Eleições com humor

STF libera sátiras e críticas a candidatos em rádio e TV

Autor

2 de setembro de 2010, 20h01

Gervásio Baptista/SCO/STF
Sessão do STF (02/09/2010) - Gervásio Baptista/SCO/STF

 

O Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quinta-feira (2/9) que as emissoras de rádio e televisão podem fazer sátiras com candidatos. Mais do que isso: estão livres para emitir opiniões e fazer críticas a candidaturas mesmo em período eleitoral, inclusive com editoriais.

Para os ministros, não se pode impedir previamente programas jornalísticos e humorísticos de exercer a liberdade de expressão e de criação garantida constitucionalmente. Os casos de abuso devem ser julgados e punidos pela Justiça. A opinião de que é inadmissível a censura legal prévia foi unânime. Houve divergência apenas na forma da decisão.

Por seis votos a três, a maioria decidiu suspender o inciso II e parte do inciso III do artigo 45 da Lei Eleitoral (Lei 9.504/97). O inciso II proibia uso de trucagem, montagem e recursos de áudio e vídeo para ridicularizar candidatos. Já o inciso III vedava o direito de emissoras opinarem sobre candidatos, partidos ou coligações. Por consequência, os parágrafos 4º e 5º do mesmo artigo foram suspensos porque apenas conceituavam trucagem e montagem.

As emissoras de rádio e televisão não foram igualadas aos jornais e revistas porque não podem declarar apoio a candidatos, o que é permitido na imprensa escrita. De acordo com o relator do processo, ministro Ayres Britto, as emissoras têm o direito de criticar e opinar, “contanto que não descambe para a propaganda política”.

O ministro Britto sustentou que se deve admitir o direito de emissoras atuarem além da reprodução factual dos atos das eleições, mas deve-se observar o equilíbrio para que o princípio da paridade de armas. O relator foi acompanhado por Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Ellen Gracie, Celso de Mello e Cezar Peluso.

Os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio votaram pela manutenção das regras, mas deram a chamada interpretação conforme à Constituição. Ou seja, votaram no sentido de afastar a interpretação de que a regra restringia sátiras e críticas.

Liberdade unânime
Nas discussões do processo ficou claro que nenhum dos ministros admite restrições à liberdade de expressão. O ministro Ayres Britto afirmou que essa garantia constitucional é tão importante que sua previsão no artigo 5º da Constituição é reforçada no artigo 220. O primeiro dispositivo estabelece que é livre “a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. Já o artigo 220 e seus parágrafos confirmam que “nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social”.

“O que era livre se tornou pleno”, disse Britto. O relator reforçou os argumentos de sua liminar, mas não manteve a interpretação que havia dado ao inciso III. Em seu lugar, os ministros preferiram suspender o trecho da norma que impedia às emissoras emitir opiniões sobre candidatos e críticas.

O ministro afirmou que mesmo que a regra esteja em vigor há 13 anos, o pedido das emissoras demonstra se elas se sentiam constrangidas em fazer humor no período eleitoral. Para Britto, as regras “não apenas restringem, mas censuram o humor em qualquer programa, ainda que esse programa não seja humorístico”.

Em um longo voto, o ministro Dias Toffoli sustentou que as regras nunca impediram as críticas ou sátiras. De acordo com o ministro, o inciso V, por exemplo, permite a atuação jornalística plena ao fixar que é vedado “veicular ou divulgar filmes, novelas, minisséries ou qualquer outro programa com alusão ou crítica a candidato, mesmo que dissimuladamente, exceto programas jornalísticos ou debates políticos”.

Para Toffoli, a exceção que se faz aos programas de jornalismo revela que a crítica sempre foi permitida. Por isso, ele votou por não suspender os artigos. O ministro também demonstrou preocupação com o que poderia acontecer em emissoras do interior do país, onde grande parte delas é de propriedade de políticos. Mas o ministro foi vencido, junto com Lewandowski e Marco Aurélio.

Lewandowski criticou o fato de a ação só ter sido imposta agora, já que a mesma regra está em vigor e é prevista em resoluções do TSE desde 2000. Foi citado em plenário, o caso do jornalista Boris Casoy, da Bandeirantes, que em editorial na TV disse que só poderia relatar fatos e não dar opinião porque a Lei Eleitoral o proibia. Toffoli disse que o jornalista foi mal orientado juridicamente, porque a crítica nunca esteve proibida.

Mas a maioria entendeu que as regras criavam embaraços à imprensa. O ministro Cezar Peluso propôs uma reflexão: “Suponhamos que um candidato inclua em seu programa que deve haver restrições pesadas ao trabalho da imprensa. A imprensa não pode criticar isso?”. Já para Gilmar Mendes, as regras suspensas “se prestam a um efeito inibitório, censório e afrontam uma das funções básicas da liberdade de imprensa que é a de permitir a livre crítica aos poderes públicos”.

O decano do Supremo, Celso de Mello, reforçou a posição dos colegas. Celso afirmou que o riso tem de ser levado a sério porque é uma forma de reação popular a qualquer tentativa de opressão do poder político e econômico. “Trata-se de forma irônica de ridicularizar atitudes condenáveis.”

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!