Direito ao humor

José Simão pode falar de Juliana Paes em sua coluna

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26 de maio de 2010, 16h20

O humorista José Simão, da Folha de S. Paulo, já pode voltar a fazer piada sem censura. A juíza Bianca Ferreira do Amaral, da 4ª Vara Cível da Barra da Tijuca, rejeitou o pedido da atriz Juliana Paes de proibir o jornalista de fazer sátiras de suas personagens vividas na TV. A briga começou em 2009, durante a exibição da novela Caminho das Índias, da Rede Globo, em que Juliana vivia a personagem Maya. Para juíza, o colunista não abusou da sua liberdade de expressão e humorística.

Em julho do mesmo ano, a atriz conseguiu liminar no Juizado Especial da Barra da Tijuca proibindo o colunista de fazer sátiras relacionadas ao seu nome. Esse processo foi ajuizado somente contra José Simão. Nasequencia desse processo, está marcada uma audiência no dia 14 de junho, às 11h.

Juliana alega que o colunista vinha publicando textos ofensivos a seu respeito  no jornal e na internet, “denegrindo sua imagem, bem como a de sua família”. Ela ficou ofendida com a “gozação” feita em cima de seus atributos, citando trechos de textos como: “Juliana Paes, quero descascar a minha banana!”, “E você prefere a Juliana Paes na Índia ou na Playboy? Na Playboy, porque o bumbum da Juliana é um abuso de autoridade!”.

Em sua decisão, a juíza Bianca Ferreira, da 4ª Vara Cível, lembrou que a atriz, junto com a novela, participou de uma propaganda de cerveja em que era associada à marca “A Boa”, “na qual se enfatiza a beleza e a sensualidade da autora”. E ainda citou que Juliana já posou nua para a Playboy, “na qual a autora se despiu e mostrou todo o seu corpo, sem qualquer informação ou aspecto de constrangimento”.

Nesse caso, no entendimento da juíza, o colunista veiculou apenas “brincadeiras” que envolviam a atriz no período em que ela atuava na novela. “Sendo certo que as gozações e zombarias foram feitas com correlação a sua personagem Maya, ainda que se referindo ao seu próprio nome "Juliana", porque não é possível se desvencilhar absolutamente os atributos de mulher bonita e sensual de Juliana Paes com os de sua personagem”, afirmou a juíza.

Na sentença, concluiu que José Simão não abusou do seu direito de informação e liberdade de expressão jornalística e humorística e por isso a atriz não deve ser indenizada. “Não se pode duvidar, ainda, que é da essência dos meios de comunicação relatar fatos e realizar comentários, sejam eles verdadeiros ou não, acerca de pessoas famosas, em busca de ibope.”

Leia a decisão

JUÍZO DE DIREITO DA 4ª VARA CÍVEL DA BARRA DA TIJUCA
Processo 2009.209.015972-4

SENTENÇA
Trata-se de ação de indenização proposta por JULIANA COUTO PAES em face de EMPRESA FOLHA DA MANHÃ S.A., devidamente qualificados, objetivando a autora a condenação da ré para que se abstenha/excluir de seu site, referências e matérias acerca de sua imagem, sob pena de multa diária, bem como ao pagamento de valor a ser arbitrado pelo Juízo a título de danos morais. Como causa de pedir alegou a parte autora, em síntese, ser atriz famosa da emissora Rede Globo, sendo certo que, desde fevereiro de 2009, a ré vem publicando na coluna do jornalista José Simão e na internet, textos ofensivos à sua moral, denegrindo sua imagem, bem como a de sua família.

A inicial de fls. 02/18 veio acompanhada dos documentos de fls. 19/33. Às fls. 38, não foi acolhida a antecipação da tutela.

