Norma extinta

STJ ainda discute casos com base na Lei de Imprensa

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27 de setembro de 2010, 15h20

Apesar de extinta do ordenamento jurídico brasileiro, a Lei de Imprensa (Lei 5.520/1967) ainda serve de base para muitas decisões judiciais. Frequentemente, o destino e o tratamento dos recursos nessas ações são discutidos pelo Superior Tribunal de Justiça. Em seus julgamentos, o STJ evita que acórdãos impugnados sobrevivam com base na lei e que decisões com outros fundamentos sejam anuladas.

A Lei de Imprensa deixou de produzir efeito após a promulgação da Constituição Federal de 1988, segundo entendimento do STF durante o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 130/DF, em abril de 2009. A lei pré-constitucional não recepcionada em julgamento de ADPF não está sujeita à regra da modulação temporal de efeitos. É como se ela nunca tivesse existido.

Na falta de lei específica sobre o tema, os ministros utilizam a legislação civil e a própria Constituição para julgar casos de supostos abusos da liberdade de informação.

As situações jurídicas
De acordo com a ministra Nancy Andrighi, há quatro situações entre os processos em trâmite no STJ que tem relação com a Lei de Imprensa. Quando a lei é utilizada como fundamento do acórdão e o recurso discute a aplicação e a interpretação da lei, o STJ tem anulado o acórdão e devolvido o processo à origem para que outro seja proferido, sem a aplicação da lei não recepcionada.

Em outros casos, a lei é aplicada e o recurso pede seu afastamento. Logo, a anulação não é necessária. Segundo a ministra, na maioria desses casos, é possível o julgamento do recurso porque a impossibilidade de aplicação da Lei de Imprensa já foi debatida no processo. Com isso, o STF reforma o acórdão. Uma solução diferente pode ser adotada, em razão das peculiaridades de cada caso.

A terceira situação trata da não aplicação da Lei de Imprensa no acórdão e o recurso pede sua incidência. Nessas hipóteses, em geral, o recurso não é conhecido porque invoca aplicação de lei inválida.

A quarta situação é também a mais complexa, com acórdão e recurso com duplo fundamento: na lei civil e na Lei de Imprensa. Se o duplo fundamento se referir ao mesmo tema e o recurso tratar apenas da Lei de Imprensa, aplica-se a Súmula 283 e mantém-se o acórdão. Segundo a súmula “é inadmissível recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles”.

Quando o duplo fundamento se refere ao mesmo tema e só a parcela da legislação civil for questionada, o recurso é conhecido para discussão dessa parcela. Mas, se o duplo fundamento trata de temas diversos, aprecia-se a questão caso a caso. O acórdão só será anulado se a aplicação da Lei de Imprensa, contestada pela parte, comprometer o julgamento por completo devido à manutenção de acórdão fundado em lei não recepcionada.

Casos concretos
O STF manteve a decisão da Justiça de Mato Grosso que condenou a Televisão Bororos a pagar R$ 30 mil de indenização por danos morais a um homem prejudicado pela veiculação de uma notícia falsa. Segundo os autos, um programa policial informou, equivocadamente, que ele era procurado pela polícia por ter praticado três homicídios. No recurso, a emissora pediu a redução da condenação com base no artigo 53, inciso III, da Lei de Imprensa, porque se retratara da notícia no dia seguinte. Como essa lei não foi aplicada no acórdão, a 3ª Turma negou o recurso.

Em outro recurso, a TV Globo pediu a anulação de sua condenação por danos morais. A indenização de cem salários mínimos é devida a uma fábrica de palmito que teve seu produto apresentado como impróprio para consumo. Foi provado que a informação era inverídica. A decisão judicial que condenou a emissora teve fundamento na Lei de Imprensa e na Constituição. Como a recorrente não ajuizou Recurso Extraordinário para que o STF avaliasse a questão constitucional, e a lei invocada é inválida, o ministro Sidnei Beneti não admitiu o recurso, com base na Súmula 283.

A Lei de Imprensa também foi invocada em Recurso Especial do jornalista Orlando Duarte contra acórdão do TJ-SP. Ele foi condenado a pagar indenização por danos morais de 200 salários mínimos ao jornalista Juca Kfouri, em razão de expressões injuriosas ditas em programa de rádio. No recurso, Duarte pediu a aplicação do limite indenizatório de cinco salários mínimos previsto na Lei de Imprensa. Citando a decisão do STF na ADPF 130/DF, o ministro Aldir Passarinho Junior afastou a aplicação da lei e negou o pedido. A 4ª Turma acolheu o recurso apenas para converter em reais a indenização fixada em salários mínimos.

O SBT e o apresentador Carlos Massa também recorreram de decisão da Justiça paulista que os condenou a pagar 500 salários mínimos em indenização por danos morais à Igreja Pentecostal Deus é Amor. No caso, a entrevista concedida pela ex-mulher de um membro da igreja teria ultrapassado o campo do interesse público para atingir a esfera individual e a intimidade. A emissora e Massa pediram no recurso a redução da indenização com base no Código Civil e na Lei de Imprensa. O ministro João Otávio de Noronha, sem afastar a aplicação da lei, considerou o valor desproporcional à gravidade da ofensa e reduziu a indenização para o equivalente a 150 salários mínimos, a serem divididos entre os condenados. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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