Prova da parcialidade

CNJ mantém punição a juíza por beneficiar empresário

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12 de abril de 2011, 17h44

As decisões do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul que puniram a juíza Maria Elisabeth Weiler, da cidade de Anaurilândia, com disponibilidade e, depois, com aposentadoria compulsória, estão fundadas em amplo acervo de provas das ilegalidades cometidas por ela no exercício do cargo. Esse foi o fundamento da decisão tomada nesta terça-feira (12/4), por unanimidade, pelo Conselho Nacional de Justiça.

Com base no voto do conselheiro José Adonis, relator do caso, os integrantes do órgão rejeitaram pedido de revisão disciplinar feito pela juíza ao CNJ. Entre as irregularidades que culminaram com a punição da magistrada está a de ferir o dever de ser imparcial ao julgar diversos processos em favor do empresário Luiz Eduardo Bottura — que acumula mais de 200 condenações por litigância de má-fé em centenas de ações que move contra desafetos e respectivos advogados, ou nas quais responde na Justiça.

A juíza contestou duas decisões do TJ de Mato Grosso do Sul. Em uma delas, Margarida Weiler foi punida, entre outras irregularidades, por nomear seu companheiro, o advogado Eduardo Garcia Silveira Neto, para a função de juiz leigo na comarca em que atuava. Outra irregularidade, de acordo com os autos, foi cometida pela juíza ao pedir autorização para uma viagem à cidade de Dourados, mas, movida por vingança, ter ido para São Paulo acompanhar a prisão de um ex-companheiro.

Depois da viagem, ainda segundo o processo, a juíza fez questão de exibir um vídeo da prisão do ex-companheiro para os servidores do fórum. “A exibição do vídeo da prisão de seu ex-companheiro reforça a ideia de vingança, não condizente com a sua condição de magistrada”, anotou o conselheiro José Adonis.

No outro processo administrativo, Margarida Weiler foi punida por se associar ao empresário Luiz Eduardo Bottura, que movia sistematicamente ações contra desafetos na comarca de Anaurilândia, e “permitir ao autor das demandas vantagens patrimoniais ilícitas”.

Para o relator do processo no CNJ, com base nas provas colhidas nas ações disciplinares contra a juíza, fica “evidenciada a parcialidade de sua atuação”. Constam dos autos os depoimentos de três servidores que “atestaram a prioridade de tratamento dispensado a Eduardo Bottura pela juíza”.

Indústria de processos
Em janeiro de 2009, a revista Consultor Jurídico publicou reportagem na qual revelou que, de 600 processos que tramitavam no Juizado Especial da comarca de Anaurilândia na ocasião, um quarto havia sido ajuizado por Bottura. O empresário também era autor de outras 35 ações em andamento na Vara Única local.

Desde novembro de 2007, quando entrou com a primeira ação na cidade contra o ex-sogro, Adalberto Bueno Netto, e a ex-mulher, Patrícia Bueno Netto, o empresário acumula vitórias judiciais em primeira instância — e derrotas em segunda. Somente contra Patrícia e Adalberto, eram mais de 50 ações.

Em pouco menos de um ano, a juíza Margarida acolheu e deu andamento a mais de 200 processos ajuizados por Bottura. No primeiro deles, uma Medida Cautelar de Alimentos e Arrolamento de Bens proposta em 7 de novembro de 2007, sem ouvir a parte contrária na ação, a juíza fixou pensão de R$ 100 mil em favor de Bottura — que deveria ser paga pelo ex-sogro.

Também mandou apreender diversos bens na casa e no escritório de Bueno Netto, que fica em São Paulo, e determinou a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico do ex-sogro e da ex-mulher do empresário, e dos familiares e empresas deles.

No processo julgado nesta terça-feira no CNJ, o conselheiro José Adônis incluiu entre as provas de parcialidade da juíza a ementa de uma decisão do TJ de Mato Grosso do Sul que, ao cassar determinação de Margarida Weiler, anota o estranho fato de a magistrada determinar diligências em inquérito policial instaurado em cidade fora de sua competência e perpetrar verdadeira devassa nos dados de desafetos de Bottura, baseada apenas na palavra do empresário.

“Revela-se abusiva e precipitada a decisão judicial que, no inquérito policial instaurado em foro estranho aos fatos, determina, inaudita altera pars, a realização de inúmeras diligências invasivas em outras jurisdições, em detrimento de dezenas de pessoas físicas e jurídicas, calcada em informações unilaterais de pretensa vítima, profissional do ramo da internet, que possui em seu desfavor ou das suas empresas muitos processos cíveis e criminais, em estados e comarcas diversas da federação”, registrou a decisão citada por Adonis.

Ao rejeitar o pedido da juíza feito ao CNJ, o conselheiro José Adonis afirmou que o processo de revisão disciplinar não pode ser usado para reavaliar a prova produzida na corregedoria competente para apurar os fatos — no caso, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. “A revisão disciplinar não se destina a proporcionar novo julgamento substituto do anterior, com reapreciação de todo o acervo probatório”, concluiu.

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