Regras claras

Senado instaura a Comissão de Reforma Política

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23 de fevereiro de 2011, 7h14

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Senado dá o primeiro passo para a Reforma Política - senado.gov.br

Nesta terça-feira (22/2) foi instalada a Comissão da Reforma Política no Senado Federal. Na cerimônia, foi destacada a importância da reforma para tornar mais claras as regras que norteiam as eleições, reduzindo a chamada judicialização da política.

Indicado pelo presidente do Senado, José Sarney, para presidir a comissão, o senador Francisco Dornelles (PP-RJ) considerou a reforma política "um processo difícil", que discutirá "temas estratégicos do sistema político brasileiro". Ao assumir o desafio, ele disse que buscará cumprir o prazo de 45 dias estipulado por Sarney apresentar um anteprojeto a ser discutido pelos senadores.

Sarney elogiou o presidente da comissão por "saber comandar com seu jeito de ajustar opiniões e conflitos e de saber escolher bem seus assessores" e declarou estar "muito otimista de que chegaremos a um resultado excelente. Estou seguro de que devo mobilizar todos nós para marcharmos na reforma política e mudarmos definitivamente a imagem dos políticos do Brasil".

Além de Dornelles, Sarney indicou os demais senadores que participarão da comissão: Fernando Collor (PTB-AL), Itamar Franco (PPS-MG), Roberto Requião (PMDB-PR), Aécio Neves (PSDB-MG), Jorge Viana (PT-AC), Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), José Wellington Barroso de Araújo Dias (PT-PI), Eduardo Braga (PMDB-AM), Demóstenes Torres (DEM-GO), Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), Pedro Taques (PDT-MT), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Lúcia Vânia (PSDB-GO) e Ana Rita Esgario (PT-ES).

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Dias Toffoli: reforma poderá solucionar problema da judicialização da política - stf.jus.br

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, também participou da cerimônia de instalação da Comissão da Reforma Política no Senado Federal. Em seu discurso, o ministro deu um exemplo da necessidade da reforma contando que "o Supremo Tribunal Federal, poucos anos após a promulgação da Constituição de 1988, deu uma interpretação sobre a fidelidade partidária e, quase 20 anos depois, alterando aquela jurisprudência, sob a mesma Constituição, sem alteração do texto constitucional, deu outra interpretação".

Toffoli preside a Comissão de Juristas instituída pelo Senado para elaborar o anteprojeto do novo Código Eleitoral, e disse que o objetivo das duas comissões não se confundem, já que a comissão que preside "tem, simplesmente, a perspectiva de consolidar, uniformizar e aprimorar a legislação vigente sob a égide das premissas constitucionais que existem hoje. Ela não se confunde, de maneira nenhuma, com a ideia de uma reforma política. E desde o início da sua instituição o presidente José Sarney nos incumbiu de deixar isso bem claro".

Quanto ao Código Eleitoral de 1965, o ministro acredita que ele foi superado pelas novas tecnologias, pela Constituição Federal de 1988 e as leis editadas após sua promulgação, e pela redemocratização do país. "Isso leva a uma situação extremamente dramática, ou seja, um mesmo ato de campanha eleitoral pode ser atacado na Justiça por quatro tipos de processos diferentes. Não há racionalidade no processo eleitoral, levando-se a uma profunda judicialização da disputa eleitoral, em detrimento da vontade do eleitor, da vontade popular. E a Justiça Eleitoral existe, única e exclusivamente, para fazer valer a vontade do eleitor, livre da influência do poder econômico, livre do uso da máquina administrativa, como dispõe o parágrafo 9º do artigo 14 da Constituição Federal", afirmou. Com informações da Assessoria de Imprensa do Supremo Tribunal Federal e do Senado Federal.

Leia o discurso do ministro Dias Toffoli: 

"Exmo. Sr. Presidente José Sarney, a quem agradeço as palavras e o convite de estar nesta importante cerimônia do Senado da República e na pessoa de quem cumprimento todas as Sras. e os Srs. Senadores, aqui registrando meus respeitos a esta tão importante Casa para a República e para a democracia brasileira; querido Presidente Marco Maia, da Câmara dos Deputados, na pessoa de quem cumprimento também as Deputadas e os Deputados aqui presentes; nosso Vice-Presidente da República, Michel Temer; nosso Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo; Sr. Relator desta Comissão, Senador Francisco Dornelles; minhas senhoras e meus senhores, é extremamente relevante esta discussão da reforma política porque temos assistido, em razão, talvez, do tempo que foi passando, da Constituição de 1988 e da consolidação da democracia e dos embates que daí surgiram, exatamente uma politização, uma judicialização da política, melhor dizendo.

Um exemplo claro disso é que o Supremo Tribunal Federal, poucos anos após a promulgação da Constituição de 1988, deu uma interpretação sobre a fidelidade partidária e quase vinte anos depois, alterando aquela jurisprudência, sob a mesma Constituição, sem alteração do texto constitucional, deu uma outra interpretação à mesma Constituição.

