Estante Legal

Os conflitos de interesse na recuperação de empresas

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29 de agosto de 2011, 13h29

Spacca
Uma boa lei, mas com um nó que precisa ser desatado para cumprir os objetivos que levaram à sua criação. A definição é do professor Ecio Perin Junior, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito Empresarial, e representa uma pequena síntese do seu Curso de Direito Falimentar e Recuperação de Empresas, que chega às livrarias pela Saraiva. No livro, ele discute o instituto da falência e seus efeitos em relação aos credores, à pessoa do falido ou aos seus contratos e explora novos ângulos no instituto da recuperação da empresa em crise econômico-financeira.

Especialista em Direito Empresarial pela Universidade de Bologna, na Itália, Perin Junior aponta alguns "conflitos" que considera presentes na Lei 11.101, que está completando seis anos, e tenta estreitar os limites entre o interesse público na preservação da empresa e do emprego e o interesse privado dos credores dessa mesma empresa em crise. O texto em vigor é considerado uma ferramenta importante para evitar que empresas ainda com potencial produtivo fechem as portas definitivamente. Considera a falência uma exceção e, pelo menos em tese, deveria dar a credores e devedores plenas condições de negociarem a melhor forma de resolução dos conflitos. Mas alguns dos seus pontos, ou a interpretação que tem sido dada a eles, vêm sofrendo críticas contundentes, com o argumento de que contrariam o espírito da lei.

A principal polêmica parece residir no parágrafo 3º do artigo 49, que exclui dos efeitos da recuperação judicial "os créditos fiduciários de bens móveis ou imóveis". São créditos normalmente em poder de instituições financeiras. Do jeito que tem sido aplicada, na maioria das vezes, pelos tribunais, a ressalva beneficia os bancos, embora não fique claro como isso pode beneficiar também devedor e credores, que mais do que nunca precisariam contar com todos os recursos disponíveis na tentativa de encontrarem uma saída para a crise em que se encontram.

"Talvez o grande nó seja essa questão dos créditos excluídos da recuperação judicial e extrajudicial", admite Perin Junior, "cético" quanto aos efeitos da exclusão de tais créditos na recuperação judicial de uma empresa. Ele considera "de fundamental importância" que a lei seja aplicada para reconhecer a sujeição desses créditos em benefícios das empresas em crise, atendendo, assim, os princípios constitucionais da razoabilidade ou proporcionalidade.

Contra quem argumenta que a exclusão das garantias fiduciárias dos efeitos da Lei 11.101 submetem os bancos a um menor risco e facilitam, assim, a liberação de créditos às próprias empresas em dificuldade, Perin Junior admite que, de fato, seria esse um dos objetivos da Lei de Falências e Recuperação de Empresas: criar condições para a diminuição do spread bancário — a diferença entre os juros cobrados nos empréstimos e as taxas pagas pelos bancos aos investidores.

"Mas, na prática, não é isso que se percebe", afirma. "Os spreads praticados pelos bancos continuam exorbitantes e deveriam ser tratados no contexto da política de preços praticada pelos bancos, já que é um dos meios utilizados no pagamento dos serviços prestados por eles." 

Significa que a lei é ruim? "Em hipótese alguma", afasta o autor. "Pelo contrário, ela dá a oportunidade ao empresário em crise econômico-financeira de tentar encontrar uma alternativa segura para a sua recuperação." Para ele, a questão que se coloca é saber se os objetivos da tão desejada simplificação, da celeridade e da redução de riscos no processo falimentar, assim como na diminuição do spread bancário continuam a prevalecer. E vai além: o interesse público da preservação da empresa deve prevalecer em relação ao interesse privado dos credores nesse estado de exceção que se encontra a empresa em crise? — questiona. 

Para o autor, embora não seja o único, a satisfação, pela forma mais eficiente possível, dos direitos dos credores é, sem dúvidas, um dos objetivos precípuos de qualquer processo falimentar. "Como a garantia desses é o patrimônio do devedor, são eles que devem decidir quanto à melhor efetivação dessa garantia", complementa. Sendo assim, Perin entende que, quando a massa falida não consegue gerar os rendimentos necessários ao cumprimento das suas obrigações, a melhor satisfação dos credores pode passar tanto pelo encerramento da empresa, como pela manutenção de sua unidade produtiva.

Em seu Curso de Direito Falimentar e Recuperação de Empresas, Perin Junior também chama a atenção para dois aspectos que considera essenciais: o primeiro é necessidade de uma clara distinção entre empresas que devem ser socorridas e salvas e empresas que devem encerrar suas atividades econômicas. O outro é que um sistema legal para ser considerado eficaz deve diferenciar a aplicação de rígidas sanções ao empresário e não à empresa.

Ele também alerta no livro que não basta modernizar a legislação se por trás não existir um Judiciário preparado, jurídica e economicamente, para a ruptura que se faz necessária. Nesse sentido, defende a criação de varas e câmaras especializadas na área empresarial, "como timidamente já ocorre em alguns estados, diante das particularidades envolvidas, tanto nas questões falimentares, como também nas questões societárias de maior complexidade".

SERVIÇO:
Título: Curso de Direito Falimentar e Recuperação de Empresas
Autor: Ecio Perin Junior
Editora: Saraiva
Edição: 2011
Páginas: 469 

Também na estante:
Comentários à Lei de Falências e de Recuperação de Empresas – Fábio Ulhoa Coelho

Comentários à Lei de Sociedades Anônimas – Modesto Carvalhosa 

Lei de Falência e Recuperação de Empresas – Waldo Fazzio Jr. 

Manual de Direito Comercial e de Empresa – Vol. 3 – Ricardo Negrão 

Manual de Direito Empresarial Brasileiro – Wilges Bruscato

Teoria Geral e Direito Societário – Marlon Tomazette 

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