Letras jurídicas

O Direito de Família e as uniões homoafetivas

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18 de abril de 2011, 7h35

Spacca
Robson Pereira - Coluna - Spacca - SpaccaA expressão homoafetividade apareceu pela primeira vez em 2000, no livro União homossexual, o preconceito e a Justiça, da advogada Maria Berenice Dias. Ainda não chegou aos dicionários, mas está presente nas disputas judiciais relacionadas à união estável e duradoura de duas pessoas, não importa a orientação sexual dos parceiros. Pouco mais de uma década depois, a autora não precisa mais explicar o significado e o alcance do termo cunhado por ela, mas o empenho continua o mesmo na batalha para que a legislação brasileira inclua, definitivamente, as uniões homoafetivas no âmbito do Direito das Famílias.

Não é fácil, mas Maria Berenice Dias está acostumada com os desafios. Foi a primeira mulher a ingressar na magistratura gaúcha e também a primeira desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Depois de 35 anos julgando, aposentou-se e abriu o primeiro escritório especializado em Direito Homoafetivo do país. É autora de vários livros, o mais recente, Diversidade Sexual e Direito Homoafetivo, lançado este mês.

A obra reúne estudos e análises de outros 25 autores, todos com sólida atuação na área e com um mesmo objetivo: contribuir para a inserção dos direitos de pessoas com diferentes opções sexuais – lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis e transgêneros – no sistema jurídico brasileiro. Responsável pela apresentação do livro, Rodrigo da Cunha Pereira, presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) e autor de Princípios Fundamentais Norteadores do Direito de Família, chama a atenção para o “pluralismo de modalidades familiares” hoje existente, destacando, entre os arranjos familiares, a união entre pessoas do mesmo sexo, as famílias monoparentais, binucleares e unipessoais, além daquelas decorrentes da parentalidade socioafetiva, inseminações artificiais e útero de substituição.

“A lista é grande e estamos tentando achar a melhor maneira de adaptar essas formas a uma nova realidade jurídica”, diz o especialista. O livro analisa os possíveis modelos de enquadramento jurídico das uniões homoafetivas e toca em um ponto que se destaca não só pela importância no arcabouço jurídico brasileiro, mas também pela indisfarçável atualidade: a defesa pelo reconhecimento das relações homoafetivas como uma célula familiar constitucionalmente protegida.

Só este ano o tema apareceu três vezes na agenda de julgamentos do Superior Tribunal de Justiça, a última delas no dia 7, em um processo que discutia a possibilidade de reconhecimento pós-morte da união estável entre um casal homossexual, com reflexos na divisão dos bens formados ao longo de quase 20 anos de união. O ministro Sidnei Beneti afastou o reconhecimento da união estável homossexual, mas admitiu a sociedade de fato – gerando direitos obrigacionais, mas não de família – e a partilha patrimonial em 50%. A sessão foi suspensa por um pedido de vista, que deverá perdurar até que a 2ª Seção do STJ, formada pela 3ª e 4ª Turmas, decida a questão e uniformize o pensamento do Tribunal sobre chamada população LGBT.

Uma decisão diferente da que foi tomada pelo ministro Beneti representaria a conquista mais importante até agora na luta pelos direitos dos homossexuais, pois significaria, pela primeira vez no Brasil, equiparar judicialmente o relacionamento estável de pessoas do mesmo sexo ao casamento entre homem e mulher, com consequências diretas em diversas áreas do Direito de Família. “Seria uma revolução nos direitos dos homossexuais no País”, admite Maria Berenice Dias. O tempo dirá. 


Bibliografia recomendada

1. Diversidade Sexual e Direito Homoafetivo
Maria Berenice Dias – 1ª Edição, 2011 – 576 páginas.
São 26 autores reunidos em torno de um mesmo objetivo: a inserção dos direitos de pessoas com diferentes opções sexuais no sistema jurídico brasileiro. Os textos podem ser lidos de forma independente, sem a preocupação com a ordem em que aparecem no livro.

2. Princípios Fundamentais Norteadores do Direito de Família
Rodrigo da Cunha Pereira – 1ª Edição, 2010 – 232 páginas.
São sete os princípios analisados no livro: monogamia, melhor interesse da criança e do adolescente, igualdade e respeito às diferenças, menor intervenção estatal, pluralidade de famílias, afetividade e dignidade humana.

3. Direito das Pessoas e das Famílias – Doutrina e Jurisprudência
Moacir César Pena Jr. – 1ª Edição, 2008 – 408 páginas.
Sob o fio condutor da ética e do afeto, o autor examina o novo direito de família, enfrentando novas e velhas questões, como a união estável, o regime de bens e a união entre pessoas do mesmo sexo.

4. Código das Famílias Comentado
Leonardo Barreto Moreira Alves – 1ª Edição, 2010 – 784 páginas.
Um time de especialistas aborda todo o arcabouço legal relacionado ao Direito de Família e analisa o projeto de lei que propõe a revisão e uma grande reforma em todo o sistema jurídico brasileiro relativo à família.

5. Princípios Constitucionais de Direito de Família
Guilherme Calmon Nogueira da Gama – 1ª Edição, 2008 – 304 páginas.
As transformações ocorridas nas relações políticas, sociais, econômicas, entre outras, repercutiram no universo da família contemporânea. O autor mostra a evolução do tema, a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988.

6. Direito da Família
Sílvio de Salvo Venosa – 10ª Edição, 2010 – 520 páginas.
Duas décadas e meia de experiência como magistrado e mais de uma dezena de livros publicados dão ao autor elementos de sobra para contrapor o texto legal às mais recentes posições doutrinárias e jurisprudenciais desse ramo do Direito Civil.


Dica de leitura

1. STJ dá passo para reconhecer união homoafetiva
Rodrigo Haidar – texto publicado na Conjur em 23 de agosto de 2010
O correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília relaciona as vitórias que os casais homossexuais têm obtido nos últimos anos no Superior Tribunal de Justiça.

2. Direito Homoafetivo
Portal que atua com uma rede de informações para a população LGBT, mostrando o progresso do direito à livre orientação sexual nos tribunais de todo o país.

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