Reforma trabalhista

Flexibilidade e estabilidades são incompatíveis

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13 de março de 2010, 5h27

A reforma trabalhista na França e no Brasil foi tema de seminário na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e organizado pela Academia Nacional de Direito do Trabalho nesta sexta-feira (12/03). O evento celebrou a posse do professor Nelson Mannrich como novo presidente da Academia. No início da palestra, o professor Antoine Jeammaud, da Universidade de Lyon, na França, deu um panorama de como os franceses estão lindando com a modernização de mercado de trabalho.

De acordo com Jeammaud, a flexibilidade organizacional para as empresas e a estabilidade para os trabalhadores são as propostas que mais ganharam força na reforma que está sendo pensada. No entanto, o professor criticou a unificação dessas duas correntes. “Querem uni-las. Mas me parece difícil fazer um balanço entre a aplicação da flexibilidade para as empresas e a estabilidade de recursos dos funcionários.”

Para o francês, tecnicamente, é difícil manter a estabilidade e os benefícios aos trabalhadores com a implantação da flexibilidade. Ele também destacou que esta última tem maior peso entre os reformistas. “A balança está mais para a flexibilidade das empresas do que para a segurança ao trabalhador.”

O professor também falou sobre a evolução das regras trabalhistas e apontou a institucionalização da negociação coletiva como uma das mais importantes para seu país. “Hoje em dia, é impressionante a importância do campo de negociação coletiva que facilita as relações de trabalho, como remuneração, normas públicas e acordos coletivos”, explicou.

Durante a palestra, ele citou mudanças recentes que passaram a integrar a legislação trabalhista francesa: criação do contrato de tempo indeterminado de trabalho, redução da jornada para 35 horas semanais e novos meios de contratar trabalhadores que escapam da proteção das leis. “Desde 2007, a presidência [da França] está com uma visão mais flexível às reformas e avanços”, informou.

Reforma no Brasil
Representando os juristas brasileiros no seminário, estiveram presentes o professor Amauri Mascaro Nascimento, titular em Direito do Trabalho da USP, e o ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Pedro Paulo Teixeira Manus. Mascaro Nascimento defendeu veementemente a reforma do Direito trabalhista brasileiro. “É absolutamente necessária. Nossa sociedade não é mais restritamente industrial, é pós-industrial”, defendeu.

O professor explicou que o vínculo trabalhista ainda é feito da maneira tradicional e mencionou o surgimento de novas relações de trabalho. “A CLT se mantém fiel aos tradicionais patronos do início da industrialização. Outras relações surgiram e ela não pode seguir essas normas”, continuou.

Mascaro Nascimento destacou que a reforma dever ser de âmbito do Direito Individual do Trabalho — que considera os interesses concretos de indivíduos determinados. Para ele é essencial essa “regulamentação da valorização da dignidade humana”. Também sugeriu o fim das regulamentações especiais: “Um contrato coletivo poderia regulamentar as categorias. Assim, a responsabilidade ficaria, do ponto da lei, para o contrato”.

O professor polemizou ao lembrar a regulamentação dos autônomos. “Quando se anda pelo centro da cidade, é fácil encontrar uma grande quantidade de camelôs. É preciso que esses autônomos deixem de ser excluídos. A lei também deve protegê-los. São trabalhadores da sociedade moderna”, ressaltou. Em relação às empresas, lembrou que a microempresa não pode respeitar a mesma regulamentação das de grande porte.

O ministro Pedro Paulo Teixeira Manus fugiu um pouco do tema da reforma. Ele pareceu preocupado em reduzir o número de processos na Justiça trabalhista e ter mais qualidade nas decisões. Para ele, a questão fundamental é a mudança na mentalidade de todos envolvidos com a Justiça do Trabalho. “A reforma é cultural, temos que mudar esse pensamento de recorrer até conseguir uma decisão favorável”, opinou.

Manus afirmou que essa atitude resulta em um número muito alto de processos, o que gera a queda da qualidade e erros de decisões. “Em fevereiro de 2009, o TST contava com 617 processos para cada relator. Neste ano, esse número subiu para 877. É assustador”, disse. O ministro ainda chamou a atenção para a uniformização das jurisprudências nos Tribunais Regionais do Trabalho. “Teremos volumes de processo reduzido e julgamentos com qualidade”, finalizou.

Novo presidente
O Nelson Mannrich tomou posse nesta sexta-feira (12/3) como presidente da Academia Nacional de Direito do Trabalho, substituindo Georgenor de Sousa Franco Filho, que esteve à frente da entidade por dois mandatos, de 2006 a 2010. Durante o discurso de posse, Mannich analisou o cenário atual do trabalho. “Todos reconhecemos que o trabalho é dever e direito. O ritmo de trabalho é intenso e gera estresse. Hoje, as pessoas não são mais felizes.” E continuou: “Essa é a era de agressividade de fusões que não parecem ter fim”.

O professor ainda destacou que os cidadãos não devem “idolatrar o trabalho”. “Não podemos viver para trabalhar, mas sim trabalhar para viver”. Como promessas para seu mandato, ele destacou que buscará uma sede para a academia. “É ideal para o cultivo da memória. Nosso acervo está disperso,” disse. Também destacou a importância de a academia atuar em parceria com outras entidades, como centros de estudos, associações e instituições.

Cerca de 100 pessoas estiveram presentes na posse. Entre as autoridades, o presidente do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, desembargador Decio Sebastião Daidone, e o ministro aposentado Vantuil Abdala.

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