Contestação de fls. 76/93, alegando que o notório jornalista José Simão limita-se a exercer regularmente a atividade crítica e de imprensa de um modo geral, agindo com animus jocandi. Sustenta que a autora é pessoa pública de grande destaque na mídia, sendo certo que os textos questionados pela autora são de natureza humorística, não podendo ser considerados como ofensivos. Entende a ré ter exercido regularmente o direito constitucional de atividade crítica de imprensa. Por fim, defendeu ter inexistido dano moral a presente hipótese. Réplica de fls. 152/156. Decisão de fls. 160, em que o juízo indeferiu o pedido da autora de reunião de ações por não se tratar de hipótese de conexão. Instadas as partes a se manifestarem em provas, a ré e a autora apresentaram as petições de fls. 275/276 e 277, respectivamente. Audiência de conciliação de fls. 280, na qual as partes não alcançaram acordo.

É o relatório. Decido.

O presente feito comporta o julgamento antecipado da lide, visto que a matéria nele versada é unicamente de direito, em consonância com o inciso I do artigo 330 do CPC, sendo desnecessária a produção da prova oral pleiteada. Com efeito, o cerne do presente litígio consiste em perquirir se a notícia veiculada pelo réu, através do Jornalista José Simão, apresenta ou não cunho ofensivo à honra da autora. A questão suscitada acerca da existência de conexão entre esta demanda e outra ajuizada perante o Juizado Especial Cível já fora decidida às fls. 160, a qual não fora objeto de recurso.

Não há preliminares a serem examinadas, razão pela qual passo ao exame do mérito: No mérito, o que se observa do teor desta demanda, bem como dos documentos juntados aos autos, é que o réu, na hipótese em questão, apenas permitiu a veiculação de notícias ou de ´brincadeiras´ que envolviam a autora, no período em que esta estava em exposição pública na novela ´Caminho das Índias´, sendo certo que as ´gozações´, ´zombarias´, ets. foram feitas com correlação a sua personagem ´Maya´, ainda que se referindo ao seu próprio nome ´Juliana´, posto que não é possível se desvencilhar absolutamente os atributos de mulher bonita e sensual de ´Juliana Paes´ com os de sua personagem.

Desta forma, entendo que o réu não abusou no exercício do seu direito de informação e liberdade de expressão jornalística/humorísitca. Sustenta a autora ter sido ofendida em sua honra ao ser mencionado seu nome e não o de sua personagem nas passagens a seguir: ´Juliana Paes não é nada casta! Juliana Paes é da casta das nada castas!´Juliana Paes se casa com uma bananeira!; ´Juliana Paes, quero descascar a minha banana! E você prefere a Juliana Paes na India ou na Playboy’ Na Playboy por que o bumbum da Juliana é um abuso de autoridade! E assim vai… Todavia, o que se constata das narrativas de ambas as partes é que tais fatos e atributos, igualmente, já foram amplamente divulgados por outros meios de comunicação, como revistas sensuais e ´Playboy´, na qual a autora se despiu e mostrou todo o seu corpo, sem qualquer informação ou aspecto de constrangimento.

Ora, independentemente da escolha e do respeito à autora, este Juízo se limita a verificar a contraposição de interesses predominantes, quais sejam, liberdade de expressão e veiculação x Direito à intimidade e privacidade.

Neste contexto, o segundo aspecto (privacidade) há muito já fora afastado pela própria autora, na medida em que, em virtude de sua aparição constante em novelas e programas de televisão, inclusive naqueles em que se têm notícias e declarações feitas pessoalmente em relação a sua vida pessoal, sua vida com seu marido, gravidez, etc, se expõe, acabando por transformar a sua vida em fato notório e público. Ademais, a autora não apenas aparece na mídia em nome dos seus personagens como também em seu próprio nome e em exposição de seu corpo como ´Juliana´, como no exemplo citado pelo réu, a propaganda de uma cerveja famosa- ´A boa´, na qual se enfatiza a beleza e a sensualidade da autora para estimular o público, em geral, a consumir o produto anunciado.

