Frente de atuação

Adams se considera fora da disputa para vaga no STF

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28 de janeiro de 2011, 12h37

O advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, era cotado para assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal. Era. Agora, ele mesmo já se considera fora do páreo. “Não sei se existe essa possibilidade de ir mais tarde para o Supremo. Acho que ela me quer na AGU. Para mim, isso está claro. Traduz um reconhecimento do meu trabalho”, disse ele em entrevista ao jornal O Globo, desta sexta-feira (28/1).

Durante a conversa ele admitiu que o parecer enviado pela AGU ao ex-presidente recomendando a permanência de Cesare Battisti não reúne elementos concretos para provar que o ex-ativista seria perseguido na Itália. Há apenas suposições de que isso possa ocorrer, o que seria suficiente para rejeitar a extradição. Adams foi entrevistado pelos jornalistas Ilimar Franco, Carolina Brígido e Francisco Leali.

Leia a entrevista:

O senhor foi cotado para a vaga de ministro do STF. Ainda se considera no páreo?
Não é cargo para o qual se faça campanha. Mas também não é convite que se recuse. Quando a presidenta me convidou no fim do ano passado para continuar como advogado-geral da União, aquelas especulações do passado se encerraram. A história continuou para cima e para baixo, com especulações. Mas é decisão dela. Minha função é na AGU, e é altamente meritória, sinto-me muito bem nela.

O senhor crê que a presidente Dilma quer nomeá-lo mais tarde para o STF?
Não sei se existe essa possibilidade de ir mais tarde para o Supremo. Acho que ela me quer na AGU. Para mim, isso está claro. Traduz um reconhecimento do meu trabalho. Posso até ter sido vítima do meu sucesso [risos]. A AGU assumiu muito a linha de frente em questões difíceis, como Enem, as greves, [a usina de] Belo Monte.

Qual a sua opinião sobre as brigas acirradas entre os ministros do STF?
O Supremo vive uma evidente superexposição, que decorre não só de uma presença da mídia mais constante, mas pelo fato de ter adquirido uma relevância cada vez maior no cenário da República. Ele delibera matérias que estão afetando diariamente o nosso cotidiano. Algema, nepotismo, Ficha Limpa…

Isso justifica que os ministros percam a calma?
Não. Esses eventos são singulares, não é regra. Existe um debate acirrado, e muitas vezes o tom pode subir aqui e ali. Mas, em geral, esse debate tem muito mais a ver com a defesa de convicções. Quando você está defendendo matérias com alcance tão significativo, como por exemplo a Ficha Limpa, eu não acho estranho que o debate às vezes se acirre.

Para o senhor, a Lei da Ficha Limpa deveria ter sido aplicada em 2010?
A lei gera uma série de incongruências. Tem um elemento muito valioso para a República, que é a legislação aprovada não produzir manipulações no resultado do processo político. A retroação tem esse efeito.

Se o senhor fosse ministro do STF, teria liberado a candidatura do Jader Barbalho?
Se eu fosse [ministro], acho que não deveria ser aplicada a lei. Nesse caso, temos um problema sério de retroação que gera consequências não só do ponto de vista jurídico, mas consequências políticas sobre as composições congressuais. Maiorias eventuais podem ser formadas com base nesta movimentação jurídica, para o bem ou para o mal.

O senhor acha que o Congresso aprovou o projeto insuflado pelo clamor popular e o Supremo acabou embarcando?
O Congresso pretendeu responder a uma necessidade da sociedade de moralizar o processo político. A Ficha Limpa, que teve origem popular, tem uma série de problemas que são tão graves quanto os problemas que ela quer resolver. Não quero responsabilizar o Supremo, mas o processo todo. É um processo coletivo. Isso é da natureza democrática. Acho que o STF tem que ter o cuidado de equilibrar muito bem essas decisões de forma a não gerar essa retroação ou esses prejuízos.

