Falência fraudulenta

Justiça bloqueia R$ 70 milhões do Banco Rural

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12 de agosto de 2011, 9h38

A Justiça do Rio de Janeiro determinou o bloqueio de R$ 70,3 milhões do Banco Rural e da Investprev, braço de seguros e previdência do Grupo Rural. As empresas foram beneficiadas num processo fraudulento de liquidação do Banco GNPP, decretada pelo Banco Central em 1996. A sentença foi dada pela 2ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, depois de ação revocatória impetrada pelos credores da massa falida do GNPP, contra uma compra de ações.

O banco teve sua liquidação decretada pelo BC em outubro de 2003, em um processo iniciado em 96, depois de problemas de liquidez que impediam o GNPP de pagar suas dívidas. Consta nos autos que a empresa chegou a um passivo de quase R$ 92 milhões, mas não tinha dinheiro em caixa para pagar nem 50% dos credores.

A fraude foi detectada durante o processo de liquidação dos bens do GNPP. Foi constatado que, em 1994, sem dinheiro para saldar as dívidas, o banco comprou o GNPP Provida Seguradora por 2,3 bilhões de cruzeiros reais, dos quais 1,6 bilhão foi em troca de ações. Pela correção monetária, com inflação e juros, o valor foi transformado em R$ 65 milhões.

O problema é que as duas companhias pertenciam ao mesmo grupo econômico, e o que aconteceu foi apenas uma transferência de dinheiro entre acionistas. Ou seja, sem liquidez, o GNPP deixou de pagar seus credores para repassar o dinheiro que restava a seus controladores, em troca de ações de uma empresa quebrada. Os acionistas, portanto, mesmo com a falência do banco, receberam a parte que lhes cabia. Os credores, não.

A movimentação foi considerada fraudulenta pela Vara Empresarial do Rio, e então foi determinado o bloqueio dos R$ 65 milhões, além do reconhecimento da ilegalidade da compra. Quando a Justiça pediu que a GNPP Provida apresentasse os bens a penhora, viu-se que a companhia já não tinha mais dinheiro, pois tudo havia sido repassado aos acionistas. E é aí que entra o Grupo Rural.

Alvo da ação
O maior beneficiário dessa operação é a RS Previdência, dona da maior parte das ações do GNPP Provida. No processo administrativo de liquidação do GNPP, descobriu-se que a RS faz parte do Grupo Rural. Quando a Justiça determinou a penhora online (em conta corrente) da RS Previdência, viu que os controladores não tinham mais do que R$ 90 mil em caixa. Segundo a juíza do caso, Marcia de Carvalho, o patrimônio da RS foi "dolosamente esvaziado com a transferência milionária de clientes para a Investprev, em flagrante prejuízo aos credores da massa falida do Banco GNPP".

Em 2002, um ano antes da falência do GNPP, o Banco Rural transferiu toda a operação de crédito consignado da RS Previdência à RS Crédito, recém-criada, e depois incorporou essa nova empresa às suas operações. Anos depois, em 2007, foi a vez da carteira de previdência complementar, de quase 100 mil clientes, bem como todos os ativos, que valiam cerca de R$ 40 milhões. Tudo isso foi transferido à Investprev, do Grupo Rural.

O que chamou atenção, no caso, foi o fato de o Banco Rural, a Investprev e a RS Previdência estarem sediadas no mesmo endereço, na Rua Rio de Janeiro, em Minas Gerais, e serem chefiadas pela mesma pessoa: Kátia Rabelo.

Ela é uma das administradoras do GNPP Previdência Privada, acionista administradora da Investprev e diretora-presidente da RS. Também foi constatado que o GNPP Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários é do mesmo grupo da RS Previdência. Todas essas informações foram buscadas pela Justiça junto à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e aos sites da Serasa, da Federação Nacional de Empresas de Seguro (Fenaseg) e das próprias companhias.

Com base nas informações coletadas pela Justiça, a juíza Marcia deu a sentença: "Toda essa prova exaustiva seria desnecessária diante do estarrecedor despudor dos impugnantes Investprev e Banco Rural, que confessam, com todas as letras, que perpetraram a fraude a credores e a execução, o que não só constitui ilícito civil, mas também penal, tipificado no artigo 179 do Código Penal. A justificativa de que a fraude foi perpetrada em favor dos associados da RS Previdência dispensa comentários, por agredir não só a inteligência alheia, mas também a dignidade humana dos milhares de credores da massa falida [do GNPP]."

Direito de defesa
Em nota enviada à ConJur nesta quinta-feira (11/9), o Banco Rural afirmou que vai recorrer da sentença que bloqueou seus bens. Alega que a transferência dos ativos da RS foram transferidos para a Investprev legalmente, e devidamente aprovados pela Superintendência de Seguros Privados (Susep).

O Banco ainda conta que, quando a juíza considerou a compra da GNPP Provida ilegal, ordenou que o valor do negócio fosse bloqueado. O Rural, na posição de acionista, recorreu ao Tribunal de Justiça do Rio, alegando não ter sido ouvido, o que desrespeitou seu direito de defesa. O TJ, então, concedeu o recurso em caráter liminar, em respeito à presunção de inocência do réu.

No comunicado, o Rural diz não concordar com o novo bloqueio, justamente porque o caso ainda está sendo julgado na segunda instância. De todo modo, o TJ já recebeu parecer do Ministério Público pedindo penhora dos bens do banco e o pagamento das dívidas. Segundo o relator do caso no TJ, a suposta fraude na compra da GNPP Provida pelo GNPP é "digna de figurar em livros acadêmicos, como exemplo de ato fraudulento".

Clique aqui para ler a sentença.

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