Sacerdócio fraterno

A história de dois sacerdócios capixabas

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25 de fevereiro de 2011, 18h03

Dois irmãos. Um foi juiz, outro foi padre. Mas, de certa forma, ambos foram, ao mesmo tempo, sacerdotes e magistrados.

Isto porque o irmão que foi juiz fez da judicatura um sacerdócio. O irmão que foi padre ouviu a confissão dos pecados humanos e, no julgamento dos penitentes, invariavelmente proferiu sentença de absolvição, invocando a infinita Misericórdia de Deus.

Ambos percorreram boa parte do território capixaba no desempenho da missão jurisdicional (nas comarcas) e da missão apostólica (nas paróquias).

O juiz não se tornou desembargador e o padre não foi a bispo. Eram vocacionados para a planície, a doação, o serviço.

O juiz exerceu a judicatura criminal, cível, eleitoral mas, a meu ver, foi no desempenho da função de Juiz da Vara de Família de Vila Velha (ES) que ele chegou às culminâncias da dedicação sem limites, da entrega sem ressalvas, fazendo da sua curul um santuário, ali ao lado do Convento da Penha. Tive a oportunidade de testemunhar seu trabalho. Empenhava-se em conciliar casais, educar para a vida de família, orientar na formação dos filhos. Ele via o fórum como uma escola destinada a contribuir na construção de uma sociedade melhor. Não existia expediente encerrado. As canseiras não justificavam o término das atividades cotidianas. Seu devotamento era o devotamento de um São Francisco de Assis buscando fazer deste mundo um mundo de amor.

O padre desempenhou as mais diversas funções de seu ministério. Foi membro do Conselho Presbiteral, secretário do Bispado, reitor do Pré-Seminário Imaculado Coração de Maria em Marilândia (ES), coordenador de Pastoral, professor de Teologia Espiritual e Pastoral. Era culto e fazia prédicas belíssimas. Não obstante aceitasse todos os encargos que lhe eram atribuídos na Arquidiocese de Vitória, creio que ele se encontrava com a essência de sua vocação evangélica na visita aos enfermos, no apoio aos desvalidos, no conselho aos que se encontravam sem rumo, no abraço fraterno. Esse padre via no rosto dos sofredores a imagem de Jesus Cristo. A santidade brilhava nos seus olhos. Mantinha sempre um sorriso nos lábios, a palavra mansa dos humildes, a orientação inspirada e segura. Foi um fiel seguidor de São Vicente. Vivendo entre os mortais dava a impressão de que estava sempre avistando o infinito.

Muitos leitores, especialmente os que residem no Espírito Santo, já terão identificado que o juiz desta página é o doutor Jairo de Mattos Pereira e o padre é o cônego Maurício Mattos Pereira.

O doutor Jairo faleceu há muitos anos. O cônego Maurício partiu para a mansão do Pai na semana passada.

Nos páramos celestes os dois irmãos celebram o reencontro e agradecem ao Senhor de todas as graças a imensa Graça de terem sido fiéis.

Neste mundo marcado pela ideologia do ter, como é importante apontar aqueles que desprezaram o ter para ser.

Neste mundo em que se busca ascender, subir, conquistar, dominar, que preciosa lição é renunciar ao efêmero por fidelidade ao perene.

Jairo e Maurício são um exemplo para todos nós e, especialmente, exemplo para magistrados e sacerdotes do Espírito Santo e do Brasil.

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