Segunda leitura

O gerenciamento dos processos no TJ-SP, a novidade

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

3 de abril de 2011, 8h22

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No dia 24 de março passado, o TJ de São Paulo baixou a Resolução 542, de 2011. O ato administrativo passou despercebido, mas influenciará diretamente a vida de muitos que procuram a Justiça e também, por reflexo, outros tribunais brasileiros.

A Resolução, no preâmbulo, “estabelece medidas necessárias ao julgamento de processos anteriores ao ano de 2006, para atendimento das metas prioritárias fixadas pelo Conselho Nacional de Justiça, em especial a Meta 2, e determina outras providências”.

A gestão dos processos na primeira instância sempre foi assunto recorrente. Mas nos tribunais as medidas tomadas têm sido de aumentar o número de cargos e realizar mutirões, convocando-se juízes de primeira instância. Entretanto, o problema vai além do atraso. Passa, entre outras coisas, pela gestão administrativa dos gabinetes de desembargadores.

Nos Estados Unidos, onde a mora judicial é menor, a matéria é estudada há pelo menos 40 anos. O “Federal Judicial Center” editou, em 1988, o livro Managing Appeals in Federal Courts, com 825 páginas de busca de soluções.

No Brasil, estamos na primeira fase, qual seja, a de conscientizar todos de que os tempos mudaram. É impossível persistir no sistema antigo, em que um desembargador recebia 12 processos por semana, lia-os atentamente em sua casa, preparava o voto e, em um dia previamente marcado, levava os recursos a julgamento. Discutiam-se as teses longa e profundamente, com citações de doutrina e jurisprudência.

Agora é diferente. O volume de processos multiplicou-se e a cobrança é muito maior. Todos têm pressa. A informática e o celular criaram escravos de compromissos que não acabam. Adaptar-se ao processo eletrônico é um tormento para que os que passaram dos cinquenta.

Mas não adianta filosofar se é bom ou ruim. É assim e ponto. É mudar ou sucumbir. Sempre tentando conciliar o desafio de julgar bem e em tempo razoável.
Aí é que entra a Resolução 542 do TJ de SP. Pela primeira vez na história do Poder Judiciário brasileiro fixam-se metas de rendimento de desembargadores e sanções aos que as descumprirem.

Antes da análise é preciso que se diga que no Brasil cada tribunal é um órgão autônomo e com regras próprias. Mesmo nos TRFs, que são apenas cinco e têm o CJF que os uniformiza, além do número de processos distribuídos ser muito diferente, poderá haver mais ou menos cargos em comissão no gabinete de cada desembargador, privilegiando-se mais ou menos a área judicial sobre a administrativa. E isto pode tornar diversos os resultados.

Nos tribunais estaduais a diferença é maior. São cortes que, até a instalação do CNJ, viveram isoladas por mais de um século e que desenvolveram técnicas administrativas próprias. Por exemplo, em um TJ, o gabinete do desembargador pode ter dois cargos em comissão e três servidores de carreira. Em outro, podem existir até 18 cargos em comissão. Óbvio que, em tese, os resultados serão diferentes. Isto sem falar na distribuição, que nos estados pouco populosos é mínima. Ainda, se a Justiça de primeira instância funcionar bem haverá muitos recursos, mas se for desestruturada, pouquíssimos.

Abstraídas estas particularidades e todas outras que possam existir, o fato é que nos tribunais há desembargadores que produzem mais e outros menos. Em princípio, nada de errado nisto. É da natureza humana. Uns são rápidos, outros mais lentos.
Só que, por vezes, mesmo consideradas as particularidades pessoais, surgem diferenças sem justificativa. Suponha-se que, distribuídos 200 processos por mês a cada desembargador de um tribunal com 15 membros, com competência idêntica, três estão zerados, oito possuem um acervo de 200 processos, e quatro estão com mais de mil conclusos. Alguma coisa está errada.

Um desembargador que atinge um número extremamente excessivo de processos pendentes de julgamento, inadequado, fora dos parâmetros, certamente está em uma destas situações: a) é trabalhador, mas não utiliza a tecnologia disponível (v.g., assinatura eletrônica); b) é centralizador e detalhista, impedindo que os processos fluam normalmente; c) não se dedica ao trabalho.

Pois bem. A Resolução 472 aponta soluções inteligentes para estes casos extremos. Primeiro, manda que se redistribuam os processos da Meta 2 (até 2006) aos desembargadores que estão em dia. Estes não serão prejudicados por terem sido mais rápidos (ou mais trabalhadores), pois terão suspensa a distribuição até que haja compensação. Por suas vez, os retardatários, ao livrarem-se dos processos antigos, receberão três novos para cada um que mandarem aos seus colegas.

Além disso, os processos antigos ainda existentes (Meta 2) deverão ser julgados em 120 dias, sob pena de apuração da responsabilidade disciplinar. Da mesma forma, serão responsabilizados os que tiverem produtividade igual ou inferior a 70% da média. Ainda, os que forem professores terão reexaminadas as autorizações para docência, ou seja, serão lembrados de que a magistratura é a atividade principal.

A Resolução 542, por si só, não será a solução para todos os problemas da morosidade da Justiça paulista. Porém, ela tem a grande virtude de pôr um basta na tradição de tolerância que sempre existiu em relação aos atrasos nos tribunais. Enfrentar os problemas é o primeiro grande passo de um administrador judicial.

Finalmente, registre-se que no último dia 31 de março, o CNJ divulgou as estatísticas do cumprimento das metas do Judiciário. Nelas se encontram (p. 65) os índices de cumprimento dos processos da Meta 2. O TJ-RR atingiu o mais alto percentual (99,04%), e o TJ-RN o menor (9,42%). Entre os grandes tribunais (mais de 100 desembargadores), o TJ-RS teve o melhor índice (62,45%), o TJ-MG o mais baixo (24,74%), tendo o TJ-SP ficado na média (43,69%).

Em suma, a Resolução 542 é um passo nas tentativas sérias de aprimorar-se o sistema judicial. Certamente dará bons resultados.

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