Críticas públicas

Especialistas criticam reforma do CPC em audiência

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11 de setembro de 2010, 8h49

Antonio Carreta/TJ-SP
Desembargador Bedaque entre os senadores Valter Pereira e Eduardo Suplicy - Antonio Carreta/TJ-SP

A Comissão Especial formada por senadores de reforma do Código do Processo Civil está percorrendo o Brasil para colher sugestões para o projeto. A diferença é que agora já existe um texto para servir de base, o PLS 166/10. Nesta quinta-feira (9/9), os senadores Valter Pereira (PMDB) e Eduardo Suplicy (PT) estiveram em São Paulo para ouvir críticas e sugestões. Desembargadores e advogados alertaram os parlamentares que o principal problema do Judiciário paulista é falta de recursos financeiros e estrutura de trabalho.

No primeiro semestre de 2010, a Comissão de juristas fez audiências públicas por vários estados. O resultado foi apresentado ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB), no começo de junho. Agora com o projeto em mãos quem tiver interesse poderá sugerir alterações e encaminhar propostas por escrito aos senadores. A audiência foi marcada por duras críticas, mas também elogios ao novo projeto.

De acordo com o senador Valter Pereira, “o sucesso das audiências públicas está se revelando principalmente pelas criticas que o projeto está recebendo. São críticas pontuais, embora haja um reconhecimento de que o projeto é um avanço”. O senador rebateu as críticas de que o projeto reduz o número de recursos, o que dificultaria a defesa. “Na parte de recursos tem discussões, alguma omissões que podem estar ocorrendo, mas são defeitos que são plenamente administráveis”, explicou.

Ele afirma ainda que o mais importante é que juristas reconhecidos já disseram que o projeto garante a segurança jurídica, e completa ao dizer que o objetivo é preservar o direito das partes e evitar a procrastinação.

O advogado e professor Cassio Scarpinella Bueno, assessor jurídico da Comissão Especial de Senadores, destacou que com a audiência publica todas opiniões estão sendo ouvidas. “As audiências são o verdadeiro processo democrático legislativo com todos os envolvidos institucionalmente e individualmente. Já não me separo mais do meu volume de anteprojeto”, reforça. O advogado diz também que o projeto ainda presenta “algumas imperfeições aqui e acolá”, mas acredita que serão solucionadas.

Antônio Carreta/TJ-SP
Profª Ada Pellegrini Grinover - Antônio Carreta/TJ-SP

A advogada processualista Ada Pellegrini Grinover foi a primeira a expor suas críticas focadas no ponto do código que trata da conciliação e mediação. De acordo com Ada, a função de conciliador e mediador não deveria estar restrita a advogados, inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil. Ela explica que isso é uma reserva de mercado e pode colocar a perder todo um movimento que vem sendo feito, inclusive pelo Judiciário, para habilitar servidores a atuar como mediadores e conciliadores.

“Eu lembro que o Conselho Nacional de Justiça, em nota técnica, há cerca de cinco anos atrás manifestou-se contra o projeto de lei de mediação judicial em que se previa essa exclusividade do exercício da profissão de advogado para os candidatos a mediadores e conciliadores”, observa. A processualista afirma que esse entendimento não deve prevalecer.

Ainda na mesma questão, a advogada sugeriu a exclusão da ideia de “juiz conciliador”, aquele que irá conduzir os mediadores e conciliadores. Ela diz que esse pressuposto vai contra a ideia científica de conciliação e mediação. Quando muito, os mediadores e conciliadores devem seguir as normas do regimento interno e a lei, mas não a orientação do juiz.

O advogado, juiz do TRE-SP e professor da USP Paulo Henrique dos Santos Lucon destacou que o projeto tem muito mais pontos positivos do que negativos. Entre suas sugestões, destaca que a desconsideração da personalidade jurídica poderia ser também inversa. Quando uma há uma execução afasta-se a pessoa jurídica para executar os bens da pessoa física. O advogado afirma que poderia ser permitido usar os bens da pessoa jurídica em nome dessa pessoa física quando ela não tiver bens para penhorar.

Outro problema que Lucon aponta é a morosidade do Judiciário. “Tenho um caso de apelação que interpus em 1999 e ainda não foi julgados pelo Tribunal de Justiça. Temos um grave problema de demora de efetividade do processo”, lamenta. O advogado também acredita que é necessário alterar causa de pedido e pedido no curso do processo. Para ele, deveria ser até a audiência preliminar, ou seja, o fim da fase postulatória.

