Justiça sem Judiciário

Execuções fiscais precisam de solução extrajudicial

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12 de setembro de 2009, 10h51

A crise pela qual passa o Judiciário brasileiro impulsiona o uso de ferramentas extrajudiciais para solucionar conflitos. O mesmo não acontece na área fiscal. O número de execuções fiscais em tramitação na Justiça ultrapassa o total de todos os outros tipos de processo e, ainda assim, hoje não se usa qualquer outra forma de resolvê-las que não a Justiça. O uso de mecanismos extrajudiciais para lidar com o estoque de ações de execução fiscal foi tema de debate no segundo dia do IX Congresso Internacional de Direito Tributário de Pernambuco, que acontece em Porto de Galinhas (PE) de 10 a 12 de setembro.

A menina dos olhos em matéria de solução extrajudicial de conflitos é a arbitragem. O instituto, que já ganhou força no Brasil, promete solução rápida, eficaz e definitiva. A proposta de especialistas agora é levar a arbitragem para a esfera dos tributos. “A arbitragem na área tributária não é inovação. É necessidade”, afirma Luciano Benévolo de Andrade, vice-presidente da Comissão de Mediação e Arbitragem da OAB do Distrito Federal.

Francisco Cahali, especialista em arbitragem, apresenta números para mostrar essa necessidade de usar a arbitragem em matéria tributária. Ele usa como exemplo o estado de São Paulo, que tem o maior tribunal e também o mais afogado do país. Em São Paulo, há hoje 18 milhões de processos em tramitação. Desses, 10 milhões tratam de execução fiscal. “O que mais congestiona o Judiciário hoje são as execuções”, diz.

O excesso de execuções fiscais e a falta de solução delas têm reflexo imediato na arrecadação tributária, afirma Luciano Benévolo. Para ele, a arbitragem pode ser um meio eficaz para aumentar a arrecadação e, com o tempo, reduzir o peso da carga tributária. A dívida ativa hoje chega a quase R$ 500 bilhões. Segundo Benévolo, a estimativa do Estado é de recuperar 1% disso pelo Judiciário. O resto, não.

Poder de decidir
Além do uso da arbitragem, outra forma de reduzir o número de ações tributárias na Justiça é a transação fiscal, bandeira levantada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. A ideia de transacionar na área fiscal proposta pela PGFN e já em tramitação no Congresso Nacional pretende dar mais poder ao agente fiscal. Pelo projeto, a este caberia o poder de valorar a ação antes de decidir aplicar a lei, e não apenas aplicá-la e transferir a competência para que o Judiciário ou ainda o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) façam essa valoração.

“O ato administrativo acaba sendo o momento do processo, e não uma solução. Essa cultura de transferência é muito grave na parte tributária”, afirma Luís Inácio Lucena Adams, procurador-geral da Fazenda Nacional. A maneira como as coisas funcionam hoje, diz, gera um custo muito grande para o Estado, o chamado custo invisível, que é quanto o Estado gasta nos litígios para manter a máquina funcionando. A proposta da PGFN de inserir a arbitragem e a transação em matéria tributária visa justamente acabar com esse custo e dar mais poder para o administrador decidir.

Uma das grandes barreiras para que os dois mecanismos hoje sejam usados em matéria tributária é a própria Constituição, que afirma que o bem público é indisponível. Adams explica que, na proposta de transação, o bem público – o tributo – não estaria em negociação. Só os encargos, como multa e juros, é que seriam negociados. Pelo projeto, o agente poderia considerar determinada conduta da lei equivocada e discuti-la, não simplesmente aplicá-la e transferir a discussão para a Justiça. Seria uma espécie de compliance na administração pública, diz Adams.

Nesse modelo, o primeiro juiz do processo seria a parte. A ideia é abrir o diálogo entre Estado e contribuinte, explica o procurador. “O Estado hoje é plasmado pela lógica da imposição. Nos referimos a Constituição Federal como carta, e não como pacto”, reclama.

Francisco Cahali reforça a possibilidade de transação em matéria fiscal com os chamados programas de parcelamento, que preveem algumas vantagens para o contribuinte devedor que aderir e pagar o que deve. “O Refis é uma certa forma de transação”, diz. Já quanto à arbitragem, ele afirma que ela poderia ser muito útil, principalmente, para resolver embargos de execuções, por exemplo. Ou, ainda, não para definir as grandes questões de Direito, como se existe isenção de determinado tributo ou não, mas para as questões de fato.

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