Guerra das Teles

Nassif e iG devem pagar R$ 30 mil a Diogo Mainardi

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15 de dezembro de 2011, 16h29

O jornalista Luis Nassif e o iG, provedor de conteúdo, foram condenados a pagar R$ 30 mil por danos morais ao ex-colunista da revista Veja Diogo Mainardi. A decisão da 10ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo é desta terça-feira (13/12) e dela cabe recurso.

A ação se deu em razão de ataques a Mainardi publicados no Blog do Nassif. Por unanimidade, os desembargadores concluíram que houve ofensa pessoal em passagens como "Mainardi se revelaria com falta de escrúpulos suficiente para cometer qualquer assassinato de reputação que lhe fosse encomendado".

Nassif recorreu da sentença, na qual havia sido condenado, alegando que não fez críticas ou ofensas pessoais a Mainardi. Segundo a sua defesa, houve "crítica objetiva e de cunho técnico" dirigidas aos textos publicados, e não ao colunista. Os advogados também apontaram a inexistência de abalo moral.

Para a 10ª Câmara, Nassif, ao criticar Mainardi, "levantou suspeita a respeito da integridade moral do autor, sua isenção como jornalista e ainda avançou para críticas à sua postura em relação à sua vida pessoal".

O iG, provedor de conteúdo no qual o Blog do Nassif se hospeda, também foi condenado com base na Súmula 221 do Superior Tribunal de Justiça. Segundo o enunciado, são responsáveis pelo dano tanto o autor do texto quanto o proprietário do veículo.

Como o iG contratou a empresa de Nassif (Dinheiro Vivo Consultoria), por R$ 30 mil, pelo conteúdo de quatro blogs, foi condenado "como veículo de divulgação das matérias redigidas pelo jornalista Luis Nassif e não como mero hospedeiro".

Para a desembargadora Márcia Dalla Déa Barone, relatora do caso, ao chamar Mainardi de "colunista sela — nome que se dá ao colunista pouco informado que se deixa ‘cavalgar’ pela fonte, tornando-o mero passador de recados", Nassif teve "claro desejo" de desmerecer a pessoa do jornalista.

A defesa de Mainardi, feita pelo escritório Lourival J. Santos, reclamou de Nassif dizer que o colunista usava "situações pessoais, como as dificuldades físicas de seu filho, para ganhar simpatia dos leitores para fins escusos".

As afirmações feitas no blog, de acordo com a relatora do caso, "colocam sob suspeita não só a qualificação profissional de Mainardi, mas também seu caráter, a gerar inequívocos reflexos em sua vida pessoal".

Na decisão, a desembargadora afirma que "o abalo moral configurado na espécie não tem como ser mensurado, na medida em que não se conhece o grau de influência das notícias divulgadas pelo requerido em relação à opinião dos leitores, sendo, contudo, inequívoca sua ocorrência".

A defesa de Mainardi pediu também que Nassif fosse obrigado a publicar a sentença em seu blog, como determinava a Lei de Imprensa. O pedido, porém, foi negado. No entendimento da Câmara, "a obrigação não pode mais ser imposta diante do reconhecimento da não recepção da Lei de Imprensa pela Constituição Federal".

Processo 0172157-92.2008.8.26.0100

Leia abaixo a íntegra do texto que deu origem à série que motivou o processo:

O quarteto de Veja

Dantas se aproxima e a revista muda seu rumo editorial

Disparados os primeiros petardos, Dantas procurou se aproximar de várias frentes na Veja. Há tempos mantinha relacionamento com Lauro Jardim, editor da seção Radar, onde costumava plantar corriqueiramente balões de ensaio.

Em meados de 2005, provavelmente entre maio e junho, a relação se amplia. 18 de maio de 2005 é a data do último ataque a Dantas; 15 de junho de 2005 o início ostensivo da mudança de rota.

Através de Jardim, Dantas se aproxima de Eurípedes. Pareciam até movimentos concatenados da parte da direção da revista. Primeiro, os ataques a Dantas e a seus representantes na imprensa. Depois, a abertura para conversas. 

Nesse jogo, o papel mais ostensivo passaria a ser desempenhado por Diogo Mainardi. Pouco tempo antes, ele havia escrito algumas colunas falando de fundos de pensão. Por alguma razão, houve uma espécie de leilão no Rio de Janeiro para conseguir seu passe.

O mundo dos lobbies cariocas 

E aí vale uma segunda pausa para falar do mundo de lobbies do Rio. São pessoas com bom trânsito com imprensa, empresas, políticos e judiciário. Em geral pulam de um lado para outro, oferecendo serviços especialmente em grandes embates empresariais ou políticos.

Nos últimos tempos se consolidaram dois grupos mais atrevidos. Um, comandado por Nelson Tanure, do Jornal do Brasil; outro, por Daniel Dantas.

