Regras em excesso

Advogados reclamam que Ato Olímpico fere concorrência

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20 de fevereiro de 2010, 8h05

Segundo o Intellectual Property Office, órgão britânico que defende os direitos autorais no Reino Unido, os anéis que formam a marca dos jogos olímpicos são reconhecidos por 93% da população mundial. Em época de Olimpíadas, o país que recebe os jogos mundiais tem 3,9 bilhões de espectadores no mundo com os olhos voltados para ele. Esses dados explicam a importância de ser um dos patrocinadores oficiais do evento e garantir que seus direitos estejam protegidos. No Brasil, para as Olimpíadas de 2016, já foi decretado o Ato Olímpico que, segundo especialistas, está indo muito além de proteger direitos e acaba impedindo que outras empresas tirem proveito do evento internacional.

O problema não é só no Brasil. Há críticas também contra o Ato Olímpico britânico que prevê as regras de direito autoral para as Olimpíadas de 2012. A norma chega a prever uma lista de expressões proibidas em campanhas de não-patrocinadores oficiais, como “Londres”, “medalhas”, “patrocinador”, “ouro”, “prata” e “bronze”. Nos jogos de inverno do Canadá, segundo o colunista de esporte do UOL, Erich Beting, o McDonald´s chegou ao ponto de impedir que uma rede de lanchonetes utilizasse a palavra “hamburguer” em seu cardápio.

Para conter os excessos, a Associação Internacional para a Proteção da Propriedade Intelectual (AIPPI) divulgou uma Resolução (em inglês), sugerindo que os países sedes de jogos internacionais evitem ir muito além do que a legislação em vigência já protege. O advogado Luis Fernando Matos Junior, especialista na área, concorda com a resolução. Para ele, além das leis já serem suficientes, o Ato Olímpico brasileiro inibe até que uma empresa, por não ser patrocinadora oficial, crie uma campanha publicitária em que os jogos sejam o mote. “A propriedade intelectual busca proteger a capacidade, a originalidade. Esses eventos não foram criados pelo comitê ou pela Fifa, que apenas organizam esses eventos. É um excesso”, afirma Matos.

Segundo o advogado, o problema com o ato surge porque o governo precisa aprovar o Projeto de Lei antes de ser escolhido para sediar os jogos e, por isso, o usa para mostrar-se pronto ao Comitê Olímpico Internacional (COI) e engordar as chances de ser escolhido como sede do evento. “Com um ato mais firme, que prove ao Comitê Olímpico Internacional que o país está pronto, ele ganha chances de conseguir a aprovação. E foi o que ocorreu no Brasil.”

Para André Giachetta, especialista em propriedade intelectual do escritório Pinheiro Neto, o Comitê Olímpico Internacional e o Comitê OIímpico Brasileiro pretendem com a edição do Ato Olimpico alargar a proteção dos símbolos olímpicos. “Isso significa dizer que localmente, no Brasil, pretende-se dar uma amplitude de proteção que inexiste em sua origem”, explica. Segundo Giachetta, as regras em grandes jogos devem reprimir com vigor o uso não autorizado ou abusivo dos Símbolos Olímpicos. “Mas não se deve admitir que os interesses econômicos dos patrocinadores e da organização do evento suplantem os direitos constitucionais de liberdade de imprensa, de expressão e de criação, incluindo-se os direitos autorais”, defende.

Além dos excessos envolvendo campanhas publicitárias, segundo Giachetta, pode haver até a necessidade de pagar direitos de exibição dos jogos em estabelecimentos comerciais, o que é comum durante a Copa do Mundo no Brasil, quando bares e restaurantes sintonizam os jogos. “Ora, em tempos de inclusão digital, acesso a informações com facilidade, como podemos falar em pagamento para exibição de jogos da Copa do Mundo, que é o maior evento esportivo do Mundo?”

Para Matos, a recomendação da AIPPI pode causar algum efeito. “A associação tem como membros todos os patrocinadores dos Jogos Olímpicos, aqueles que têm interesse no assunto. Além disso, os advogados do COI do mundo inteiro pertencem à AIPPI, ou seja, a associação tem um peso muito grande.” No entanto, ele explica que o ato não deve ser modificado.

Matos acredita que as empresas que se sentirem prejudicadas pelo ato devem recorrer à Justiça. Porém, ele lembra que o futuro desses processos é uma incógnita, já que o Brasil não possui uma jurisprudência envolvendo grandes eventos internacionais. O advogado Giachetta acredita que as empresas podem abrir um processo com base na violação aos princípios da liberdade de expressão, criação, direitos de propriedade intelectual e livre concorrência. “Imagino até se falar em inconstitucionalidade de determinados artigos que alargam a proteção dos símbolos olímpicos”, afirma. O resultado é esperar para ver.

A Consultor Jurídico procurou pela Associação Brasileira de Propriedade Intelectual (ABPI) e pelo Comitê Olímpico Brasileiro Brasileiro (COB) para comentar o assunto, mas as entidades não responderam até o fechamento desta reportagem.

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