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ConJur é condenada por notícia sobre TJ paulista

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1 de abril de 2010, 16h15

A juíza Vera Lúcia Calviño de Campos, da 2ª Vara do Juizado Especial Cível de Guarulhos, condenou a Dublê Editorial — responsável pela revista eletrônica Consultor Jurídico — a pagar indenização no valor de R$ 9,3 mil ao juiz Leandro Jorge Bittencourt Cano, também de Guarulhos. O motivo da condenação foi a reportagem Juízes abandonam convocação em câmara criminal, publicada em outubro de 2009. A juíza entendeu que o texto jornalístico usou “expressões pejorativas”, que macularam a imagem de seu colega e dos demais juízes da 1ª Câmara Criminal “D”. A ConJur vai recorrer.

A reportagem tratou das câmaras que trabalhavam em regime de mutirão. Na Justiça paulista, o sistema de substituição de juízes foi criado e regulamentado pela Lei Complementar Estadual 646, editada em janeiro de 1990. Uma resolução do Tribunal de Justiça (Resolução 204/05) disciplinou o funcionamento dos mutirões. As turmas julgadoras, chamadas de câmaras extraordinárias, são formadas por juízes de primeiro grau e presidida por um desembargador. Os juízes eram remunerados pelo número de feitos julgados, até que o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) proibiu o pagamento.

O CNJ foi informado de que, com o pagamento extra, diversos juízes passaram a receber acima do teto constitucional de R$ 24,5 mil. Na época, um dos conselheiros disse que pelo menos 13 juízes receberam mais de R$ 41 mil em um ano só de pagamentos extras. Houve caso de um juiz que recebeu R$ 80 mil. O pagamento, segundo o CNJ, era irregular, assim como a forma de convocação de juízes. O caso ficou conhecido como “auxílio-voto”. O valor era pago aos juízes de primeira instância convocados para ajudar na segunda instância. O pagamento era feito direto na conta, sem ser registrado nos contracheques. 

A reportagem informou que o Tribunal de Justiça de São Paulo se viu obrigado a extinguir a 1ª Câmara Criminal “D” por causa da desistência da maioria de seus integrantes. A câmara era formada de juízes de primeiro grau e um desembargador, convocados para reduzir a avalanche de recursos represada na maior corte do país. O texto dizia ainda que os juízes não se sentiram seduzidos a trabalhar de graça e decidiram abandonar a convocação. “A revoada aconteceu depois da decisão do CNJ, que proibiu a remuneração dos juízes de primeira instância que trabalhavam em regime de mutirão no tribunal paulista”, afirmou a ConJur

As próprias decisões das câmaras especiais, formadas por juízes de primeiro grau sob a presidência de um desembargador para atuar em sistema de mutirão, foram contestadas no Superior Tribunal de Justiça e no Conselho Nacional de Justiça. A partir do ano passado esses colegiados foram sendo extintos na medida em que terminavam os estoques de recursos já distribuídos. Restam poucas câmaras ainda em funcionamento. 

A reportagem da ConJur não cita nomes, mas dois juízes, ambos de Guarulhos, ajuizaram  ações de teor praticamente idêntico contra a revista. Além de Leandro Jorge Bittencourt Cano, da Vara do Júri, também acionou a revista o juiz Jayme Garcia dos Santos Junior, da Vara de Execuções Criminais. Uma ação corre na 2ª Vara e outra na 1ª Vara do Juizado Especial Cível de Guarulhos.

Ave de rapina
A juíza Vera Lúcia Calviño de Campos não gostou dos termos “juízes abandonam convocação”, “não se sentiram seduzidos a trabalhar de graça” e “revoada”. Na interpretação da juíza, a reportagem pretendeu induzir o leitor a concluir que todos os juízes de primeiro grau que trabalhavam naquela câmara, em regime de mutirão, eram mercenários e interesseiros, e só trabalhavam nesse regime por causa da remuneração que foi proibida pelo CNJ. 

“Aliás, ao mencionar que houve ‘revoada’ desses juízes, o réu pretendeu equipará-los a aves de rapina, pois é sabido que esses animais fogem em revoada quando terminam os despojos”,  interpretou a juíza em sua sentença. Na sua opinião, se a ConJur tivesse se limitado a prestar informações verdadeiras sobre a câmara, sem usar as expressões “juízes abandonam convocação” e “revoada”, teria cumprido sua missão, sem ferir a independência funcional ou a honra de qualquer magistrado. 

A juíza entendeu que o pagamento de indenização no valor de R$ 9,3 mil ao juiz Leandro Jorge Bittencourt Cano seria suficiente para amenizar o sofrimento suportado pelo réu por conta das palavras usadas na reportagem que feriram a honra de seu colega de fórum. A julgadora ainda defendeu que a verba indenizatória teria o condão de dissuadir a revista eletrônica Consultor Jurídico de um atentado novo ou igual ao desfechado contra o juiz Cano.

A juíza Vera Lúcia rejeitou o pedido de publicação da sentença na revista feita pelo autor, por entender que tal medida se baseia na Lei 5.250/1967 (Lei de Imprensa), revogada no ano passado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 130.

Por fim, a juíza deu prazo de 10 dias para a revista recorrer da sentença e de 15 dias, contados a partir do trânsito em julgado, para o pagamento da indenização, sob pena de multa de 10%.

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