Erro sanado

Correção não ofende coisa julgada, afirma TJ-SP

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6 de maio de 2010, 18h08

O Direito tem de ser direito. Um erro judicial descoberto não pode persistir. A sua correção é mais do que necessária para retratar a fidelidade do julgamento. Esse foi o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo que, nesta quinta-feira (6/5), rejeitou recurso que pretendia anular a retificação de decisão de 31 de janeiro de 2008.
 
A súmula que consertou o erro judicial tratou do julgamento de revisão criminal de um guarda civil, condenado em 1959 a seis meses de prisão por ato obsceno. Ele morreu em 1998.
 
No julgamento de revisão do caso, em janeiro de 2008, os desembargadores decidiram, por 12 votos a dois, rejeitar o pedido dos familiares do guarda civil. Por um erro não explicado, o resultado publicado no Diário Oficial era o contrário da decisão, como se o pedido de revisão tivesse sido acatado e o réu, absolvido. Em novembro do ano passado, o 3º Grupo de Câmaras cancelou a tira errada e mandou publicar a decisão correta do julgamento que manteve a condenação do acusado.
 
O guarda civil foi condenado em 1959 por ato obsceno (artigo 233 do Código Penal) e recebeu pena de seis meses de detenção, suspensa pelo prazo de dois anos. Em decorrência da condenação, ele foi expulso da Guarda Civil, corporação policial existente à época. Morreu em 5 de janeiro de 1998 de câncer no pâncreas, mas nunca se conformou com a condenação.
 
Com o propósito de reabilitar a memória dele, a viúva e os filhos ingressaram com pedido de revisão criminal. No julgamento do pedido, por 12 votos a dois, o tribunal manteve o resultado do julgamento anterior, mesmo após ouvir o depoimento da suposta vítima do guarda, que o inocentou.
 
A acusação é de que o guarda tirou o pênis de dentro da calça e o esfregou no braço de uma menina de 11 anos, quando ambos viajavam em um ônibus lotado. A mulher, agora com 60 anos, em nova versão, não confirmou a história apresentada por um grupo de policiais militares que também estavam no ônibus.
 
Ela contou que o guarda civil não praticou nenhum ato obsceno e que, à época, foi forçada pela avó a incriminá-lo. Ele "é inocente de ter feito coisas que não se deve fazer com uma criança dentro do ônibus”, afirmou em depoimento a agora sexagenária.
 
No julgamento da revisão, o desembargador Pedro Gagliardi classificou como “inverossímil” a narrativa dos fatos feita na denúncia do Ministério Público, com base nos depoimentos de testemunhas. Para ele, os depoimentos conferem “pouca credibilidade” às imputações apontadas da denúncia.
 
“Efetivamente não se mostra crível que um guarda civil na função há quase uma década, fardado, com ficha funcional imaculada e família constituída, no interior de um coletivo lotado e acompanhado de diversos policiais da Força Pública, iria colocar seu pênis para fora das calças e esfregá-lo no braço de uma menina”, afirmou.
 
A maioria, no entanto, entendeu que o resultado anterior, que condenou o réu, deveria ser mantido. Só que na hora de publicar o resultado do julgamento foi levado em conta o voto vencido do desembargador Pedro Gagliardi a favor da absolvição. Ninguém sabe de onde partiu o erro.
 
Embargos
O relator Damião Cogan trouxe voto pela rejeição dos Embargos de Declaração. O desembargador sustentou que quando há erro material o vício pode ser sanado por correção de ofício, pois este ato não ofende a chamada coisa julgada.
 
Pedro Gagliardi apresentou voto contrário ao do relator onde defende a tese de que a coisa julgada é soberana. O desembargador argumentou que como não houve recurso do Ministério Público o julgamento transitou em julgado e seria inadmissível a mesma turma julgadora modificar erro judicial quando já se consumou a coisa julgada. “Se vício houve nada mais se pode fazer”, acrescentou Pedro Gagliardi.
 
“Só há duas possibilidades: erro administrativo ou má-fé”, afirmou o desembargador Pinheiro Franco ao tratar do erro da publicação do julgamento. Segundo Pinheiro Franco, o desembargador Pedro Gagliardi não poderia subscrever o acórdão porque não tinha poderes para isto, uma vez que seu voto saiu vencido por onze a dois.
 
“Não pode transitar em julgado decisão tomada em acórdão lavrado por quem não tinha atribuição”, disse Pinheiro Franco. “Então a conclusão que podemos chegar é que esse acórdão é nulo”, completou.
 
O desembargador Ricardo Tucunduva, que ficou como relator designado no julgamento de 2008, afirmou que a sociedade espera do Tribunal de Justiça de São Paulo que seus membros digam a verdade. E segundo Tucunduva, retificar o acórdão é a forma de se retratar do erro cometido.
 
O desembargador Erickson Maranho destacou a regra de que ficando vencido o relator sorteado o acórdão será redigido pelo relator designado. Pedro Gagliadi ficou isolado na sua defesa de acolhimento dos Embargos de Declaração.

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