Práticas do Judiciário

Processo-cidadão, um paradigma de Justiça Penal

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25 de março de 2010, 13h16

Paradigmas nada mais são do que padrões psicológicos pelos quais guiamos nossas ações. São mapas internos que utilizamos para navegar na vida. Conseguir resultado diverso fazendo as coisas do mesmo modo afronta a lógica. É curial que para aportar em local diferente o arrais deva mudar seu mapa. O intemerato presidente do Conselho Nacional de Justiça, ministro Gilmar Mendes, enfatizou que este ano o foco estará colocado na Justiça Criminal, que se pretende mais célere, mais efetiva e mais justa. A redução da violência deve passar necessariamente pela efetividade da Justiça Penal.

O presidente da Suprema Corte de Justiça do país está certo. Adicione-se a isso que mais equipamentos e legislação avançada, sem mudança de paradigmas, servem apenas para ilustrar discursos, especar escusas e manter as coisas exatamente como estão. A cultura da morosidade nos julgamentos é uma realidade: serve para dissimular a incompetência, o famoso “jeitinho” ou a corrupção. Práticas cartorárias inúteis compõem essa triste realidade: fazer sem saber o porquê.

O “processo-punição” é mais uma vertente do caos: o acusador age por capricho, interesses subalternos, com a conivência ou a indiferença do juiz. Do “processo-político” nem se fale: a simples existência de uma acusação penal contra um candidato pode alterar por completo o cenário de uma eleição. É preciso arrostar o nefasto cotidiano forense, onde a força do carreirismo suplanta em muito a do trabalho. Portanto, para colocar o processo criminal na perspectiva dos direitos humanos e engendrá-lo como mecanismo da democracia e do bem comum, é preciso um pouco mais. Impõe-se estabelecer novos arquétipos.

Sob esta ótica e incentivo da Corregedora Regional de São Paulo e Mato Grosso do Sul, eminente desembargadora Suzana Camargo, a 7ª Vara Criminal Federal vem inovando. A duração média de um processo criminal na Justiça Federal paulistana, de cinco anos desceu para menos de um nesta Vara. Não foi preciso mudar a lei, nem empregar tecnologias sofisticadas ou aumentar o quadro de funcionários. Nada disso. Bastou diversificar a postura, otimizar práticas. Evoluiu-se para o “processo-cidadão”: maior respeito ao acusado e à sociedade em geral, que passou a contar com uma resposta do Estado mais rápida e menos custosa.

Uma breve idéia da resiliência: ao citar o acusado, no mesmo ato é ele intimado do roteiro completo do processo, inclusive do dia de seu término. Esta singela medida, a par da transparência, reduziu pela metade o gasto com recursos naturais (papel e energia) e desbancou aquelas costumeiras e constrangedoras visitas de Oficiais de Justiça. O processo não deveria servir a isso. Uma mensagem eletrônica alerta a testemunha 48 horas antes da audiência de instrução e julgamento, contribuindo para a sua efetividade.

Diversas outras práticas de extrema simplicidade como essas, sem custo adicional, compõem o conjunto de pequenas alterações introduzidas para reduzir o estoque de processos. O resultado é irretorquível: até 2008 eram 1.300 ações penais em andamento (sem contar procedimentos criminais diversos) contra as atuais 600 ações. Na Capital mais populosa do país, onde se concentra a maior carga de processos e pululam lamúrias, foi possível demonstrar que muito pode ser feito sem qualquer sobrecarga ao bolso do contribuinte, sem a cantilena de novos códigos e leis. Se houver realmente interesse em navegar por outras águas, mais calmas, deve-se primeiro mudar o mapa.

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