Assistência jurídica

Defensores são contra mudanças na gestão do convênio

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7 de dezembro de 2011, 15h51

A Associação Paulista de Defensores Públicos (Apadep), entidade representativa dos 500 defensores públicos do estado de São Paulo, e a Associação Nacional de Defensores Públicos (Anadep), entidade que representa os mais de 5 mil defensores públicos de todo o país, são contra o PLC 65/2011, que pretende transferir a gestão do Fundo de Assistência Judiciária (FAJ), da Defensoria Pública para a Secretaria de Justiça e Cidadania do Governo de São Paulo. As entidades divulgaram nota sobre o projeto em trâmite na Assembleia Legislativa de São Paulo.

O deputado Jorge Caruso (PMDB) deu parecer favorável ao projeto de lei na segunda-feira (5/12), como noticiou a revista Consultor Jurídico. Para o parlamentar, o texto de autoria da OAB-SP contempla os requisitos de constitucionalidade, legalidade e juridicidade.

De acordo com a nota das entidades, a proposta, além de ignorar o modelo público constitucional de assistência jurídica vigente no país, está repleta de outras inconstitucionalidades: “trata-se de vício de iniciativa porque a competência de legislar sobre a Defensoria Pública é do governador do estado; e material, por afrontar a autonomia institucional, garantida pela emenda constitucional 45, de 2004, e a previsão constitucional de que o Estado deve prestar orientação jurídica por meio da Defensoria Pública, e não pelo Executivo e suas Secretarias.”

A Apadep e a Anadep também manifestaram na nota preocupação com as consequências desta transferência da gestão do Fundo de Assistência Judiciária junto à população carente do estado, destinatária final dos serviços da Defensoria Pública.

Segundo as entidades, o FAJ representa hoje cerca de 90% da verba destinada à instituição pelo Executivo estadual. A Apadep e a Anadep afirmam que na prática o modelo proposto pela OAB-SP vai inviabilizar a prestação de assistência jurídica gratuita feita no estado tanto pela Defensoria quanto pelos advogados dativos. 

A nota também menciona o artigo 5°, LXXIV, da Carta Magna, o qual consta que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. E afirma que a “Ordem dos Advogados do Brasil persiste em caminhar no sentido oposto, colocando interesses corporativos à frente do modelo público de assistência jurídica vigente no país”.

É antiga a briga entre a OAB-SP e a Defensoria Pública em relação ao convênio. A OAB de São Paulo, inclusive, já emitiu nota pública, manifestando sua indignação diante de algumas medidas tomadas pela Defensoria Pública em relação ao Convênio de Assistência Judiciária.

Segundo a OAB-SP, os enunciados e comunicados da Defensoria Pública vêm modificando unilateralmente as condições do convênio, resultando em danos para a advocacia. Na ocasião, citou a protelação, sem razão, do pagamento dos honorários. A Ordem também alegou que das 55 mil certidões expedidas pelo Judiciário para pagamento dos advogados, em setembro, 13 mil foram injustamente devolvidas.

A Defensoria contra-argumentou. Afirmou que são feitas reuniões mensais com a Ordem para tratar dos detalhes sobre o convênio, o que, segundo a Defesoria, serve como prova de que as decisões não são unilaterais. Já sobre a demora para pagar os advogados, a Defensoria disse se tratar de uma reação ao processo de análise da regularidade de todas as certidões que geram pagamentos aos advogados inscritos no convênio. "O pagamento não é tão automático, a Defensoria precisa analisar para quem está pagando e por que", explicou o defensor público Rodrigo Nitrini.

Ainda segundo a nota de resposta da Defensoria, "esse procedimento tem zelado pela boa gestão do erário, que remunera os profissionais, com resultados positivos. Para exemplificar o volume de valores envolvidos, até julho passado, a Defensoria pagou em 2011 um total de R$ 159,1 milhões, uma média de R$ 22,7 milhões ao mês para a OAB-SP".

A nota também relata que a Defensoria Pública firma posição contra a renovação do Convênio de Assistência Judiciária desde 2007. E que este só foi mantido graças a uma liminar obtida pela Ordem na Justiça Federal. Afirmou, ainda, que a Defensoria assinou diversos convênios de assistência judiciária com estranhos, em conflito com a Constituição Estadual e a Lei Complementar 988/2006.

Quanto ao fato de a Defensoria firmar convênio com "estranhos", a Defensoria rebateu a acusação dizendo que "são infundadas as alegações de que a Ordem possui direito a um monopólio na elaboração de convênio com a Defensoria. A autonomia administrativa garantida pela Constituição à Defensoria Pública confere-lhe o direito a elaborar convênios com outras entidades, com o objetivo de otimizar a gestão dos recursos".

Leia abaixo a nota Anadep e Apadep:

A Associação Paulista de Defensores Públicos (Apadep), entidade representativa dos 500 defensores públicos do estado de São Paulo, e a Associação Nacional de Defensores Públicos (Anadep), entidade que representa os mais de 5 mil defensores públicos de todo o país, vêm a público manifestar-se veementemente contrárias ao projeto de lei complementar PLC 65/2011, em trâmite na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), que pretende transferir a gestão do Fundo de Assistência Judiciária (FAJ) da Defensoria Pública para a Secretaria de Justiça e Cidadania do Governo de São Paulo.