Isso demonstra a necessidade de um debate muito profundo por aqueles que são os verdadeiros atores da democracia e do poder legiferante, que são as Sras. e os Srs. Senadores e Deputados deste País.

A Comissão de Reforma Eleitoral, que tenho a honra de presidir a convite do Presidente do Senado, José Sarney, que foi instituída em julho de 2010, tem, simplesmente, a perspectiva de consolidar, uniformizar e aprimorar a legislação vigente sob a égide das premissas constitucionais que existem hoje. Ela não se confunde, de maneira nenhuma, com a ideia de uma reforma política. E desde o início da sua instituição o Presidente José Sarney nos incumbiu de deixar isso bem claro. É evidente que os atores das decisões políticas são V. Exªs. A Comissão de Reforma, a comissão técnica tem por fim primordial isto que o Presidente José Sarney disse: subsidiar V. Exªs na produção de um novo código eleitoral.

O Código Eleitoral hoje vigente é de 1965 e encontra-se superado tanto pelas novas tecnologias, como pela nova Constituição de 1988, que sobreveio à sua edição, em 1965, a redemocratização do País e as várias leis que foram editadas a partir da Constituição de 1988.

Isso leva, senhoras e senhores, a uma situação extremamente dramática que V. Exªs conhecem muito bem, e de perto, porque são atores do processo eleitoral. Um mesmo ato de campanha eleitoral pode ser atacado na Justiça por quatro tipos de processos diferentes. Não há racionalidade no processo eleitoral, levando-se a uma profunda judicialização da disputa eleitoral, em detrimento, muitas vezes, da vontade do próprio eleitor, em detrimento da vontade popular. E a justiça eleitoral existe, única e exclusivamente, para fazer valer a vontade do eleitor, livre da influência do poder econômico, livre do uso da máquina administrativa, como dispõe o § 9º do art. 14 da Constituição Federal.

Então, a Comissão de Reforma do Código Eleitoral, assim como as outras que foram instituídas – a de reforma do Código de Processo Civil e a da reforma do Código de Processo Penal –, visa trazer uma racionalidade a um processo eleitoral que hoje se encontra, e é consenso na Nação brasileira, extremamente judicializado e confuso. É com esse mister que estamos desempenhando essa nobre função para a qual fomos designados.

Já temos bastante avançada, como destacou o Presidente José Sarney, essa nova formatação, mas é evidente que há situações que, para uma proposta de novo Código Eleitoral, pressupõem tomadas de decisão. E essas tomadas de decisão devem ser tomadas e decididas por V. Exªs.

Manteremos o sistema proporcional para a Casa Legislativa da Câmara dos Deputados, das Assembleias e da Câmara de Vereadores, ou se mudará esse sistema? A fidelidade partidária, ela abrirá situações possíveis de mudança de partido ou não? O financiamento de campanha será público, será privado, será misto?

São decisões políticas que devem ser tomadas por V. Exªs. Como já destacado pelo Presidente Sarney e pelo Senador Dornelles, essas questões são questões de todos já conhecidas.

São decisões que demandam decisão política. São tomadas de posição que dependem da formação de consensos e de maioria no Parlamento, para que um eventual novo desenho das nossas regras constitucionais e legais para a disputa dos mandatos, para a disputa dos cargos públicos, sejam mais claras, mais explicitadas, podendo sanar algumas das situações ou defeitos que esses 21 anos de redemocratização têm demonstrado desse processo que herdamos, em alguns casos, já centenários como também destacou o Presidente José Sarney.

É necessário que nós busquemos uma maior autenticidade do debate político para essa questão com uma menor politização.

Eu tenho insistido e tenho atuado no Supremo Tribunal Federal e no Tribunal Superior Eleitoral sob essa perspectiva, a de que as decisões políticas e a disputa de cargos e de mandatos pelo espaço político são questões da seara do Poder Legislativo. O Judiciário deve se limitar, e se autolimitar, respeitando as deliberações da classe política, respeitando as deliberações do Congresso Nacional, respeitando as deliberações do processo eleitoral, dos acordos políticos do processo eleitoral.

É extremamente importante e significativo que nesse momento em que a Nação brasileira se coloca a discutir a necessidade de aprimoramento da nossa democracia, a instituição, no Senado, desta comissão, Sr. Presidente – parabenizo a V. Exª, parabenizo o Senado, parabenizo a Câmara, que também está tomando essa providência –, e da nossa parte, tanto na comissão técnica quanto como integrante da mais alta Corte do País e também da Justiça Eleitoral, gostaria de me colocar aqui à disposição para contribuir, no aspecto técnico, para este aperfeiçoamento da República brasileira, da democracia brasileira, enfim, do estado democrático de direito no Brasil.

Muito obrigado, Sr. Presidente, por essa honra de estar aqui presente."

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