Pacto com cliente

Relevância social orienta avaliação de contratos

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21 de agosto de 2011, 8h56

A apreciação valorativa de um inadimplemento contratual deve levar em conta a análise global do pacto, como suas cláusulas, o comportamento das partes durante todo o contrato e o quanto já foi cumprido. A conclusão é do ministro Luis Felipe Salomão, da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar recurso movido por empresa de leasing em demanda com um cliente.

O cliente pactuou com a empresa um contrato de arrendamento mercantil para aquisição de veículo e chegou a pagar 31 das 36 parcelas acertadas. A instituição financeira entrou com pedido de reintegração de posse, mas a 5ª Vara Cível de Porto Alegre negou o pedido. O juiz considerou que, como houve o adiantamento do valor residual garantido, descaracterizou-se o leasing.

O TJ-RS, ao julgar apelação da empresa, considerou que a reintegração de posse representaria “lesão desproporcional” ao consumidor, depois de tudo o que foi pago, e aplicou a teoria do adimplemento substancial.

A empresa recorreu ao STJ, alegando que, nos termos da Lei 6.099/74, que regulamenta o arrendamento mercantil, a ação de reintegração de posse seria procedente, pois o devedor se acha em mora. Segundo a empresa, a decisão do TJ-RS teria desrespeitado o artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor e também os artigos 422, 394 e 475 do Código Civil – esses últimos se referem ao cumprimento de cláusulas contratuais e à resolução do contrato em caso de inadimplemento.

Para o ministro Luis Felipe Salomão, o direito à extinção do contrato a pedido do credor deve ser reconhecido com cautela. Ele apontou que o contrato hoje é prática social de especial importância e, consequentemente, o Estado não pode relegá-lo à esfera das deliberações particulares.

“A insuficiência obrigacional poderá ser relativizada com vistas à preservação da relevância social do contrato e da boa-fé, desde que a resolução do contrato não responda satisfatoriamente a esses princípios”, ponderou o ministro relator. Essa é, segundo ele, “a essência da doutrina do adimplemento substancial do contrato”.

O próprio artigo 475 do Código Civil, salientou o magistrado, ao autorizar a extinção do contrato, abre as portas para outras formas de cumprimento do que foi pactuado – a parte lesada pelo inadimplemento tanto pode pedir a resolução como exigir o cumprimento do contrato, além de reclamar indenização por perdas e danos. O ministro lembrou ainda que essa orientação é seguida em Códigos Civis de outros países, como o italiano e o português.

No caso, destacou o relator, é cabível a aplicação da teoria do adimplemento substancial. Ele asseverou que essa teoria visa impedir o uso desequilibrado do direito de resolução por parte do credor. Segundo os autos do processo, 86% da obrigação já foi cumprida e ainda haveria o depósito de R$ 10.500,44 a título de VRG.

O ministro Salomão também destacou que a dívida não “desaparece”, o que abriria as portas para fraudes. Segundo ele, a instituição financeira deve “se valer de meios menos gravosos e proporcionalmente mais adequados à persecução do crédito remanescente”. A 4ª Turma negou provimento ao recurso da empresa de leasing, vencido o ministro João Otávio de Noronha. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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