Lobos no rebanho

Bens do Banco Santos podem voltar aos condenados

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20 de março de 2010, 7h05

Jeferson Heroico
Veja os condenados que estão na lista de credores, e os respectivos créditos - Jeferson Heroico

A Advocacia-Geral da União quer que os bens apreendidos pelo Ministério Público paulista na ação que corre contra o ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira, dono do falido Banco Santos, fiquem com a Justiça criminal. Na prática, isso faria com que as propriedades, avaliadas em R$ 200 milhões, caíssem nas mãos da União, que poderia destiná-las para onde bem entendesse. Caso isso aconteça, os credores que disputam na Justiça cível os bens para quitação de dívidas, ficariam sem essa possibilidade.

Em parecer entregue ao Supremo Tribunal Federal, a AGU afirma que, embora a Justiça cível analise o processo falimentar do banco, é ao juízo criminal que as propriedades do banqueiro devem ser revertidas, já que os crimes financeiros são de competência da Justiça Federal, onde corre a Ação Penal.

O temor é que os bens voltem às mãos dos condenados, porque alguns deles também figuram entre os credores da massa falida. Um deles é o próprio Edemar, dono de um crédito pessoal de R$ 62 mil, além de outros R$ 216 mil reclamados pela empresa Cid Ferreira Collection Empreendimentos Artísticos, da qual são sócios Rodrigo Rodrigues de Cid Ferreira e Márcia de Maria Costa Cid Ferreira, também condenados. Por isso, a AGU contesta a informação de que na massa falida haja “lesados” pelos crimes.

O parecer, encaminhado ao Supremo Tribunal Federal em janeiro para instruir o julgamento do Recurso Extraordinário, se refere a dois Conflitos de Competência suscitados no Superior Tribunal de Justiça, um pela 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais em São Paulo, que julga a falência do banco, e outro pelo próprio Banco Santos, alvo da Ação Penal movida pelo Ministério Público paulista. Ambos foram julgados em conjunto pelo STJ no ano passado, que deu preferência à falência.

São objetos de desejo os bens apreendidos pelo MP na ação criminal contra o ex-presidente do banco, Edemar Cid Ferreira. A Justiça cível reclama os bens para pagar os credores. A 6ª Vara Federal Criminal paulista, de Fausto Martin De Sanctis, os quer para reverter à União, como frutos de crime, motivo pelo qual a AGU defendeu o juízo criminal.

Obras de arte
Edemar e outros administradores do Banco Santos foram condenados em 2006 pela 6ª Vara, por gestão fraudulenta, formação de quadrilha, evasão de divisas e lavagem de dinheiro. Um ano antes, o juízo criminal já havia determinado o sequestro dos bens. O principal é uma casa de 4 mil m², em um terreno com o dobro da área, no bairro do Morumbi, em São Paulo, que vale R$ 150 milhões. Em 2005, o juiz Fausto Martin De Sanctis, titular da 6ª Vara, havia decidido que a casa deveria virar um museu, já que contém uma rica coleção de obras de arte e objetos de decoração — todos também sequestrados por acusação de serem frutos de crime contra o sistema financeiro. De Sanctis chegou a mandar o banqueiro e sua família deixarem a casa.

A decisão foi suspensa no ano passado pela 2ª Seção do STJ, que considerou que o juízo falimentar deveria ser privilegiado. Para o ministro Massami Uyeda, relator do caso, apesar de o juiz criminal poder decretar a perda dos bens em favor da União, não pode prejudicar “o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé”, como prevê o artigo 91, II, do Código Penal. Em seu voto, Uyeda afirmou que não influencia na decisão o fato de a determinação de sequestro ser anterior ao decreto de falência da empresa.

O Banco Santos ficou sob intervenção do Banco Central desde maio de 2004 até setembro de 2005, quando foi decretada a sua falência. Os ex-administradores do banco argumentam que os ativos superam o passivo apurado. O administrador da massa falida não aceita as contas e insiste ter constatado que o rombo é de mais de R$ 2 bilhões, duas vezes maior do que o total de ativos.

Além da mansão, a Justiça criminal sequestrou também outros sete imóveis em São Paulo, e depósitos em contas bancárias no exterior de Edemar e dos outros administradores do banco, inclusive valores em contas-correntes na Suíça, bloqueadas previamente. Computadores, barras de ouro e até decantadores de vinho fecham a lista que, segundo De Sanctis, estavam em nome de empresas usadas como fachada para dissimular a origem do dinheiro, como Atalanta Participações e Propriedades, Hyles Participações e Empreendimentos, Cid Ferreira Collection Empreendimentos Artísticos e Brasilconnects Cultura.

Na nova tentativa, agora no Supremo, a AGU alega que a decisão do STJ de dar preferêcia aos credores se baseou em pressuposto errado, já que os bens não pertenciam à massa falida do banco. A intenção é fazer com que o STF reforme a decisão do STJ, declarando a competência da 6ª Vara Federal Criminal para dar destino aos bens.

“A competência para definir quem são os lesados é do juízo criminal”, diz o parecer da AGU, que, segundo ela, “identifica a existência ou não de lesados”. Havendo prejudicados com os atos ilícitos dos gestores do banco, a Justiça “restitui os bens a esses; se não há, determina o perdimento em favor da União”.

O problema é que os bens sequestrados não estavam em nome do banco falido. Foi o que De Sanctis afirmou na sentença condenatória. “O sequestro recaiu sobre bens de empresas que não tiveram falência decretada”, o que tornaria a exigência do juízo falimentar uma avocação de atribuição, de acordo com a AGU. As proprietárias são as empresas Atalanta, Hyles, Cid Ferreira Collection e Brasilconnects, que chegaram a ser abrangidas pela extensão da falência. Em 2008, porém, a extensão foi contestada no Tribunal Regional Federal da 3ª Região, e aguarda julgamento de recurso.

Clique aqui para ler o parecer.

CC 76.740
CC 76.861

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