Dívida de hipoteca

STF analisa execução extrajudicial de dívida hipotecária

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19 de agosto de 2011, 8h47

Pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu nesta quinta-feira (18/8) a análise sobre a compatibilidade ou não dos dispositivos legais que autorizam a execução extrajudicial de dívidas hipotecárias, dispostos no Decreto-lei 70/66, com a Constituição Federal. Por enquanto, há quatro votos pela incompatibilidade e dois que consideram que os dispositivos estão de acordo com a CF.

Os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia, Ayres Britto e Marco Aurélio são os que já votaram pela incompatibilidade. Já, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski entendem que as dívidas hipotecárias podem sofrer execução extrajudicial. Eles, inclusive, lembraram que o Supremo tem jurisprudência pacífica sobre a matéria.

Do contra
Os quatro ministros que defendem a incompatibilidade da execução extrajudicial de dívidas hipotecárias com a CF afirmam que ela ofende o devido processo legal. Nesta quinta-feira, o primeiro a se pronunciar nesse sentido foi o ministro Luiz Fux. "Esse decreto-lei inverte completamente a lógica do acesso à Justiça", disse. "O devedor é submetido a atos de expropriação sem ser ouvido e se ele eventualmente quiser reclamar ele que ingressa em juízo", emendou. Para Luiz Fux, o procedimento de expropriação de bens do devedor sem a intervenção de um juiz afronta o princípio do devido processo legal.

A ministra Cármen Lúcia ressaltou a jurisprudência assentada sobre a matéria, mas lembrou que isso não significa que o entendimento não possa ser modificado, como ela entende que deve ocorrer. "A análise do que se tem no Decreto-lei 70/66 desobedece, a meu ver, os princípios básicos do devido processo legal, uma vez que o devedor se vê tolhido nos seus bens sem que haja a possibilidade imediata de acesso ao Poder Judiciário", disse.

O ministro Ayres Britto concordou que, no caso, há desrespeito ao devido processo legal. "O Decreto-lei 70/66 consagra um tipo de execução privada de bens do devedor imobiliário que tem aparência de expropriação, na medida em que consagra um tipo de autotutela que não parece corresponder à teleologia da Constituição quando (esta) fala do devido processo legal", afirmou.

Quando votou sobre a matéria, no dia 25 de maio deste ano, o ministro Marco Aurélio também frisou que a Constituição determina que a perda de um bem deve respeitar o devido processo legal e, portanto, deve sempre ser analisada pelo Poder Judiciário. "Ninguém pode fazer Justiça com as próprias mãos."

A favor
O julgamento começou nesta quinta-feira com o voto do ministro Dias Toffoli, que defendeu que o atual entendimento do Supremo sobre a questão seja mantido. Ele citou decisões antigas sobre o tema que ressaltam que as regras do decreto-lei não representam uma supressão do processo de execução do efetivo controle judicial, mas tão-somente um deslocamento do momento em que o Poder Judiciário é chamado a intervir. No caso, o executado poderá buscar reparação judicial se entender que teve seu direito individual de propriedade lesado.

Dias Toffoli acrescentou que os demais tribunais do país passaram a adotar o mesmo entendimento do Supremo diante do firme posicionamento jurisprudencial da Corte sobre a matéria. "Mostra-se de rigor a reafirmação dessa pacífica jurisprudência para que se reconheça agora, com a autoridade de matéria cuja Repercussão Geral já foi reconhecida pelo plenário virtual da Corte, a recepção, pela Constituição Federal de 1988, das normas do Decreto-lei 70/66, que cuidam da execução extrajudicial", concluiu.

O ministro Ricardo Lewandowski iniciou seu voto expressando preocupação com o volume de processos judiciais existentes no país e ressaltando o esforço do Conselho Nacional de Justiça para estimular a mediação, a conciliação e a arbitragem. Ele falou ainda que o financiamento da casa popular vem crescendo e, diante disso, é preciso pensar em mecanismos ágeis para que esse mercado em expansão possa funcionar adequadamente.

"Entendo que, desde o momento que o Decreto-lei 70/66 foi concebido, teve-se em mente a desburocratização do sistema de financiamento da casa própria e do imóvel para a pessoa física", disse. Ele também frisou o fato de o Supremo ter uma jurisprudência sólida sobre a matéria tanto antes quanto depois da promulgação da Constituição.

Citando argumentos do professor Orlando Gomes, o ministro Ricardo Lewandowski lembrou ainda que o decreto-lei não impede ou proíbe o acesso à via judicial e que em qualquer fase da execução extrajudicial é possível o acesso ao Judiciário. "Portanto, se houver qualquer ofensa ao devido processo legal no que tange a essa execução extrajudicial, a parte que se considera prejudicada pode acorrer ao Judiciário", afirmou.

Pedido de vista
Ao pedir vista dos processos, o ministro Gilmar Mendes se disse "extremamente preocupado" com o que classificou como "forma de pensar" que traz sempre mais questões para o Judiciário. Para o ministro, o modelo que se desenha "onera sobremaneira o Judiciário" e "o inviabiliza de forma clara, trazendo inclusive custos adicionais para o modelo de contrato e de financiamento".

"A mim parece que a ideologia hoje presente é de realização de direitos, se necessário, com a intervenção judicial", disse. Segundo o ministro, em países que respeitam o Estado de Direito é muito comum a prática de execução nos moldes do Decreto-lei 70/66. "Tendo em vista os votos já avançados no sentido da não recepção (do decreto-lei pela Constituição), vou pedir vista dos autos para trazer um exame mais acurado do tema", concluiu.

Histórico da matéria
A matéria está sendo analisada no julgamento de dois Recursos Extraordinário, sendo que um deles teve Repercussão Geral reconhecida. Isso significa que a decisão tomada pelos ministros deverá ser aplicada a todos os recursos idênticos em todo país.

Um dos recursos é de relatoria do ministro Marco Aurélio e começou a ser julgado em maio deste ano. Ele proferiu seu voto na ocasião e, após ser seguido pelo ministro Luiz Fux, o julgamento foi adiado por um pedido de vista do ministro Dias Toffoli.

Os processos passaram a ser julgados conjuntamente porque, antes de proferir seu voto na matéria, o ministro Dias Toffoli lembrou que havia pedido vista em um deles, sob relatoria do ministro Marco Aurélio. Com informações da Assessoria de Imprensa do Supremo tribunal Federal.

REs 556.520 e 627.106

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