Tanure foi o primeiro a perceber a importância empresarial das disputas judiciais. Elas não são um fim em si mesmo, mas um instrumento para abrir campo para acordos vantajosos. Foi assim que conseguiu vultosa indenização do Bradesco, para interromper uma ação contra a aquisição do Banco Boa Vista.

Depois, passou a dar assessoria para empresas em luta contra Dantas, como a canadense TIW. 

Mainardi havia começado a ganhar destaque por subir vários tons nas ofensas contra Lula e também pelo uso de dramas familiares como tema de colunas – o que despertara simpatia em parte do público da Veja.

Adversário de Dantas, Nelson Tanure tentou levá-lo para o Jornal do Brasil. Veja acabou cobrindo a proposta, praticamente dobrando o salário de Mainardi.

Não sei a razão objetiva desse assédio. Poderia ser o fato de Mainardi ter mostrado ser "colunista sela” – nome que se dá ao colunista pouco informado que se deixa "cavalgar" pela fonte, tornando-se mero repassador de recados, em troca da repercussão que as notas proporcionam. Pelo menos no início, deveria ser esta a lógica que consolidava a parceria.

O fato é que os os lobistas perceberam em Mainardi um colunista em disponibilidade. Além disso, seu próprio papel de “para-jornalista” na revista – papel que, na Folha, é exercido com muito talento por Zé Simão; no Globo, por Agamenon Mendes Pedreira –  rompia com os limites do jornalismo e abria campo amplo para divulgar qualquer informação que lhe fosse entregue, mesmo sem a necessidade sequer de um simulacro de apuração jornalística. E Mainardi se revelaria com falta de escrúpulos suficiente para cometer qualquer assassinato de reputação que lhe fosse encomendado.

Naquele período, figura tipicamente carioca que transita por esses ambientes teve alguns almoços com Mainardi e me contou a impressão que ele lhe passou.

Pessoalmente tímido até o limite de não levantar os olhos para encarar o interlocutor; escassa informação em política, história e, especialmente, sobre o intrincado mundo dos negócios e das disputas empresariais. Mas ávido pelas benesses que a exposição jornalística trazia.

Obviamente nenhum colunista iria enveredar tão ostensivamente pelo mundo das guerras corporativas e "assassinatos de reputação" se não tivesse respaldo de sua chefia maior.

O acerto de Veja com Mainardi foi precedido de uma aproximação entre Eurípedes e Dantas, intermediada por Lauro Jardim.

A partir de então, Eurípedes passou a ter ligação direta com o banqueiro. Conversam corriqueiramente, sem prejuízo dos contatos de Dantas com Jardim e Mainardi. O diretor abria espaço por cima; os colunistas entravam com a mão de obra.

O trio se tornava, então, o quarteto de Veja que, dali por diante, entraria de cabeça na campanha a favor de Dantas: Eurípedes Alcântara, Mário Sabino, Lauro Jardim e Diogo Mainardi.

Nos meses seguintes, ocorreria uma mudança radical no tratamento dado pela revista àquele que, segundo ela própria, tinha por hábito grampear, montar dossiês falsos e comprar jornalistas.

Como vocês se recordam, os três grandes petardos de Veja contra Dantas saíram nas seguintes datas:

No dia 28 de julho de 2004, “Um negócio de espiões”

No dia 3 de novembro de 2004, “O Dia da Caça”

No dia 18 de maio de 2005, “A Usina de Espionagem da Kroll”

A mudança de linha se dá nitidamente na edição de 15 de junho de 2005, menos de um mês após a publicação da matéria mais dura contra Dantas.

Na mesma edição, Gushiken foi atacado em nota do Radar, segundo a qual Lula estaria atribuindo-lhe culpa pelos problemas de comunicação do governo; outra nota fazia ilações entre Gushiken, as ações dos fundos e Delúbio Soares.

De vítima de Dantas, Gushiken começava, a partir de então, a se tornar seu algoz, de acordo com a construção jornalística que Veja começou a  montar.

Na edição seguinte, de 22 de junho de 2005, o Radar soltava uma saraivada em cima dos fundos de pensão que disputavam o controle da Brasil Telecom. Uma nota “denunciando” o aluguel de um jatinho pela Previ, para levar um companheiro (para poder chegar a tempo ao enterro do irmão). E outra sobre um suposto “gigantesco prejuízo” do fundo Petros. 

Na mesma edição, nota sobre Gushiken insinuando que se preparava para ocupar o lugar de José Dirceu. Em uma edição, se tentava mostrá-lo fraco; na outra, todo poderoso, com o claro intuito de jogá-lo no epicentro do terremoto político que se avizinhava.

Mas era apenas aquecimento. Embalada pela blindagem proporcionada pelo campanha contra Lula, Veja se desarmava dos cuidados necessários e caía de cabeça nos "assassinatos de reputação".

Daniel Dantas conseguia sair de O Povo e passava a influenciar diretamente a maior revista semanal brasileira.

A série de textos que geraram o processo contra Nassif estão reproduzidos aqui.

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