O STF aprovou a extradição do italiano Cesare Battisti. Mas, com base em parecer da AGU, o ex-presidente Lula decidiu manter o italiano no país. Existe espaço para a Corte reavaliar a decisão de Lula?
A minha convicção é de que o processo encerrou. A Corte decidiu autorizar [a extradição], mas a decisão seria do presidente da República, que é o chefe de Estado, é quem conduz as relações internacionais do país. A decisão foi ajustada no sentido de que a decisão do presidente se baseia nos tratados internacionais do Brasil. Os ministros Eros Grau e Carlos Ayres Britto afirmaram que o tratado já dá essa discricionariedade ao presidente na cláusula que diz que poderá ser negada a extradição se houver razões ponderadas para supor que ele [Battisti] pode ser perseguido, discriminado ou ter sua situação agravada por razões de raça, sexo, opinião, religião ou por razão pessoal. Porque ele é feio, porque não gostam dele. Ou seja, qualquer razão. E o pressuposto é uma suposição. O tratado trata com suposição, um juízo hipotético, são possibilidades, são análises subjetivas de quem avalia.

Para o presidente do STF, Cezar Peluso, o tribunal não entendeu que Battisti sofreria risco de perseguição.
O Supremo debateu se existia fundado temor, com demonstração. O parecer não insiste no elemento perseguição, mas de agravamento. Segundo o parecer, havia um ambiente hostil a Battisti, e essa hostilidade leva a uma possibilidade, a uma suposição. O fato de os países [Brasil e Itália] terem adotado essa cláusula específica demonstra que também em situações democráticas esse ambiente de hostilidade e de suposição pode existir.

Isso é usual?
Um Estado que é inquestionavelmente democrático, a Suíça, não extraditou [o cineasta] Roman Polanski, que está sendo acusado de pedofilia e era tido como réu confesso. A Suíça não extraditou com base no interesse nacional, um juízo político. O Julian Assange [dono do site Wikileaks] está tendo a extradição pleiteada para a Suécia por estupro. São juízos que os Estados fazem dentro do Direito Constitucional. O STF não tem como fazer juízo político.

O parecer da AGU menciona reportagens, mas não traz prova concreta de que Battisti corre riscos se for devolvido à Itália?
Suposição é um juízo hipotético. Se você for ao dicionário, a suposição admite até imaginação pura. Mas não é o caso. A suposição se faz por elementos, que podem ser frágeis, não importa, qualquer elemento para formar sua convicção. O fato é que a suposição é a convicção daquele que decide.

O senhor acha frágeis os elementos da AGU no parecer?
Acho que são elementos que permitem formar uma suposição. Se o tratado exigisse a demonstração cabal de perseguição, de fato eu não teria como demonstrar, porque não tenho elementos para demonstrar a perseguição. Mas não se trata de demonstrar a perseguição. Trata-se de demonstrar se existem eventos factuais que possam fornecer algum tipo de ilação, algum tipo de suposição sobre o assunto. O presidente tem a autoridade de tomar a decisão final e está fazendo uma suposição no âmbito do tratado.

A AGU produziu parecer contrário à resolução da Anvisa que restringe o comercial de alimentos. A Anvisa se recusou a cumprir e disse que não é obrigada. Isso procede?
A Anvisa não se vincula ao parecer, exceto se ele é aprovado pelo presidente da República. Nesse caso, o parecer não é. Fizemos primeiro uma recomendação e devemos soltar agora um parecer definitivo sobre a matéria.

Se alguém entrar na Justiça contra a Anvisa, a AGU não vai defender a agência?
Não. A AGU não tem como deixar de reconhecer a validade de sua própria posição. A administração não tem como ser defendida nesse caso, porque ela está numa situação de ilegalidade. A Anvisa tem que respeitar essas recomendações. Ela vai ter que se submeter. Tem aspectos absolutamente meritórios na pretensão da Anvisa. Não é esse o problema. Tem de haver um projeto de lei para regulamentar a questão dos alimentos.

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