Aliança verein

Advogados chineses e australianos criam a maior banca da Ásia

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20 de dezembro de 2011, 12h42

Com seus mercados saturados, as grandes bancas americanas e inglesas há tempos mantêm um olho grande nos países emergentes do BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China). Na China, as autoridades permitem, desde 1979, a instalação de escritórios estrangeiros no país, com restrições. Não podem, por exemplo, praticar advocacia internamente, como atuar nos tribunais ou prestar qualquer tipo de assessoria jurídica a clientes, baseada na legislação chinesa. Devem se limitar à lei internacional ou à lei de seus países de origem. Uma banca australiana e uma chinesa conseguiram, no entanto, dar a volta por cima dessas restrições. A Mallesons Stephen Jaques, uma das maiores e mais antigas firmas da Austrália, está se associando à King & Wood, uma das maiores firmas da China, sediada em Pequim.

A nova firma se chamará King & Wood Mallesons (com os chineses ganhando a quebra de braço na escolha do nome), terá 380 sócios e 1.800 advogados, em cinco países (com escritórios em Nova Yorque, Londres e Tóquio, além de cidades chinesas e australianas). Será, provavelmente, a maior banca de toda a Ásia e maior associação entre bancas internacionais já realizada, sem envolvimento de firmas americanas ou inglesas, diz o site do Wall Street Journal.

Para superar as restrições, as bancas não vão se fundir, de fato. Elas optaram por uma estrutura diferente para a nova firma, a fim de evitar os desafios tradicionais da fusão: a aliança verein – uma estrutura jurídica, prevista na legislação suíça, chamada de "associação voluntária" em outros países. A estrutura verein suíça dispensa o registro, de forma que as firmas podem ter personalidades jurídicas separadas. E, igualmente, podem manter separadas as suas finanças. Segundo a Wikipédia, essa estrutura é adotada na Suíça especialmente pelas ONGs, como a Anistia Internacional e o Fundo Mundial para a Vida Selvagem. E vem sendo usada no mundo por organizações empresariais, profissionais e esportivas, entre outras, que querem assegurar responsabilidades limitadas em suas atividades internacionais. No caso, o controle da firma é descentralizado. E cada escritório só é regulado pelo – e só presta contas ao – país no qual opera.

A King & Wood Mallesons, cuja operação deve ser concluída em março, vai atuar plenamente dentro da China Continental através de seu braço chinês. O restante da firma vai atender organizações estatais chinesas que fazem investimentos externos e outros clientes com necessidades jurídicas que podem ser atendidas pela combinação de escritórios na China, Austrália, Hong Kong e outros países.

Especialistas da comunidade jurídica mundial dizem, segundo o Wall Street Journal, que as bancas americanas e inglesas estão acompanhando com muita atenção esse desenvolvimento, porque elas mesmas estão interessadas em formar arranjos similares de parceria – em vez de fusões – com outras bancas chinesas de primeira linha. O consultor Brad Hildebrandt, que assessorou as firmas nas negociações para a formação da King & Wood Mallesons, disse que desde que a associação foi anunciada, seu telefone não para de tocar.

Exercício de marcas
As análises da negociação têm sido diferentes, no entanto. O consultor jurídico Bruce MacEwen, de Nova York, elogiou: "É o primeiro sinal notório de que um novo centro de gravidade está se desenvolvendo entre firmas globais de primeira linha". O presidente da K&L Gates LLP, firma americana com quase 2 mil advogados, disse que o negócio foi apenas "um pouco mais" do que um exercício de marcas. "Você tem duas firmas de advocacia distintas, dois centros diferentes de lucros e dois perfis financeiros diferentes", declarou.

O sócio-executivo da Malleson, Robert Milliner, rejeitou a crítica, definindo-a como "um olhar retrógrado". Ele disse que essa estrutura vai dar maior flexibilidade à nova firma. "Vamos oferecer maior capacidade aos clientes e não fontes diferentes de receita", afirmou. Os sócios chineses, por sua vez, viram várias vantagens na associação das firmas. Uma delas é que a firma australiana, criada no século XIX, tem conhecimentos de gestão de escritórios que eles não têm. Outra, é que já estão ganhando clientes que, de outra forma, não conquistariam. A nova firma vai, por exemplo, ajudar empresas estatais chinesas a adquirir empresas do setor de energia e recursos naturais em outros países, disse o sócio-executivo da banca, em Pequim, Wang Ling.

Por enquanto, as bancas dos EUA e do Reino Unido tem tentado uma abordagem diferente para colocar um pé na China. Elas abrem escritórios m Hong Kong, que tem um sistema jurídico separado, e na China Continental, para assessorar empresas locais e multinacionais no que se refere à legislação americana ou internacional. E também para ajudar as empresas ocidentais a cumprirem as etapas necessárias para fazer alguma fusão ou aquisição na China, como a de uma fábrica. Para tarefas que requerem advogados treinados na China, as empresas ocidentais recorrem às firmas locais.

Mas a prática da advocacia na China, cujo sistema jurídico está em constante evolução, ultimamente, traz mais desafios do que apenas questões técnicas, como as diferenças culturais. Os advogados não têm a mesma importância que têm nos países ocidentais, quando se trata de fechar negócios. E a maioria dos clientes chineses ainda se assusta com os custos dos serviços jurídicos prestados, por exemplo, por grandes bancas americanas e inglesas. "As firmas ocidentais ainda precisam de muita ajuda local para navegar na China", diz o sócio da McDermott, Jeffrey Stone. Disputas sobre planos de compensação, preocupações sobre perda de autonomia e choques culturais entre os advogados, cada qual acostumado a fazer as coisas de seu jeito, são problemas constantes.

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