Economia mista

Processo de demissão na ECT gera debate no Supremo

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25 de fevereiro de 2010, 3h49

A necessidade de motivação (justa causa) para as demissões de funcionários da Empresa de Correios e Telégrafos provocou forte debate entre os ministros do Supremo Tribunal Federal, nesta quarta-feira (24/2). A discussão girou em torno do acórdão do Tribunal Superior do Trabalho, que estabeleceu a exigência de motivação para demissões na ECT, decisão que foi contestada pela empresa em Recurso Extraoridinário.

O TST declarou inválida a demissão de um funcionário dos Correios sem justa causa sob o argumento de que, por gozar de benefícios conferidos à Fazenda Pública como impenhorabilidade de bens, pagamento por precatório e prerrogativas processuais diferenciadas, a ECT não pode demitir sem justo motivo.

Os ministros entenderam que a decisão do TST não vale para todas as empresas de economia mista. O debate se restringiu então às demissões na ECT. A dúvida refletiu na repercussão da decisão, pois o RE 589.998 foi inserido na pauta com reconhecimento de repercussão geral, o que gerou um debate a mais entre os ministros. Como o ministro Joaquim Barbosa adiantou que iria pedir vista do processo, os debates não foram conclusivos.

A tendência é que a repercussão geral seja restrita às ações que envolvam a ECT, que tem tratamento diferenciado em relação às demais empresas de economia mista. Os ministros manifestaram preocupações para que a repercussão geral não alcance todas as empresas de economia mista.

No mérito, o relator do processo, ministro Ricardo Lewandowski, negou provimento ao recurso. Ele não afastou a possibilidade das empresas de economia mista demitirem seus funcionários, mas no caso da ECT Lewandowski entende que a empresa estaria obrigada a motivar as demissões, pois trata-se de uma empresa que tem características especiais. “É preciso um procedimento formal e que o ato seja motivado”, disse o ministro, que equiparou a demissão ao ato administrativo da administração pública. “O que se quer evitar é que se mude o governo e se demita os funcionários por razões políticas”, disse.

A ministra Cármen Lúcia descartou a possibilidade de haver um processo administrativo formal, com direito a contraditório. Para ela, se a ECT tiver que oferecer direitos trabalhistas e o servidor ainda tiver estabilidade, “esse é o melhor dos mundos para se trabalhar”, disse. O relator esclareceu que se trata de um procedimento, não de um processo, mas um ato que permita o controle externo sobre o que motiva a demissão, evitando assim perseguições políticas.

O que traz dificuldade aos ministros é a natureza econômica da ECT. O ministro Cezar Peluso entende que os Correios têm características de empresa privada quando contrata pela CLT, e indagou se a motivação seria o mesmo princípio da justa causa, válida na iniciativa privada. Marco Aurélio lembrou que para a sociedade de economia mista há a regra do concurso público, mas não se pode dizer que não há possibilidade demissão para quem for contratado pela CLT.

O ministro Ayres Britto respondeu que há possibilidade de demissão, desde que seja motivada. Britto explicou que a ECT é uma empresa pública e não tem atividade econômica, mas prestação de serviço com exclusividade. “É uma empresa de característica estatal, com capital público e que realiza concurso, faz licitação e os atos devem ser motivados”, afirmou.

O presidente do STF, Gilmar Mendes, disse que a ECT está num ambiente de forte concorrência, sobretudo com o uso da internet para a troca de correspondências e cada vez mais os Correios têm funções típicas das empresas privadas. Para ele, exigir a motivação é “uma decisão estranha, pois torna mais rígido o modelo, quando a empresa necessita de maior flexibilidade para sobreviver”.

Ao final do debate, Cezar Peluso concluiu que o caso deve ser encarado do ponto de vista da proteção do interesse público. “O sentido do entendimento do TST é que se trata de uma garantia de defesa do interesse público contra atos abusivos da empresa, isto é, atos contrários ao interesse público. A empresa não pode demitir, senão com base em algum interesse público e isso exige motivação, demonstrar que o fato que ocasionou a demissão foi a satisfação de interesse público, o que demonstra a impessoalidade”.

O relator foi acompanhado pelo ministro Eros Grau, que não considera a referida motivação como justa causa, mas como ato administrativo que se aplica quando a empresa estatal for prestadora de serviço público. Ele considerou a diferença entre a atividade econômica privada e estatal com base na Constituição. Atividade econômica em sentido estrito é a do setor privado, conforme o artigo 173 da CF, enquanto que nos artigos 175 e 21, a Constituição fala em serviços, que são do Estado.

Ao pedir vista do processo, o ministro Joaquim Barbosa lembrou que a demissão na ECT foi motivada pelo fato do servidor ter se aposentado. Como ele já havia pedido vista de processo que trata desse tema, na semana passada, decidiu pedir vista também do RE 589.998.

Recurso Especial 589.998

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