Decisão administrativa

Falta de pagamento de precatório não é crime

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3 de agosto de 2011, 9h49

Apesar de a proposta de arquivamento de inquérito policial só poder vir do Ministério Público, não podendo ser feita por iniciativa do juiz, se o julgador, ao analisar o processo, vir que não existe tipicidade penal nos fatos apurados, pode reconhecer o constrangimento ilegal dos investigados. Assim entendeu o ministro Celso de Mello em liminar concedida nesta segunda-feira (1º/8) em favor de ex-prefeito do interior do Paraná. Segundo o ministro, nesse caso, a concessão de Habeas Corpus para trancar o inquérito pode ser feita ex officio, ou seja, sem que qualquer parte peça.

Ex-prefeito de Itaperuçu (PR), José de Carlos França estava sendo investigado por crime de desobediência, devido à não inclusão de pagamento de precatório no orçamento municipal. O Inquérito Policial 2009.04.00.007012-1/PR era conduzido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que determinou o arquivamento do procedimento. O Ministério Público Federal recorreu ao Superior Tribunal de Justiça.

Ao julgar o Recurso Especial 1.177.681 contrário ao ex-prefeito, o ministro Felix Fischer, relator do caso no STJ, afirmou que "nenhum inquérito é de ser arquivado sem o expresso requerimento ministerial público", já que o órgão tem a "titularidade privativa da persecução penal".

Para o ministro Celso de Mello, no entanto, decisão de presidente de tribunal ordenando o pagamento de precatório é meramente administrativa, não havendo o necessário "elemento essencial do tipo" penal para caracterizar o crime de desobediência, em caso de descumprimento. Segundo a liminar, esse raciocínio tira a justa causa para a abertura da investigação criminal. 

Embora concorde que cabe apenas ao MP a condução da Ação Penal, o ministro atendeu ao pedido da Defensoria Pública da União, que representou o ex-prefeito. O órgão alegou que o STJ permitiu a reabertura de inquérito em torno de fato sem tipicidade, o que causaria constrangimento indevido.

"Pode o magistrado, se eventualmente vislumbrar, em determinado procedimento persecutório, a ausência de tipicidade penal dos fatos investigados, reconhecer a configuração de injusto constrangimento e, em consequência, exercendo o poder-dever que lhe confere o ordenamento positivo, conceder, ex officio, ordem de Habeas Corpus em favor daquele que sofre ilegal coação por parte do Estado", disse o ministro. A previsão está no artigo 654, parágrafo 2º, do Código de Processo Penal.

Para Celso de Mello, só haveria de fato crime de desobediência se o então chefe do Executivo tivesse ignorado uma ordem jurisdicional, e não administrativa, como a de pagamento de precatórios. "A atribuição do presidente do tribunal, ao processar o precatório, não é sequer jurisdicional. É atividade puramente administrativa", citou o ministro ao lembrar jurisprudência do próprio Supremo. "A atividade jurisdicional termina com a expedição do precatório."

HC 106.124
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