Presos monitorados

Tornozeleira enfrenta resistências comerciais

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28 de abril de 2010, 11h41

Preso dá lucro. Embora muitos fiquem assustados com o custo de um preso ao Estado, entre R$ 1 mi e R$ 2 mil, o fato é que o preso paradoxalmente dá lucro a setores que prestam serviços, que vão desde a venda de refeições e uniformes, até a construção de presídios, sistemas de segurança, serviços jurídicos, de apoio e muito mais.

Na verdade, apesar de muitos setores alegarem que estão preocupados com os presos, o que querem mesmo é controlá-los e torná-los reféns de seus serviços, ainda que usem retórica e argumentos não transparentes.

Em geral, o que falta é uma política até mesmo legislativa que fortaleça penas alternativas. Por exemplo: não se sabe como efetivamente executar uma pena de perda de bens. Já a pena de multa foi desmoralizada desde 1996. Não se sabe onde executá-la, ou se é necessário emitir CDA para um título judicial, tudo isso em razão de leis mal feitas (art. 51 do CP). Também faltam órgãos para fiscalizar as penas de prestação de serviço. Muitas outras modalidades de penas alternativas já existentes, como em Portugal, por exemplo, ainda não foram implantadas no Brasil.

Há um esforço do CNJ e do MJ para fortalecer as penas alternativas, mas isso não basta. Falta estrutura legal e de apoio. As pessoas ainda acham que somente há crime se existir prisão. Os municípios precisam dividir a responsabilidade, pois segurança pública é responsabilidade de todos, conforme o art. 144 da Constituição Federal. E município também integra o conceito de Estado, apenas não pode ter polícia. Nada impede que participe das demais medidas.

Nos Estados Unidos, quem cumpre pena alternativa usa um jaleco para se identificar. No Brasil, não se usa identificação. O apenado vira herói que “voluntariamente” presta serviço. Alguns alegam que é humilhante usar jaleco. Talvez a pergunta melhor seja: “quer cumprir pena de prisão ou pena alternativa com o jaleco?” Pena não pode ser secreta, devido ao caráter punitivo e preventivo da pena (social). Logo, nada impede que as pessoas saibam que “fulano” cumpre pena, pois isso diminui a sensação de impunidade.

Iniciativas brilhantes, como a do TJ-DF, de colocar o Atestado de Pena em uma espécie de caixa 24 horas, podendo ser emitido como um extrato bancário, dá autonomia ao preso. A ideia não é copiada por outros tribunais, e nem mesmo há interesse de alguns setores jurídicos, porque recebem para fazer serviço manual. Eles aparecem como heróis em mutirões. Ou seja, os presos precisam ficar dependentes para justificarem a prestação de serviço. Logo, a emissão do Atestado de Pena pela internet ou extrato eletrônico dá uma autonomia que não interessa a esses setores.

Falar em desjudicialização da execução penal é quase que um pecado mortal. Nem se pode discutir e ver como ela funciona em outros países. 

Alguns tribunais alegam que não têm verba para investir em tecnologia. Porém, têm verba para gastar construindo palácios e comprar carros oficiais novos,  bem como contratar pessoal para furar, juntar e numerar papel, em vez de investir em novas tecnologias.

Os mesmos setores supostamente bondosos agora também são contra o uso da tornozeleira eletrônica, com argumentos retóricos de que o condenado não pode ser exposto. Ora, não faz sentido que esses burocratas impeçam o imediato uso desse instrumento, que já existe em vários países. O que querem é que os presos continuem presos, para que possam continuar a prestar os seus serviços. Quem deve decidir se quer, ou não, usar a tornozeleira eletrônica, é o condenado. Viola a dignidade humana negar este direito de escolha. Atuam como o falso bom psicólogo, que quer que o paciente fique em tratamento por mais tempo, quando, na verdade, quer apenas aumentar a conta.

Temos 500 mil presos atualmente no Brasil, e outras 600 mil pessoas cumprem penas alternativas. Temos mais 500 mil mandados de prisão para cumprir. Contudo, temos atualmente menos de 300 mil vagas no sistema carcerário, ou seja, já temos excesso de lotação. Na área federal, há apenas 800 presos em presídios federais, logo, é claro que nesse segmento ainda não há caos, por isso há uma resistência maior neste setor à tornezeleira eletrônica, pois quem fica com os presos federais são os estados. Pimenta no olho dos outros não arde.

Com a tornozeleira eletrônica, poderíamos liberar mais da metade dos presos, inclusive em liberdade provisória, e até mesmo monitorar alguns, como no caso de Luziânia, e evitar tragédias.

É claro que a indústria de tornozeleiras eletrônicas também quer vender os seus serviços. Mas, dentro da lógica, o custo social e financeiro da tornozeleira eletrônica é bem menor que o da prisão. Porém, dois setores específicos A e B (um público e outro aparentemente privado) estão impedindo a implantação desse benefício, alegando violação a dignidade do preso.

Será que estão realmente preocupados com isso? Ou querem apenas vender o serviço? A prisão, como a cirurgia, deve ser a última opção, mas muitos querem vender logo o serviço, antes do remédio da tornozeleira eletrônica. Dá mais lucro, afinal, o custo da tornozeleira é bem menor. Se eu cometesse um crime e fosse condenado, preferiria usar a tornozeleira eletrônica em vez de ser preso.

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