Portanto, a autora, até mesmo por que faz parte de sua vida artística, se vale do fato de ser uma pessoa bonita, sensual, articulada e inteligente para se manter em exposição. Sendo assim, muito embora os termos utilizados possam ser fortes não o foram relatados com ânimo de ofensa, visto que se referem a fatos públicos, notórios e relacionados às cenas protagonizadas por sua personagem ´Maya´, que tanto influenciou o povo, mormente diante de cenas, consideradas por nós absurdas, porém tidas como importantes para aquele povo, como é o caso da cena em que Maya se casa com uma bananeira.

Evidente que diante daquela cena muitas ´brincadeiras´ e ´piadas´ iriam surgir, ainda mais quando protagonizadas pela autora, sempre alvo de busca de notícias, em razão de sua popularidade e simpatia. Não se pode duvidar, ainda, que é da essência dos meios de comunicação relatar fatos e realizar comentários, sejam eles verdadeiros ou não, acerca de pessoas famosas, em busca de ibope.

É de conhecimento geral o excessivo número de ações que envolvem artistas e jornais, revistas, fotógrafos e profissionais do ramo, sob o fundamento de veiculação de notícias ou imagens não autorizadas, as quais, quase sempre,são fadadas ao insucesso, em virtude de alegações ligadas ao ramo de atividade do artista. Todavia, não há como se considerar tais questões como invasão à intimidade ou privacidade destes artistas, ante a sua opção de vida social e profissional em evidência. Os fatos, inequivocadamente, ofensivos e mentirosos serão reprimidos com veemência pelo Poder Judiciário, o que não é o caso dos autos. Aqui, se constata o ânimo humorístico das notícias e não de caráter ofensivo à autora ou a sua família. Em suma, as notas veiculadas não contêm qualquer expressão ofensiva à honra da autora, seja considerada isoladamente ou não, tratando-se apenas de técnica da balizada linguagem jornalística/humorísitca, empregada com vistas a aguçar o interesse e a curiosidade do público ouvinte e leitor.

Desta forma, não se vislumbrando abuso da empresa ré no exercício de seu direito de informação e de caráter humorístico, não há que se falar em obrigação de indenizar. Neste sentido, a Jurisprudência: ´0000532-12.2009.8.19.0209 – APELACAO – 1ª Ementa DES. MAURICIO CALDAS LOPES – Julgamento: 24/02/2010 – SEGUNDA CAMARA CIVEL Ação ordinária. Danos morais.Imprensa.Notícia veiculada que imputa à autora dependência econômica de sua nora, famosa atriz, que a teria retirado do subúrbio carioca para residir na Barra da Tijuca, custeando seus alugueres. Sentença de improcedência.Apelação da autora insistindo em que o episódio teria, efetivamente, lhe exposto e comprometido a honra, tanto mais quando nunca necessitara da ajuda financeira de sua nora. Liberdade de imprensa e direito à privacidade em aparente antinomia.

Em aparente rota de colisão.Técnica da cedência recíproca.Avaliação da hipótese fática, em desfavor da apelante que, valendo-se da repercussão do casamento de seu filho com famosa atriz, intentara tornar-se pessoa pública, sem atentar talvez que o bônus da popularidade tem como contraponto o ônus do interesse e acesso da mídia a sua vida particular.Dano moral que, no caso, não resultando in re ipsa, dependia de prova contundente a respeito da lesão a direitos da personalidade da autora, em ordem a demonstrar a repercussão social negativa da notícia em sua vida ou, ao menos, a falsidade de seu conteúdo — ônus de que, entretanto, não se desincumbiu a autora. (CPC, artigo 333, I.)Notícia veiculada de conhecimento público e notório, que não se demonstrou ser falsa, desprovida, ademais, de qualquer conteúdo ofensivo. Ausência de lesão extrapatrimonial.Recurso não provido´.

Isto posto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados pela autora. Condeno a autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios que fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa. Transitada em julgado, dê-se baixa e arquivem-se. P.R.I. Rio de Janeiro, 24 de maio de 2010.

BIANCA FERREIRA DO AMARAL M. NIGRI Juíza de Direito.

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