Novas regras

"Quebra de sigilo escancara fragilidade da Receita"

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8 de outubro de 2010, 7h04

O acesso aleatório a dados fiscais por servidores deve ser combatido com mais rigor para que não prevaleça um estado de medo na sociedade. O alerta é do professor da Faculdade de Direito da USP Heleno Taveira Torres. Segundo ele, a quebra do sigilo fiscal de integrantes do PSDB escancarou a fragilidade da administração da Receita Federal. “É dever do Fisco garantir o controle dos dados sigilosos que ele tem, independentemente do momento político em que estamos.”

Torres, que participa do X Congresso Internacional de Direito Tributário de Pernambuco, se refere à Medida Provisória 507, publicada nesta quarta-feira (6/10) no Diário Oficial, que pune com maior rigor o servidor que viola sigilo fiscal. “Esse acesso aleatório ao banco de dados da Receita deve ser proibido expressamente. Caso contrário, o servidor se torna um ator privilegiado na sociedade, com o poder de ameaçar qualquer contribuinte. Viveríamos em um estado de medo.”

Um dos pontos mais duros da MP é o artigo 2º, que prevê pena de demissão, destituição de cargo em comissão, ou cassação de disponibilidade ou aposentadoria ao servidor público que se utilizar indevidamente do acesso restrito às informações protegidas por sigilo fiscal. Para o professor, a medida de Lula é válida por preservar a garantia constitucional do sigilo fiscal e eliminar o espaço de possibilidades de quebra de um direito fundamental. “A MP pode equilibrar as relações entre o Fisco e o contribuinte, que devem se basear na confiança. Se quem contribui não se sentir seguro, pode até deixar de declarar algum patrimônio.”

Para que isso não aconteça, Torres destacou que a medida deve vir acompanhada de uma mudança na conduta da administração tributária. “É preciso um controle e uma fiscalização efetiva para garantir que esses acessos sejam motivados.”

Viés político
Para a diretora da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF), Ana Claudia Utumi, a medida provisória só repete o que a legislação já apresentava em relação às punições ao servidor da Receita em caso de quebra de sigilo fiscal. “A medida apenas deu uma resposta ao público por conta do escândalo da quebra de sigilo, mas não trouxe nenhuma inovação em relação às medidas punitivas aos servidores.” Para ela, o que vai fazer a diferença é aumentar a fiscalização e tornar as punições existentes efetivas. “A legislação não é aplicada.”

O professor de Direito Tributário da Faculdade de Direito da USP, o advogado Roberto Quiroga Mosquera, também avaliou que a MP tem motivação política. “Ela foi feita com uma rapidez brutal para dar uma satisfação à sociedade.” Ele destacou a necessidade de penas mais pesadas. “É servidor punindo servidor. Mas o funcionário que passar do limite deve ser punido, sem corporativismos.”

Excessos
Mosquera também ressaltou que a MP possui excessos, como a obrigatoriedade de instrumento público para que o contribuinte delegue a outra pessoa o acesso a seus dados fiscais, determinada no artigo 5º. Agora, será preciso apresentar uma procuração feita em cartório para que o advogado do contribuinte tenha acesso às informações fiscais do cliente. “O ideal seria retirar os excessos, pois a procuração é um exagero. A questão que fica é até que ponto essa MP tem credibilidade, uma vez que ela foi assinada em um momento eleitoral”, destacou.

Já o advogado Luiz Roberto Domingo, membro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), afirmou que a MP é mais um cerceamento do exercício da advocacia. “Muitas vezes, não há tempo para que o advogado vá com seu cliente até o cartório para emitir a procuração.” Por outro lado, ele destacou que o sistema de senhas é bom, pois registra quem teve acesso aos dados da Receita e quando esse acesso foi feito. “O sistema poderia registrar também a motivação para o acesso às informações.” De acordo com o artigo 1º da MP, o funcionário que emprestar sua senha de acesso ao cadastro do Imposto de Renda para outra pessoa poderá ser demitido por justa causa.

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