Reajuste constitucional

"Magistratura não é setor privado", diz Wedy

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27 de fevereiro de 2011, 14h33

“O governo não pode tratar sua relação com o Poder Judiciário, que é independente, como se estivesse negociando com o setor privado. Os magistrados são agentes políticos do Estado e assim devem ser tratados.” A declaração é do presidente da Associação dos Juízes Federais, juiz Gabriel Wedy, ao divulgar nota para esclarecer declaração publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo.

Na reportagem “Juiz não é motorista de ônibus, diz magistrado”, publicada nesse sábado (26/2), Wedy disse que "o governo não pode tratar sua relação com outro Poder, que é independente, como se estivesse negociando com sindicato de motorista de ônibus". O presidente da Ajufe disse, em nota, que apenas citou "o sindicato dos motoristas por ser exemplo de categoria profissional do setor privado". O comentário causou polêmica.

O  coordenador do Departamento de Comunicação do Sindicato dos Motoristas de Ônibus de São Paulo, Nailton Francisco de Souza, disse ao Estadão que a declaração foi desrespeitosa e infeliz. “Quem é esse juiz para achar que, só porque vive em uma casta, é superior aos outros trabalhadores?", questiona. Ele disse, ainda, que os trabalhadores vão se unir para mover ação contra o presidente da Ajufe.

No microblog Twitter, a declaração de Wedy gerou comentários. "Foi infeliz a declaração do presidente da nossa Ajufe, mas o certo é que o Presidente não pode se recusar a receber juízes federais. Atenta contra a democracia", comentou o juiz federal Marco Bruno Miranda, de Natal.

Em artigo publicado no sábado, o jornalista Reinaldo Azevedo, blogueiro da revista Veja, também critica a comparação. “Na democracia, não se distingue o juiz do motorista como seres portadores de direitos — alguns deles inerentes à função. Mas o descaso é inaceitável com qualquer categoria, não é mesmo? Juízes não são fidalgos.”, escreve o jornalista.

Os leitores do blog também reagiram e tentaram entender a comparação. "O que ele quis dizer é que Dilma está entravando um direito legítimo de um poder independente", disse um leitor identificado como Fernando de Felippo. Já outro leitor, identificado apenas como Marcos, diz que "o pleito não é meramente político, tem base jurídica incontestável". "O índice proposto de 14,79% corresponde, salvo engano, à inflação desde o último reajuste, que por sinal foi inferior à inflação. Quanto aos valores atuais dos subsídios, há que se enfatizar: o valor de R$ 26.723,00 corresponde ao subsídio dos 11 ministros do STF. Os desembargadores ganham 90,25% disso. Quanto aos demais juízes, que correspondem à esmagadora maioria numérica da categoria, há variáveis relacionadas ao tipo de Justiça (se Federal ou Estadual, e quanto a esta última, depende das particularidades da legislação de cada Estado). Na Justiça Federal um juiz em início de carreira ganha 90% do que ganha um desembargador", explicou.

Os juízes federais, através das associações, têm se mobilizado pelo reajuste. No início deste mês, Gabriel Wedy afirmou que haverá uma assembleia geral no dia 24 de março para decidir se haverá paralisação ou greve da categoria. 

Na reportagem publicada pelo jornal do Estado de S. Paulo, Gabriel Wedy diz que "o governo não pode ignorar o fato de que os juízes são agentes políticos do Estado com garantias constitucionais que não nossas, mas da sociedade". Para os juízes, "a negociação entre um Poder de Estado e outro se dá em moldes diferentes da relação entre o governo e um sindicato".

O pedido de reajuste foi enviado pelo Supremo Tribunal Federal, em agosto de 2010, ao Legislativo. No entanto, até agora, o Congresso não se manifestou sobre o assunto. De acordo com a Ajufe, a omissão lhes subtrai direito constitucional de irredutibilidade de vencimentos. Por isso, assinaram Mandado de Injunção ao STF.  

Leia abaixo a íntegra da nota de Gabriel Wedy, presidente da Ajufe:

A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), entidade de âmbito nacional, manifesta discordância com título e declaração erroneamente atribuídos a seu presidente pela reportagem veiculada na edição de hoje do jornal "O Estado de S. Paulo" – "JUIZ NÃO É MOTORISTA DE ÔNIBUS, DIZ MAGISTRADO" (A8, 26-02-2011).

Não desenvolvi qualquer argumento que autorizasse essa comparação.
Sustento que o governo não pode tratar sua relação com o Poder Judiciário, que é independente, como se estivesse negociando com o setor privado. Os magistrados são agentes políticos do Estado e assim devem ser tratados. Suas reivindicaçōes devem ser debatidas com respeito e plena atenção ao equilíbrio e à harmonia entre os Poderes, por imposição constitucional.

Citei o sindicato dos motoristas por ser exemplo de categoria profissional do setor privado, atuante e combativa, merecendo todo o respeito dos agentes políticos e da sociedade.

Reitero nossa posição de que há distinção constitucional entre a relação que o Poder Executivo deve manter com categorias profissionais e a que se impõe no diálogo com os demais Poderes.

É com base neste princípio (CF, arts. 2° e 37, XI) que renovo meu compromisso com o diálogo institucional pela atualização do teto constitucional moralizador.
Gabriel Wedy

Presidente da Ajufe – Associação dos Juízes Federais do Brasil

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