Perdido de vista

Ellen se foi sem julgar honorários em precatórios

Autor

13 de agosto de 2011, 8h03

A aposentadoria da ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal, vai protelar ainda mais o julgamento de um Recurso Extraordinário de grande interesse da advocacia e que chegou à corte ainda em 2008: a possibilidade de cobrança de honorários de forma autônoma do pagamento do precatório do cliente. Como a ministra pediu vista, os autos ficam mais um tempo de molho, à espera que a presidente Dilma Rousseff indique um substituto para Ellen no Supremo.

A controvérsia que aguarda pela decisão da corte foi levada ao Supremo pelo estado do Rio de Grande do Sul e diz respeito à aplicação ao artigo 100, parágrafo 4º, da Constituição Federal e também ao regime de funcionamento da chamada Requisição de Pequeno Valor, que obriga a Administração Pública a pagar os honorários em até 60 dias após seu recebimento.

Enquanto entidades de classe — como a Ordem dos Advogados do Brasil paulista e a Associação dos Advogados de São Paulo — entendem como legítima a cobrança dos honorários de sucumbência, fixada ainda na sentença, por meio da requisição autônoma de pequeno valor, o estado vê a prática como inconstitucional, já que violaria o artigo 3º, parágrafo 4º, da Constituição Federal.

O advogado Marco Antonio Innocenti, que é vice-presidente da Comissão de Dívida Pública da OAB-SP, explicou a controvérsia no pedido de ingresso como amicus curiae da entidade, em 2008. De acordo com ele, o estado argumenta que “embora os honorários pertencentes ao advogado pudessem ensejar execução autônoma, o valor correspondente, no entanto, não poderia ser considerado separadamente do crédito principal quando a soma de ambos superasse o limite previsto no parágrafo 3º do artigo 100 da Constituição Federal, razão pela qual os honorários deveriam ser também requisitados pelo regime dos precatórios”.

Apesar da demora para o desfecho do assunto, Innocenti acredita em uma decisão positiva para a advocacia. “É impossível que uma pessoa trabalhe hoje e vá receber por esse trabalho 20 anos depois”, argumenta. “A sorte do advogado não pode estar atrelada à sorte do cliente”, frisa inocente. “A questão não pode ser resolvida de outra forma. O sistema está predisposto a dar calote na dívida e a remuneração é essencial para o advogado”.

O caso está parado desde dezembro de 2008, quando votaram a favor da cobrança em separado os ministros Eros Grau, Menezes Direito, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Carlos Britto. Na mesma ocasião, Ellen pediu vista dos autos e o ministro Cezar Peluso, indo na contramão do que diz Innocenti, se apresentou contrário à proposta, sob o argumento de que seria inconcebível que um advogado recebesse os honorários antes mesmo que o dono do precatório visse a cor do dinheiro.

O assunto teve sua repercussão geral reconhecida em dezembro de 2007, logo que a ação chegou à corte. Por isso, uma decisão terá natureza vinculante, afetando diversos processos, com a mesma tese, que tramitam pelo Brasil.

Quem segue quem
Enquanto que para o Rio Grande do Sul a verba acessória segue a principal, para o presidente da OAB fluminense, Wadih Damous, os honorários de sucumbência são autônomos. Ou seja, podem, sim, ser cobrados antes mesmo que o credor do precatório tenha seu direito atendido.

O próprio Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei 8.906/1994) prevê a cobrança dissociada dos dois valores. De acordo com o artigo 23, “os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor”. Em outras palavras: cabe ao advogado analisar se quer ou não quer receber a quantia, por meio da RPV.

No julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, o Supremo foi contra o entendimento da OAB sobre a matéria. Na ocasião, a corte julgou inconstitucional o parágrafo 3º do artigo 24 do estatuto, segundo o qual “é nula qualquer disposição, cláusula, regulamento ou convenção individual ou coletiva que retire do advogado o direito ao recebimento dos honorários de sucumbência”.

Por unanimidade, os ministros julgaram este dispositivo inconstitucional, dando interpretação conforme a Constituição Federal. Eles seguiram o voto do ministro Maurício Corrêa, segundo o qual o advogado da parte vencedora poderá negociar a verba honorária de sucumbência com seu constituinte, já que se trataria de direito disponível.

Innocenti, por sua vez, alega que os honorários têm natureza remuneratória, “podendo ser destacados do crédito principal e executados de forma autônoma, em outro processo ou nos mesmos autos em que fixados, faculdade que assiste somente aos advogados”.

É da mesma opinião o presidente da OAB-RJ. De acordo com ele, as verbas desse tipo consistem em direito autônomo, já que titularizadas por pessoa diversa daquela credora do valor principal. “Se o credor é diverso, o débito também o será, e a separação das verbas não constituirá fracionamento”.

Carlos Toffoli, presidente do Movimento dos Advogados em defesa dos Credores do Poder Público, conta que o Tribunal de Justiça de São Paulo vem respeitando a fila preferencial criada pela Emenda Constitucional 62. Por isso, qualquer advogado, sendo pessoa física e tendo mais de 60 anos, pode entrar na espera para receber o precatório, como qualquer outro credor. É isso que muitos advogados vêm fazendo.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!