Ele também defende que a coisa julgada nas declarações incidentais dependa de iniciativa da parte. “Não pode ser a critério do juiz no momento da sentença, como uma para as partes”, assevera. E no incidente de resolução de demandas repetitivas, ele sugere que exista no próprio código a possibilidade de um recurso caso o juiz aplique o incidente de maneira equivocada.

Quanto à área do código que trata das provas, o advogado Wiliam Santos Ferreira entende que não houve grandes modificações e ela merece uma evolução. Segundo o advogado, no código há um artigo que diz que o interrogatório será feito pelo juiz, porém não há a obrigação de comparecer. “Uma das técnicas mais eficientes de estímulo a cooperação das partes é a pena de confesso. Sem ela, a parte pode não comparecer e o magistrado pode ficar sem a possibilidade de ouvi-lo”, diz.

Ferreira sugere ainda que a fixação dos pontos controvertidos deveria ser proposta pelas partes. E então, o magistrado teria mais informações para julgar. O advogado defende ainda que aquelas pessoas fundamentais para o processo, mas que estejam impedidas ou sejam suspeitas para testemunhar, sejam ouvidas, com a condição de dizer a verdade.

Antonio Carreta/TJ-SP
Desembargador Sidney Romano - Antonio Carreta/TJ-SP

O desembargador Sidney Romano dos Reis também falou das preocupações e vivências dos magistrados paulistas. Sobre o objetivo do novo código de dar mais celeridade ao processo, ele faz uma ressalva sobre o artigo 10 o projeto. Para ele, não altera o feito o contraditório que é concedido antes da decisão de uma causa de extinção de ordem pública, por exemplo.

Ainda sobre a celeridade e a restrição ao uso dos Agravos, o desembargador brinca: “O Tribunal de Justiça de São Paulo foi transformado num tribunal de Agravos”. Para ele, o problema é que com tantos Agravos não é possível julgar os outros recursos. Ele observa ainda que as ações coletivas também precisam de atenção. “Em ação coletiva concedendo uma liminar não sabemos quando será julgada a liminar.”

Antonio Carreta/TJ-SP
Desembargador Décio Notarangeli - Antonio Carreta/TJ-SP

O desembargador Décio Notarangeli também falou sobre celeridade do processo. Ele criticou a maneira como foi abordada a tutela de urgência. Para ele, a forma como funciona a tutela antecipada atualmente deveria ser aproveitada no novo processo. Ele aponta que a sustentação oral dos advogados nos Agravos faz com que o processo demore ainda mais para ser julgado, já que a pauta das Câmaras costuma ser composta por muitos Agravos.

O advogado e professor Antonio Claudio da Costa Machado foi contrário ao novo CPC. Para ele, a falta de vontade política para aparelhar o Poder Judiciário, de capacitação, de motivação e a baixa remuneração do pessoal da Justiça são os verdadeiros problemas. “Não precisamos de um novo CPC”, sentenciou. Machado apontou um dos piores pontos do novo CPC: dá poderes excessivos aos juízes de primeira instância.

O advogado Edson Cosac Bortolai também criticou o desaparelhamento do Poder Judiciário e todas as transformações do código até hoje. “Se apequenou a estrutura e aumentou demais a demanda. Estamos apenas transferindo o congestionamento de um lugar para o outro”, criticou, e sugeriu que as custas do Judiciário seja administrada pelo próprio Judiciário.

O Procurador-Geral do Estado de São Paulo, Marcos Fabio de Oliveira Nusdeo, elogiou a comissão e os trabalhos. E elogiou a iniciativa que reúne ações iguais em uma mesma decisão. Citou como exemplo a decisão do Supremo Tribunal Federal ao analisar a Emenda Constitucional 20. Para ele esses sistemas serão responsáveis no futuro pela diminuição de processos a longo prazo.

Também falaram os advogados Magda Barros Biavaschi; Hélio Rubens Batista Ribeiro; a procuradora do estado Marcia Semer; o vice-presidente da Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp) Arystóbulo Oliveira Freitas; o defensor público Danilo Mendes Silva de Oliveira; o juiz da 14ª Vara Cível de São Paulo Ronnie Herbert Barros Soares; e o desembargador Henrique Nelson Calandra.

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