À espera do Plenário

Governo da Itália pede que Peluso não liberte Battisti

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4 de janeiro de 2011, 16h55

O governo da Itália pediu ao Supremo Tribunal Federal que o ex-militante de esquerda Cesare Battisti, condenado a pena de morte na Itália, mas que conseguiu asilo político no Brasil, não seja solto.

O advogado Nabor Bulhões, que representa a Itália no caso, protocolou, nesta terça-feira (4/1), uma manifestação na corte contra o pedido feito pela defesa de Battisti. Na segunda-feira (3/1), o advogado Luís Roberto Barroso pediu a expedição de alvará de soltura, com base na decisão do então presidente Lula de não extraditar o italiano. A decisão, tomada no dia 31 de dezembro, foi em sentido contrário ao que resolveu o STF em agosto, autorizando a extradição.

Para Bulhões, a decisão de negar a extradição pedida pelo governo italiano é "grave ilícito interno e internacional, que afronta a soberania italiana, insulta suas instituições, principalmente as judiciárias, além de usurpar competência da Suprema Corte brasileira".

Ele lembra, na impugnação ao pedido de soltura, que o Supremo reconheceu a discricionariedade do presidente da República em extraditar ou não Battisti, mas que a decisão deveria obedecer os limites do Tratado de Extradição assinado pelos dois países. De acordo com a tese, só o Plenário da corte pode avaliar o pedido de soltura do italiano, ao "proceder, de ofício ou mediante provocação, ao exame da compatibilidade entre o ato presidencial de negativa da extradição e o acórdão de concessão da extradição".

Dessa forma, segundo o advogado, o alvará não poderia ser expedido pelo presidente da corte, ministro Cezar Peluso, como pediu a defesa do ex-militante, mas sim pelo Plenário. "O Chefe do Executivo não dispunha de poder discricionário em tema de entrega ou não do extraditando", diz Bulhões. Segundo ele, a questão deve chegar ao colegiado como "incidente de execução na extradição".

Bulhões também rebateu o argumento da defesa do italiano, de que, ao reconhecer que a decisão final sobre a extradição era do presidente da República, o Supremo também deu a ele a decisão de decretar a soltura. "Não se afigura minimamente razoável pleitear-se autorização para que o Poder Executivo possa revogar uma prisão decretada pelo Supremo Tribunal Federal. Como é de obviedade plena, só quem pode decretar e simetricamente revogar prisão, segundo a ordem jurídica constitucional brasileira, é o Poder Judiciário."

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Cezar Peluso, determinou nesta terça-feira (4/1) que o pedido de Extradição (EXT 1.085) do italiano seja desarquivado e que a petição que solicita sua imediata soltura seja anexada aos autos. Com a publicação do acórdão do STF que autorizou a extradição do italiano, no início de 2010, o processo foi enviado para a Seção de Baixa e Expedição .

"Determino, pois, à Secretaria [do STF] que desarquive os autos da mencionada extradição, providencie a juntada desta petição avulsa e, então, faça aqueles [autos] conclusos a esta Presidência”, diz o presidente na decisão.

Longe da pena
Na Itália, Battisti foi líder da organização de extrema esquerda Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), que atuou na Itália nos anos 1960 e 1970. Em 1993, foi condenado a prisão perpétua sob acusação de participar dos homicídios do agente penitenciário Antonio Mares Santoro, em Udine, no dia 6 de junho de 1977; de Pierluigi Trregiane, em Milão, no dia 16 de fevereiro de 1979; do açougueiro Lino Sabbadin, em Mestre, no dia 16 de fevereiro de 1979; e do agente de Polícia Andrea Campagna, em Milão, no dia 19 de abril de 1979.

Foi o segundo julgamento contra ele pelo mesmo crime. No primeiro, havia sido absolvido definitivamente. Mas novas denúncias feitas por outro ex-ativista e desafeto de Battisti, num programa de delação premiada, deram motivos para a reabertura do processo. Battisti nega as acusações.

Enquanto o processo de Extradição corria no Supremo, o ministro da Justiça, Tarso Genro, reformou decisão do Comitê Nacional de Refugiados e concedeu o refúgio político ao militante. A alegação foi a de que Battisti não teve direito a ampla defesa no seu país e que um eventual retorno colocaria em risco a integridade física do italiano.

Detido em 1979, em Milão, Battisti conseguiu escapar da prisão e fugir para a França. Refugiou-se no México em 1982, mas em 1990 voltou à França. De lá, veio para o Brasil. Em março de 2007, foi preso no Rio de Janeiro e transferido para o Presídio de Papuda, no Distrito Federal. Na França, Battisti trabalhou como porteiro e escreveu romances policiais. Na década de 90, chegou a escrever 10 livros. No Brasil, lançou apenas uma obra, pela editora Martins Fontes: Minha fuga sem fim: dos anos de chumbo na Itália, de leis ao revés na França, ao inferno do cárcere no Brasil.

Depois de autorizar a Extradição por cinco votos a quatro, o STF reconheceu que cabia ao presidente da República decidir sobre o envio do italiano. Com base em parecer da Advocacia-Geral da União, Lula resolveu, no último dia do seu mandato, não mandar Battisti, com o argumento de que sua condição pessoal se agravaria se voltasse ao seu país para cumprir a pena de 30 anos de prisão, resultado da comutação da pena de prisão perpétua recebida na Itália.

O ministro da Defesa da Itália, Ignazio La Russa, chegou a dizer que a decisão de Lula criaria um impasse diplomático entre os países, e que isso poderia comprometer um acordo militar para a construção de navios, em votação no Parlamento italiano. Mas o primeiro-ministro Silvio Berlusconi desmentiu seu subordinado, afirmando, nesta terça, que a relação não será abalada. "O Brasil é um país ao qual somos ligados por uma antiga e sólida amizade", disse Berlusconi à BBC. "Este caso não tem a ver com as relações bilaterais. É um caso de Justiça, e nós lutaremos por ela. As relações não mudarão por causa desta situação."

Clique aqui para ler a impugnação ajuizada pelo advogado Nabor Bulhões.

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