro; ser necessário gastos de monta expressiva para financiar as atividades assistencialistas prestadas pelo centro social.

O juiz considerou a alteração decorrente da Lei Complementar 135/10, a Lei da Ficha Limpa, que deixou de exigir prova da potencialidade de a conduta interferir na regularidade e legitimidade das eleições. Ou seja, conforme o artigo 22, inciso XVI, da lei, "para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam".

"A gravidade se apresenta ao deixar a população refém de uma prática assistencialista. Um arremedo de bondade com o fim de iludir e ludibriar a liberdade do voto", afirmou o juiz.

Na ocasião do julgamento da ação pelo TRE-RJ, no dia 14 de julho, o desembargador Sérgio Lúcio chegou a se manifestar no sentido de que a vinculação de um candidato a um centro social, a princípio, não ofende a lei eleitoral. "O centro social é antigo e não fecha depois das eleições — é um centro social mantido há 14 anos, desde 1997." No caso, acompanhou o voto do juiz Antonio Augusto Gaspar ao verificar o material de divulgação do candidato apreendido.

Clique aqui para ler a decisão.

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