A proposta, de iniciativa de parlamentar, além de ignorar o modelo público constitucional de assistência jurídica vigente no país, está repleta de outras inconstitucionalidades: trata-se de vício de iniciativa porque a competência de legislar sobre a Defensoria Pública é do governador do estado; e material, por afrontar a autonomia institucional, garantida pela emenda constitucional n° 45, de 2004, e a previsão constitucional de que o Estado deve prestar orientação jurídica por meio da Defensoria Pública, e não pelo Executivo e suas Secretarias. 

A Apadep e a Anadep também manifestam alto grau de preocupação com as consequências desta transferência da gestão do Fundo de Assistência Judiciária (FAJ) junto à população carente do estado, destinatária final dos serviços da Defensoria Pública. O FAJ representa hoje cerca de 90% da verba destinada à instituição pelo Executivo Estadual. Na prática, portanto, o modelo proposto pela OAB-SP vai simplesmente inviabilizar a prestação de assistência jurídica gratuita realizada no estado tanto pela Defensoria quanto pelos advogados dativos. 

A Constituição Federal do Brasil, há 23 anos, estabeleceu como dever do Estado garantir a defesa jurídica daqueles que não podem arcar com as custas de um advogado particular. Nos termos da Carta Magna, em seu artigo 5°, LXXIV: “O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. E para efetivar esta prestação de serviço jurisdicional o artigo 134 da Constituição instituiu a Defensoria Pública. No entanto, contrariando a própria história da entidade, a atual diretoria da seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil persiste em caminhar no sentido oposto, colocando interesses corporativos à frente do modelo público de assistência jurídica vigente no país.

No estado de São Paulo, a Defensoria Pública foi criada em 2006, após 18 anos do comando constitucional e após movimentação popular que envolveu mais de 400 entidades da sociedade civil organizada. Como a assistência jurídica gratuita é um dever público, nos locais onde ainda não há instalações da Defensoria, o Estado, por meio desta, paga advogados inscritos na OAB-SP para atuarem na defesa da população carente. Estes profissionais, que não prestaram concurso público, são remunerados a cada processo ou a cada audiência, por meio de receitas públicas advindas do Fundo de Assistência Judiciária (FAJ), sem qualquer procedimento licitatório por força de lei, cuja constitucionalidade é questionada pela Procuradoria Geral da República e Defensoria Pública junto ao STF (ADIN 4163).  

Este modelo, verificado nesta proporção apenas no estado de São Paulo, constitui um paliativo, claramente inconstitucional, em transição, e altamente oneroso aos cofres públicos, ao bolso do cidadão contribuinte. Para que isso fique mais claro, imaginemos, por exemplo, se o número insuficiente de juízes e promotores no estado de São Paulo recebesse a mesma tratativa. Para suprir tal lacuna, o Executivo contrataria bacharéis em Direito, sem concurso público, para atuarem como magistrados ou promotores de justiça. Isso seria plausível? Como a resposta é não, por que para a instituição Defensoria Pública isso pode ser feito?

Enquanto o estado não conta com o número ideal de defensores públicos para prestação de assistência jurídica gratuita, permanece a necessidade de contratação de advogados dativos. E como pelo ordenamento jurídico vigente cabe à Defensoria gerir o fundo do qual advém verbas para o pagamento de advogados conveniados, à instituição não resta outra alternativa senão zelar pela boa gestão do erário e honrar os deveres estipulados no convênio firmado com a Ordem dos Advogados.

Mas inconformada justamente com esta gestão do convênio realizado pela Defensoria e após ameaçar a interrupção dos serviços prestados pelos advogados dativos, as lideranças da advocacia paulista aprovaram no Colégio de Presidentes de Subseções, em outubro, proposta para esta transferência da gestão do convênio de Assistência Judicial. Em seguida, foi apresentado o projeto de lei 65/2011 na Assembléia Legislativa do Estado com o mesmo objetivo.

Em resposta a uma nota divulgada pela OAB-SP, a administração da Defensoria Pública explica os porquês do não pagamento de pequena parcela de certidões aos advogados dativos. Durante processo de análise, “verificou-se que uma parte das certidões apresentava inconsistências e irregularidades, porque preenchidas sem todas as informações necessárias. Houve casos de pedidos de pagamento por situações não previstas nos termos do convênio. Havia também casos de certidões apresentadas em duplicidade”, diz a nota assinada no final de outubro. 

Apesar da patente inconstitucionalidade deste projeto de lei, o deputado e advogado Jorge Caruso (PMDB) deu parecer favorável à iniciativa, causando grande perplexidade junto aos defensores públicos.   

A Apadep e a Anadep aguardam agora da Casa Legislativa paulista a manutenção do histórico compromisso com os princípios e regras constitucionais vigentes no país, votando pelo imediato arquivamento do PLC 65/2011.
São Paulo, 06 de dezembro de 2011.  

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