Política sem palavras

Promoção e propaganda confundem Justiça Eleitoral

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3 de abril de 2010, 4h35

Não é só o Tribunal Superior Eleitoral que tem se dividido quando o assunto é propaganda eleitoral antecipada. No Rio de Janeiro, o Tribunal Regional Eleitoral do estado também tem se deparado com o tema, ao analisar as representações contra eventuais candidatos, e não há unanimidade quanto ao que é promoção pessoal e o que se considera propaganda eleitoral antecipada. A confusão começa na legislação altamente restritiva que está mais focada em garantir a isonomia entre os candidatos do que em defender o direito de expressão e a necessidade de informação do eleitor.

No final de janeiro, a Procuradoria Regional Eleitoral do Rio contabilizou 54 ações contra propaganda antecipada apresentadas no semestre passado. Entre elas, uma representação contra um deputado estadual acusado de ter se aproveitado de um evento religioso em uma igreja católica para fazer propaganda fora da época permitida por lei. A legislação prevê multa para quem fizer propaganda antes do dia 6 de julho.

“Não mais se sustenta a construção jurisprudencial, liderada pelo TSE, que vigorou durante vários anos, quanto à necessidade de haver pedido explícito de voto, referências à legenda partidária, ao número de candidatura ou ao pleito para que estivesse caracterizada a chamada propaganda antecipada”, afirma o juiz-coordenador da campanha eleitoral do Rio de Janeiro, Luiz Marcio Victor Alves Pereira.

O juiz explica que quando não havia a referência, os tribunais entendiam o ato como promoção pessoal e nenhuma punição era aplicada. “O TSE mudou a orientação e passou a admitir a existência da referida ilegalidade mesmo com o pedido dissimulado de voto, comparações entre governos e supostos projetos ou qualquer ação que leve à conclusão de que um determinado pretenso candidato seja mais adequado para ocupar uma vaga entre os eleitos em um pleito”, disse o juiz.

Para Luiz Marcio, a mudança no posicionamento do TSE não acabou com as dúvidas. “As interpretações sobre cada caso geram muitas polêmicas, principalmente quando envolvem a conduta de um terceiro em favor de um pretenso candidato, o qual normalmente alega desconhecer aquela iniciativa, mas aufere vantagem eleitoral, por estar se antecipando aos demais futuros candidatos, com a divulgação de seu nome e supostas virtudes, devendo ambos serem multados.”

O juiz conta que no TRE do Rio há entendimentos que procuram flexibilizar a chamada promoção pessoal, posição que vinha sendo adotada pelo TSE, e outros que fazem analogia com o dispositivo que veda novos programas sociais bancados pelo poder público em ano de eleição, para garantir o princípio de igualdade entre os candidatos.

“Com esta última linha julgadora, defende-se que no ano eleitoral a chamada promoção pessoal de quem tem filiação partidária se constitui numa antecipação da campanha e cria a desigualdade entre os futuros concorrentes, bem como gera despesas que não serão contabilizadas como gastos de campanha na prestação de contas que deverá ser apresentada à Justiça Eleitoral”, explica o juiz. A posição “mais rigorosa” adotada, que faz alusão ao ano eleitoral, diz o juiz, “combate não só a antecipação da publicidade eleitoral, mas também o abuso de poder econômico no pleito, primando pela transparência nos gastos eleitorais”.

O juiz eleitoral no Rio, Leonardo Antonelli, lembra que o próprio TSE está dividido. “Se a última instância competente para apreciar o recurso julga num determinado sentido por diferença de um voto, parece-me inequívoca a insegurança jurídica acerca do tema no momento atual”, disse.

Para Antonelli, a melhor maneira de garantir segurança jurídica é fazer com que a tramitação dos processos seja rápida. Ele diz que na administração atual do TRE fluminense, há um compromisso dos seis integrantes do órgão em cumprir os prazos escassos previstos na legislação.

Questionado se a lei atual é adequada, o juiz entende que o Judiciário está agindo, mas lembrou que o juiz não atua como “legislador positivo”. “Vivemos num Estado Democrático de Direito e o respeito à competência dos três poderes deve sempre ser observado.” Ele observa que o país vive em um processo de amadurecimento eleitoral. “Quantos candidatos foram cassados por abusos de poder econômico e captação ilícita de sufrágio? Inúmeros. Hoje existe uma Justiça atuante e atenta que busca garantir a isonomia entre os candidatos e dar legitimidade aos pleitos como expressão da vontade popular”, disse.

“As regras que tratam do assunto para as eleições de 2010 estão postas e serão observadas. Sem dúvidas há necessidade de constante aprimoramento legal, afastando legislações casuísticas que possam levar a interpretações subjetivas”, completa o juiz.

Antonelli também falou sobre as mudanças decorrentes da mini-reforma eleitoral, que reduziu as multas aplicáveis à propaganda fora do prazo e permitiu uma série de condutas que, em tese, disse o juiz, pode interferir nos princípios que norteiam o processo eleitoral. Ele citou, como exemplo, a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos, além da participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos.

Rigor em Minas
Já o advogado Paulo Valadares Versiani Caldeira Filho, do Rennó, Machado e Drummond Advogados Associados, conta que o Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, em relação às últimas eleições municipais, foi bastante rigoroso quanto à propaganda eleitoral antecipada. O que antes era considerado promoção pessoal, como outdoors, anúncios e cartazes de felicitações em datas comemorativas e adesivos em carros com o nome do candidato, diz, passou a ser interpretado, na maioria das vezes, como propaganda subliminar.

"Foi visível a interpretação mais extensiva do que seria vedado antes de iniciado o período de campanha, tanto que a aplicação de multas em tais casos tem sido revista pelo TSE em sede de recurso especial."   

Caldeira acredita que o rigor vai continuar nas eleições deste ano. Ele disse que desconhece decisão do TRE mineiro sobre propaganda eleitoral antecipada, envolvendo o pleito de 2010. "Acredito que isto se deve, ao menos em parte, à indefinição, em Minas, de quais seriam os candidatos de oposição ao governo." Mesmo o candidato da situação, conta o advogado, não foi tão divulgado, se comparar com o que se verifica em âmbito nacional.

"Acredito que a partir de agora, com a desincompatibilização do governador, poderão surgir representações sobre a questão", disse Paulo Caldeira. O governador de Minas, Aécio Neves, deixou o governo nessa quarta-feira (31/3). Em Belo Horizonte, alguns cartazes agradeciam o governador.

Para o advogado Paulo Caldeira, deveria haver maior liberdade para a propaganda eleitoral. "Acho que deve ser severamente coibido o uso da máquina pública para este fim, mas a realização de propaganda pelos partidos políticos, financiada com seus próprios recursos, não deveria se limitar aos três meses que antecedem o pleito. A própria existência dos partidos só se justifica pela necessidade de disputa de idéias e de candidatos", diz.

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